Estima-se que a distância de ônibus de Belém para Brasília seja de 1967 quilômetros. Apesar do longo percurso, o casal Edergil Pimentel e Joanita Barbosa partiram rumo à capital federal com o intuito de encontrar uma explicação para algumas condições e dificuldades enfrentadas por sua filha, Laura Araújo da Rocha, na época, com aproximadamente quatro meses. A família, que na verdade reside em Tomé-Açu, interior paranaense, observou que a criança vinha ganhando pouco peso, pois tinha dificuldades em se alimentar.
Com uma gravidez tranquila e sem intercorrências, Laura passou pelos exames comuns da maternidade. Nesse período, foi identificado um pequeno furo no coração. “Disseram que não era para nos preocuparmos, pois poderia fechar com o tempo”, relembra o pai, Edergil. “Ainda com um mês de vida, a levamos em um cardiologista, onde o mesmo não deu muita importância, apenas nos passou para refazer o exame quando ela estivesse com seis meses”, complementa.
Após muitas idas aos consultórios e já aos três meses, um ecocardiograma identificou a cardiopatia de Laura: uma comunicação interatrial (CIA), defeito entre os dois átrios; e uma comunicação interventricular (CIV), abertura entre os dois ventrículos. Após o exame que confirmou o diagnóstico, devido a um princípio de pneumonia ocasionado pela disfunção do coração, a médica a internou.
“Ela ficou dez dias na UTI, em Belém. Nesse período de internação, o nosso plano buscou em sua rede credenciada alguns hospitais de referência para o acompanhamento e tratamento do caso da Laura, e o Hospital Santa Lucia Norte se prontificou em recebê-la. Tivemos muitos medos, pois não tínhamos ninguém próximo em Brasília, mas sabíamos que nossa filha precisava de tratamento”, conta.
Para Joanita, foi um momento importante. A vinda para Brasília possibilitou um novo capítulo na vida de Laura. "Tínhamos esperança de não precisar de cirurgia, mas o doutor Jorge nos orientou a fazer o procedimento o quanto antes, pois ela já estava com quatro meses", conta.
Com apenas 4,2kg, Laura realizou a cirurgia. “O Hospital Santa Lúcia Norte nos recebeu com muito acolhimento. Os profissionais de lá foram muito atenciosos. O monitoramento era constante, com as medicações adequadas, exames periódicos e uma alimentação balanceada para tentar o ganho de peso, para poder ser operada”, complementa Edergil.
Para os pais de Laura, o diagnóstico precoce foi essencial para o êxito da cirurgia. "É importante estar sempre atento para qualquer problema de saúde. Mesmo que pareça pequeno, é essencial procurar profissionais de qualidade o mais rápido possível. O rastreamento da enfermidade com antecedência salva vidas", destaca Edergil.
De Minas para Brasília
Em uma consulta comum, a descoberta de que Davi (4 anos) possuía comunicação interatrial (CIA) fez com que Clenia Martins, de Paracatu/MG, viesse para Brasília com o seu filho com o intuito de tratar a doença. O defeito congênito é responsável por gerar um buraco na parede entre as câmaras superiores do coração (átrios).
Quando um bebê nasce, esse espaço se fecha de forma natural. No entanto, Davi permaneceu com o espaço no coração. "Descobrimos em uma consulta de rotina. A pediatra escutou um barulho diferente no coração dele e solicitou um ecocardiograma. Ele estava sempre gripado e, às vezes, reclamava do coração bater forte. Notamos também que ele ficava mais cansado quando fazia natação ou jogava futebol”, relembra a mãe.
Ao vir para a capital, Jorge Afiune conduziu o atendimento e Nestor Sabatovicz realizou a cirurgia necessária para a correção do problema. Com o restante da equipe multidisciplinar do Hospital Santa Lúcia Norte, Davi se recuperou de forma positiva.
