A batalha de Luzanira de Souza Campos, de 64 anos, ganhou um desfecho feliz nesta sexta-feira (7/8). Após 134 dias de internação, a aposentada recebe alta do Hospital de Brasília, no Lago Sul, com um coração novinho em folha. Ela foi a primeira paciente a passar por um transplante do coração na rede particular do Distrito Federal.
“Foi algo muito importante na nossa vida. A gente já vinha lutando com a minha mãe há 15 anos, com problema de coração e essa possibilidade do transplante foi uma renovação de esperança para nós, porque não tinha mais expectativa de cura”, relata a filha de Luzanira, Elaine Campos.
O processo até chegar ao transplante não foi fácil. No começo da doença, ela conseguia lidar bem com os remédios, e viver uma vida normal, sem muitas limitações. No entanto, nos últimos três anos, ela apresentou piora. Precisou passar por quatro procedimentos para implantação de marcapassos.
O mal-estar, cansaço e a falta de ar pioraram no ano passado, o que a impediu de fazer coisas simples, como tomar banho sem ajuda, escovar os dentes e até cozinhar, que era uma das coisas de que ela gostava muito. O agravamento dos sintomas e o susto de uma parada respiratória, além das internações na UTI, levaram a médica que a acompanhava a sugerir a possibilidade de um transplante.
Em abril, começou a luta da família contra o tempo para a cirurgia. Foram necessários exames para aferir as condições de saúde da paciente e se ela estava pronta para enfrentar o procedimento. Entre o primeiro pedido e a liberação para a cirurgia, foram quase dois meses.
O coração novo de Luzanira foi encontrado em Itajaí (SC), em 22 de junho. A enfermeira Maiara Casarin Fontes, da equipe de captação de órgãos do Hospital Brasília, explica que a logística envolvida requer um bom planejamento. Um coração pode ficar por quatro horas fora do peito doador até ser transplantado, e só é possível ter certeza de que é, de fato, compatível, quando a equipe que faz a captação do órgão consegue avaliá-lo.
No caso de Luzanira, a família foi avisada sobre a possibilidade de um coração ser compatível às 7h do dia 23. A certeza só veio, porém, ao meio-dia. Para o neto de Luzanira, Pietro Borges Campos, a notícia foi o melhor presente de aniversário que ele poderia ganhar. No dia que ele completou 11 anos, a avó recebeu um coração novo. “Foi uma felicidade, você não tem noção. A gente ficou feliz demais. E foi muito bom realmente saber que minha vó agora pode viver tranquilamente”, conta. “Estou muito grato para quem doo e a quem fez o transplante dela”, completa Pietro.
O cardiologista do Hospital Brasília Vitor Barzilai, que acompanhou o pós-operatório da paciente, lembra que o transplante não foi feito em um cenário totalmente controlado. Ela vinha de uma longa internação em outro hospital e também era dependente de uma medicação que mantinha a pressão e o fluxo sanguíneo do organismo estável.
O medicamento era indispensável para que os rins funcionassem e não houvesse retenção de líquido, uma característica de pacientes com insuficiência cardíaca. “Foi uma internação prolongada, o que faz com que a nossa impressão de vitória seja maior. Eu tenho muito orgulho dela, por ela ter passado por isso de uma maneira tão brilhante”, destacou Barzilai.
Todos os desafios pós-cirúrgicos foram superados, segundo a família, com a dedicação da equipe que acompanhou a paciente na UTI. O carinho foi tanto que a família preparou lembrancinhas para entregar a médicos, enfermeiros e intensivistas. “A emoção deles com a recuperação da minha mãe não tem preço”, diz a filha, emocionada.
Para o cirurgião responsável pelo procedimento no Hospital Brasília, Fernando Atik, esta é “mais uma vida, mais uma história. Cada pessoa que ganha um coração novo é uma história emocionante e inédita para contar”.
Expectativa e emoção
A enfermeira Maiara Casarin participou também do procedimento. Ela conta que, por ser o primeiro transplante cardíaco, havia muita torcida e expectativa por parte da equipe. Dentro da sala, foram mais de 10 profissionais. Pelo menos cinco médicos participaram da cirurgia, além de instrumentadores e a equipe de enfermagem.
Maiara explica que toda essa organização começou na noite do dia 22. “Quando recebemos a confirmação de que o coração de fato era bom, a movimentação no centro cirúrgico ficou ainda mais intensa, pois se inicia nesse momento todo o preparo para que, quando o órgão chegasse aqui, já estivesse tudo pronto”, relatou a enfermeira.
Cirurgião responsável pelo transplante, Fernando Atik tem larga experiência nesse tipo de procedimento. Ele montou o serviço de transplante cardíaco no Distrito Federal. Desde 2007, já fez 276 transplantes na Rede Pública do DF e diz que o sucesso de uma cirurgia desse porte é o resultado do trabalho em equipe.
Atik explica que a internação dura o tempo necessário para que a paciente tenha alta em condições seguras. “Quando o coração não funciona direito, todos os órgãos passam a sofrer”, explica o médico. No caso da dona Luzanira, os rins estavam funcionando precariamente. E quando chega em um momento em que o tratamento padrão não surte mais o efeito desejado, nós optamos pelo transplante”, acrescenta.
Apesar da experiência, Atik se emociona com a história de cada paciente. Para ele, todos têm uma história de vida e de recuperação para contar. O importante, no pós-operatório, é seguir à risca as orientações dos médicos. Também é preciso manter, por toda a vida, a medicação contra a rejeição e alguns cuidados com a alimentação, manter hábitos de vida saudáveis. Luzanira terá acompanhamento de perto pela equipe médica, rotineiramente.
Transplante de órgãos
O Hospital Brasília realiza transplantes de medula óssea (autólogo e alogênico), de fígado e de rim. Recentemente, tornou-se o primeiro hospital privado do Distrito Federal credenciado para a realização de transplante cardíaco. A instituição é a segunda do país em número de transplantes de fígado em hospitais privados e a primeira do Centro-Oeste, segundo dados do Registro Brasileiro de Transplantes, de 2019. Em janeiro do ano passado, o primeiro implante renal por cirurgia robótica com uma equipe médica 100% brasileira foi realizado no Hospital Brasília.
O Distrito Federal é uma das unidades da Federação com mais doação de órgãos, mas a pandemia diminuiu consideravelmente este número. Tanto pelo aumento da mortalidade em casa, quanto pela diminuição do número de acidentes e ainda pela quantidade de doadores contaminados. Para Fernando Atik, é preciso haver mais campanhas de conscientização para a doação no Brasil. “Um doador pode salvar muitas vidas, mas as famílias precisam consentir a retirada dos órgãos. Ainda temos muito trabalho pela frente para aumentar o número de doadores”, conclui o médico.
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