Incidência do Imposto Seletivo sobre o minério de ferro coloca economia brasileira em risco

Avaliação feita pelo Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) destaca que o país terá consequências desastrosas com a balança comercial e a competitividade internacional

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postado em 05/07/2024 00:00
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Matéria escrita por Gabriella Collodetti

A balança comercial brasileira pode ser impactada negativamente com o avanço do Imposto Seletivo. A constatação, levantada por diferentes especialistas, é explicada pelo Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). De acordo com a entidade, a incidência do tributo poderá prejudicar a sustentabilidade econômica do Brasil, assim como a competitividade do país em âmbito internacional.

Na prática, o IS acarretará em uma perda aproximada de R$ 736 milhões em exportações, considerado o valor exportado no último ano. Em um contexto geral, em 2023, o valor da produção minerária nacional chegou a R$ 248 bilhões. Em exportações, a área alcançou valores próximos a US$ 43 bilhões, resultando em um saldo comercial positivo de US$ 31,95 bilhões, representando 32% do saldo total da balança comercial. No que diz respeito aos tributos e encargos, o segmento foi responsável pelo recolhimento de R$ 85,6 bilhões.

Já no primeiro trimestre de 2024, o minério de ferro representou, sozinho, 47% da balança comercial brasileira, com exportações que atingiram US$ 8,1 bilhões, dos quais 74,4% são referentes ao minério de ferro. Os números, que evidenciam a importância crucial do setor mineral para a economia, também geram a preocupação caso o Imposto Seletivo avance com a Reforma Tributária.

"Caso o Imposto Seletivo seja aplicado também sobre as exportações dos minerais, o impacto será devastador para a competitividade internacional dos nossos produtos minerários. Um levantamento da consultoria EY mostra que o Brasil já possui a maior carga tributária sobre a produção de 10 minerais entre os seis maiores produtores de commodities do mundo. A oneração do setor, por mais um tributo, deixaria o país ainda menos competitivo frente aos seus principais concorrentes" Raul Jungmann, presidente do IBRAM

Na avaliação da entidade, aplicar o imposto contraria a lógica original do tributo, que deve focar no consumo final de produtos que são prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, e não na produção de commodities essenciais para a economia do Brasil. “O imposto tem um conflito na origem, pois sua aplicação deveria estar voltada ao consumo. No entanto, no caso do setor mineral, a cobrança se dá na extração, considerando o valor de mercado final do minério, o que não reflete seu custo original. Isso gera um desequilíbrio e injustiça tributária, penalizando um setor vital para a economia nacional”, explica.

Na prática, o conflito na origem do Imposto Seletivo está atrelado à sua aplicação voltada para reduzir o consumo do produto final acabado, como a bebida alcóolica e o cigarro. O presidente do IBRAM informa que, no caso do setor mineral, a cobrança é gerada na matéria prima de diversas cadeias produtivas – ou seja, está sendo cobrado em um insumo. “Seria como se o imposto da cerveja fosse cobrado na cevada, e não no momento do consumo, como é a prática de um IS”, comenta.

O presidente do IBRAM destaca que, nesse contexto econômico, o tributo incidirá sobre produtos e serviços que fazem mal à saúde ou ao meio ambiente, mas ao incluir neste grupo alguns dos principais setores de exportação do país, como a mineração e o petróleo e gás, o governo onerará ainda mais uma atividade que é vital para o desenvolvimento do país, porque afetará a nossa balança comercial.

Jungmann ainda indica que o minério de ferro é um insumo que não possui substituto, ou seja, as cadeias posteriores não podem escolher usar outro bem mineral no lugar do minério de ferro. Além disso, ele reitera que o Imposto Seletivo é um tributo não recuperável e quando incide sobre insumos das cadeias produtivas, inevitavelmente, leva ao grave problema da cumulatividade, que é exatamente um dos principais problemas do atual sistema, e que a Reforma Tributária busca solucionar.

"O ?minério de ferro é um bem mineral essencial à economia do país e ao superávit da balança comercial, conforme reconhecido pelo Ministério de Minas e Energia. Um bem considerado essencial ao país não pode ser tributado com o Imposto Seletivo, que visa desestimular o seu consumo" Raul Jungmann, presidente do IBRAM

Segundo a entidade, o argumento é de que a cobrança do IS se baseia no impacto ambiental, mas, no caso da mineração, e em qualquer empreendimento a ser construído no país, ele é compensado no processo de licenciamento.