"A recuperação dele foi fantástica. A previsão era de ficarmos até sete dias no hospital, mas com quatro recebemos alta. A equipe da UTI foi incrível. No início do diagnóstico, é normal o medo. Por isso, é sempre procurar profissionais bons e hospitais de referência que já realizam o procedimento para ter mais tranquilidade no momento da cirurgia", ressalta.
A importância do diagnóstico
No mês de junho, foi celebrado o Dia Nacional de Conscientização da Cardiopatia Congênita (12). De acordo com o Ministério da Saúde, anualmente, cerca de 30 mil crianças nascem com o problema no Brasil. Nesse cenário, o órgão indica que aproximadamente 40% dos pacientes diagnosticados vão necessitar de cirurgia ainda nos primeiros doze meses de vida.
Dados mais específicos apontam que a cada mil bebês, 10 são acometidos pela doença. O tema chama atenção, especialmente pela particularidade que a patologia pode apresentar em cada caso. Considerada uma alteração na estrutura ou na função do coração, a condição está entre as malformações que mais matam na infância e ainda permanecem como a terceira causa de óbito no período neonatal, segundo a entidade.
“O termo ‘congênito’ significa que a doença está associada ao nascimento do bebê. Quando a gente fala sobre doença cardíaca do adulto, pensamos em infarto, problema nas válvulas ou entupimento das artérias, por exemplo. Esses corações nasceram totalmente normais, mas, com o tempo, adquiriram as cardiopatias. Já o congênito não, visto que se trata de uma doença que nasce com o indivíduo”, explica Jorge Afiune, cardiologista pediátrico do Grupo Santa.
Segundo o especialista, as cardiopatias podem variar de leves a graves. Em muitos casos, quando leves, as doenças podem passar despercebidas. Todavia, por sua baixa taxa de risco, ainda que diagnosticadas posteriormente ao nascimento, há tempo hábil para correção. Esse cenário muda, no entanto, quando os casos são mais graves. Afiune ressalta que, nessas situações, exige-se mais atenção e um cuidado extra para o diagnóstico com antecedência, visto que o tratamento pode ser impactado a depender da complexidade da cardiopatia.
Com 30 anos de experiência na área, o médico esclarece que o acompanhamento clínico deve ocorrer com rigor. Isso porque algumas doenças cardíacas muito graves podem passar toda a gestação como normais. Por isso, o acompanhamento do profissional, inclusive após o nascimento do recém-nascido, é primordial.
“Por sorte, nem todos vão ter doenças graves. Mesmo assim, quanto antes o diagnóstico puder ser feito, melhor será o planejamento e o tratamento do paciente, que pode contar com uma intervenção de cirurgia cardíaca, um cateterismo cardíaco ou até mesmo medicações específicas. Hoje em dia, 90% dos defeitos cardíacos graves podem ser corrigidos e, se o resultado dessa correção é bom, essas crianças podem se considerar curadas e podem ter uma vida normal”, celebra Afiune.
Apesar de causar temor nas famílias, as cardiopatias congênitas conseguiram evoluir de forma positiva no que diz respeito à sua identificação e tratamento. O cardiologista pediátrico do Grupo Santa comenta que a mudança nesse panorama deve-se, especialmente, a dois fatores principais relacionados ao diagnóstico antes do nascimento: o primeiro é o procedimento que é realizado através do ecocardiograma fetal, exame do coração que é feito ainda na barriga da mãe; o segundo diz respeito à ultrassonografia morfológica, que permite avaliar com riqueza de detalhes a saúde e o desenvolvimento do bebê.
“Esses dois procedimentos, realizados em torno de 20 a 28 semanas, 4º ao 5º mês, de gestação, aumentam a chance de fazermos o diagnóstico de doenças graves do coração. Com eles, melhoramos a detecção desses problemas nos bebês antes deles nascerem”, pontua.
Outro método que também ajudou na evolução do diagnóstico é feito após o nascimento, antes da alta do berçário, que se chama teste do coraçãozinho. “Esse teste mede a oxigenação do bebê na mão e no pé, através de uma análise dos números. Os médicos podem detectar se existe alguma chance de ter problema cardíaco grave”, destaca.
Além disso, para potencializar as detecções das doenças cardíacas, Afiune comenta a importância da presença médica no berçário e, também, logo após a alta hospitalar, nas consultas de rotina da criança. “Os médicos conseguem buscar outros sinais que podem chamar atenção para doenças cardíacas, como ‘roxidão’, cansaço para mamar, respiração rápida, vômitos e palidez”, complementa.
Quando surgem as cardiopatias congênitas
Com a função primordial de garantir que o sangue seja enviado para todo o corpo, o coração é o primeiro órgão a ser formado na gestação humana. Por isso, a detecção de algumas cardiopatias congênitas pode ser feita a partir da sua estruturação, que é realizada nas primeiras oito semanas da gravidez.
Ainda assim, mesmo que surjam logo no início do período gestacional, o especialista do Grupo Santa pontua que o diagnóstico muito cedo, às vezes, não implica na rápida correção da cardiopatia. "A criança, mesmo com o defeito cardíaco, pode se desenvolver bem até nascer. O que temos que fazer é descobrir a doença para planejar o tratamento e o que será feito após o nascimento. É muito ruim descobrir que o feto está com problema, mas, ao mesmo tempo, é uma oportunidade que ele ganha de planejar os próximos passos", informa.
Além disso, em muitos casos, recomenda-se a continuidade da gestação sem interferências cirúrgicas inicialmente, pois, quando o bebê está dentro da barriga da mãe, todas as suas necessidades são atendidas.
“Enquanto ele está na barriga, mesmo com um defeito cardíaco grave, o bebê tem o apoio da sua mãe, que supre tudo o que ele precisa através da placenta. Quando nasce, há a separação da mãe e do bebê. A partir disso, ele tem que dar conta de respirar e mandar sangue para o resto do corpo sozinho”, contextualiza.
Mesmo com o aconselhamento e acompanhamento médico, é normal surgir um mix de sentimentos a partir do diagnóstico. Medo e culpa podem tomar conta do dia a dia das famílias. No entanto, Afiune garante: não há motivos para responsabilizar os pais e as mães.
“Eles não têm culpa sobre o bebê que nasce com um problema cardíaco. Infelizmente, faz parte da natureza humana. Temos muitas informações genéticas que são passadas de pai para filho e que vão formar todos os órgãos. Algumas alterações nesses genes são responsáveis pelo surgimento de defeitos na formação do coração”, informa.
Considerado referência na identificação e tratamento de cardiopatias congênitas, o Grupo Santa conta com uma equipe multidisciplinar destinada apenas a esses casos. Após o diagnóstico, a rede atua com obstetras, psicólogos e cardiologistas fetais, por exemplo, para que todo o suporte necessário seja destinado às famílias.
“Nossa estrutura hospitalar tem o papel de acolher essa família e humanizar ao máximo esse momento tão difícil, preparando os pais e mães para o enfrentamento de algo bastante doloroso, que é um bebê na UTI ou que, às vezes, vai fazer uma cirurgia cardíaca. O Grupo Santa permite esse acolhimento e, também, permite a gente trazer a esperança de que o bebê consiga enfrentar tudo isso e que vá para a casa, vencendo essa batalha. Alguns defeitos não precisam fazer o tratamento logo que nasce. Isso porque cuidamos do bebê antes mesmo dele nascer, trazendo segurança nessa fase tão difícil”, ressalta Afiune.
Envolvimento cirúrgico
Apesar de alguns casos não precisarem de intervenção cirúrgica, há um percentual de cardiopatias congênitas que devem passar pelo processo de operação em prol da qualidade de vida do bebê e da criança. No entanto, é preciso avaliar a particularidade de cada doença.