“Além disso, o setor paga a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), prevista na Constituição de 1988, e que é repartida entre a União, estados e municípios. A CFEM é recolhida ao longo de todo o ciclo de atividade da operação. Em 2023, a arrecadação da CFEM alcançou R$ 6,7 bilhões, que estão incluídos nos R$ 85,6 bilhões recolhidos em tributos e encargos pelo setor”, complementa.

Indústria das indústrias

"Sem o aço, que é feito do minério de ferro, não temos o carro elétrico, aerogeradores ou placas solares. Por sua, vez, todos esses equipamentos, importantes para a transição energética, demandam os chamados minerais críticos e estratégicos, como lítio, nióbio, terras-raras e cobre", exemplifica Jungmann.

Para o presidente do IBRAM, é necessário reconhecer a relevância da mineração brasileira, especialmente devido a sua presença estratégica para tornar o Brasil o principal protagonista para a transformação energética pela qual o mundo precisa passar.

"No caso do minério de ferro, é preciso, portanto, descarbonizar a indústria do aço. E mais uma vez o Brasil sai na frente. Depois de quase 20 anos de pesquisa, a Vale desenvolveu um briquete de minério de ferro de baixa emissão capaz de reduzir em 10% as emissões na siderurgia. A primeira usina de briquete já está em operação no Espírito Santo. No futuro, quando o hidrogênio verde estiver disponível, a produção de aço de zero emissão", comenta.

Por essa razão, o executivo defende uma reavaliação do IS proposto pela reforma tributária. Caso seja instituído, haverá o encarecimento de matéria-prima para a siderurgia nacional, o que trará um cenário preocupante para a competitividade brasileira.

"Não há aço verde sem minério de ferro, porque a matéria-prima principal do aço é o minério de ferro. O grande salto de tecnologia será na substituição do combustível usado no alto-forno siderúrgico. No alto-forno, o minério de ferro precisa ser derretido na primeira etapa para sua transformação em aço. Hoje, usa-se como combustível neste processo o coque, que é um produto fóssil. No futuro, a ideia é usar o hidrogênio verde no lugar do coque, o que vai permitir zerar as emissões na siderurgia", informa.

No que diz respeito ao fomento de uma economia verde, no âmbito da área de energia, a Agência Internacional de Energia avaliou que, até 2030, haverá U$S 1,2 trilhão de investimentos direcionados à transição energética. Para o Brasil, isso significa mais oportunidades de emprego e renda por meio de uma economia sustentável. Hoje, o setor mineral brasileiro emprega quase 2,5 milhões de pessoas ao longo da cadeia de mercado e representa 4% do Produto Interno Bruto (PIB). A transição energética poderá gerar ainda mais oportunidades para os brasileiros.

“A mineração brasileira tem um papel estratégico na transição energética do mundo e pode contribuir para que o Brasil se torne, de fato, o seu principal protagonista. O caminho para uma economia de baixo carbono é impossível sem a ampliação da eletrificação, seja por meio de baterias, aerogeradores ou placas solares. E tudo isso exige os chamados minerais críticos e estratégicos, com lítio, nióbio, terras-raras e cobre”, ressalta Jungmann.

Desafios para o setor mineral

Além da preocupação voltada ao IS, outros aspectos também acendem um sinal vermelho para o segmento da indústria mineral. Reputação, morosidade na aprovação do licenciamento ambiental e falta de investimentos em pesquisa mineral são algumas das dificuldades para a área. De acordo com o IBRAM, o Brasil produz, hoje em dia, 1,2 bilhão de toneladas de minérios por ano.

"Atualmente, 2.699 municípios recolhem a Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), os royalties da mineração, pela produção de 91 tipos de substâncias. São quase 48% do total os municípios brasileiros. Essa é uma prova que somos um país essencialmente minerador - e devemos nos orgulhar disso. Apesar desses grandes números, o setor mineral não é percebido pela sociedade", lamenta o presidente.

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