“Nem todo paciente com cardiopatia congênita precisa fazer cirurgia. Existem algumas doenças cardíacas que as pessoas podem carregar ao longo da vida inteira e, às vezes, não ficam sabendo e não precisam de intervenção, como é o caso do forame oval patente [divisão do átrio direito do esquerdo]. Essa é a cardiopatia de maior prevalência e, em alguns casos, precisa ser tratada, mas na maior parte das vezes, não precisa de intervenção”, explica Nestor Sabatovicz, cirurgião cardíaco do Grupo Santa, que conta 29 anos de trabalho na área.
Para definir os casos que se aplicam às cirurgias, o especialista explica que há diferentes vias de entradas. Para defini-las, Sabatovicz comenta que deve ser priorizado o diagnóstico para que os próximos passos sejam elencados. Nesse âmbito, o médico reforça: toda mulher deve estar atenta ao acompanhamento de especialistas durante a gestação, pois muda o prognóstico da criança, caso ela apresente problemas de saúde. Dessa forma, o atendimento exige uma alta complexidade e a presença multidisciplinar do hospital, como indicado também pelo cardiologista pediátrico, Jorge Afiune.
"A cardiopatia congênita nem sempre tem uma identificação simples e fácil, pois nem sempre é evidente. Existem cardiopatias congênitas que a criança nasce e que ela tem que ser submetida à cirurgia nos primeiros dias de vida. Mas há casos que precisam de operação apenas nos primeiros meses ou anos de vida. É bastante variável. Por isso, precisa de uma área específica para a cardiopatia congênita, pois temos uma quantidade enorme de defeitos que o coração pode apresentar no seu desenvolvimento”, destaca Sabatovicz.
Por isso, o pré-natal, acompanhamento médico prestado à mulher gestante durante todo o período da sua gravidez, é um dos cuidados fundamentais e que faz diferença no processo gestacional. “Estamos com um caso, por exemplo, em que a mãe realizou um ecocardiograma fetal na cidade dela. Ao vir para Brasília, a criança nasceu e foi operada no Hospital Santa Lúcia Norte. Isso mudou completamente o acompanhamento desse bebê. Por essa razão, se tem uma mensagem que a gente pode passar para a população, é que todas as crianças e todas as mães gestantes precisam fazer o ecocardiograma fetal. Da mesma forma que é feito o morfológico do bebê para todo o resto do corpo, é essencial fazer de forma específica para o coração", exemplifica o cirurgião.
Intervenção no intraútero
Com o intuito de permitir que o percurso da doença seja modificado antes do nascimento do bebê, o Grupo Santa adota intervenções cirúrgicas intraútero, isto é, ainda com o feto na barriga da mãe. Apesar de não ser capaz de promover a cura, a iniciativa traz uma alternativa para o desenvolvimento do coração com o intuito de melhorar o seu desenvolvimento.
“As cirurgias cardíacas que têm intervenção no intraútero são, normalmente, intervenções por catéter que visam auxiliar o desenvolvimento do coração da criança. Não são tratamentos definitivos, mas em algumas vezes, tenta-se melhorar o desenvolvimento do coração naquela situação. Conseguimos alarga um orifício para melhorar o fluxo de sangue”, sinaliza Nestor Sabatovicz.
Em todo procedimento cirúrgico, independentemente de ser realizado antes ou depois do nascimento, é necessário uma série de preparativos para o êxito no procedimento. Sabatovicz comenta que há cuidados especiais que diferem das cirurgias de adultos, especialmente devido aos materiais utilizados.
"Tudo é extremamente especializado. As cânulas, os fios e todo o material utilizado é dedicado para esses bebês e crianças. Por isso, não é qualquer cirurgião que realiza esses procedimentos. Estamos falando, praticamente, de uma outra especialidade dentro da área cardíaca", explica Dr. Nestor Sabatovicz, o cirurgião cardiopediátrico do Grupo Santa, que possui destaque na realização de cirurgias cardíacas no Centro-Oeste.
Matéria escrita por Gabriella Collodetti, jornalista do CB Brands - Estúdio de Conteúdo