
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu, na semana passada, um habeas corpus que alterou o desembargador responsável pelo julgamento do recurso de apelação dos pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda, condenados a 21 anos de prisão pelo estupro e assassinato de Lucas Terra, em 2001, na Bahia. Os dois foram sentenciados em 2023, mas receberam o direito de recorrer em liberdade. O novo relator do caso é o desembargador Mário Alberto Simões Hirs, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), responsável por definir a data do julgamento da apelação.
Lucas Terra tinha 14 anos quando foi assassinado, em 21 de março de 2001, após, segundo os autos, flagrar os dois pastores tendo uma relação sexual dentro de um templo da Igreja Universal do Reino de Deus, em Salvador. De acordo com a investigação, os pastores, que temiam ser expostos pelo adolescente, decidiram cometer o crime, estuprando e depois o queimando vivo. O corpo foi abandonado dentro de um caixote em um terreno baldio.
Os pastores foram condenados por homicídio triplamente qualificado – motivo torpe, meio cruel, que impossibilita a defesa da vítima – além da ocultação de cadáver. A sentença fixou 18 anos de reclusão para cada um, com um acréscimo de três anos devido às agravantes, totalizando 21 anos de prisão. Entretanto, a juíza Andrea Sarmento, que presidiu o júri popular, determinou que os condenados pudessem recorrer em liberdade.
Apesar da condenação, a defesa dos pastores tem recorrido continuamente para postergar o cumprimento da pena. Entre os recursos apresentados estão agravos, habeas corpus e pedidos de efeito suspensivo. Em uma das tentativas, os advogados impetraram um habeas corpus que resultou na recente mudança do relator do caso.
A mudança gerou revolta na família da vítima, que teme novos atrasos no processo. A advogada da família Terra, Tuany Sande, explicou que a decisão do STJ pode causar ainda mais demora na resolução do caso ou até mesmo mudar a sentença que condenou os pastores. “O entendimento do desembargador que estava com o caso era favorável à família da vítima. Mas agora tudo pode mudar, pois entra um novo relator”, afirmou a advogada, destacando que confia na Justiça, mas teme que o resultado final beneficie os réus.
Ela ressaltou ainda que o processo já se arrasta há anos, sem solução, e com os condenados em liberdade. Para ela, a mudança de relator dá mais tempo à defesa dos pastores, aumentando a angústia da família. “Essa mudança é uma grande pedra no sapato. Agora vem um novo relator, que, após marcar o julgamento, e não sabemos quando isso será, permitirá que os condenados recorram novamente. Assim, o caso pode se arrastar por mais anos”, criticou.
O irmão do jovem assassinado, Carlos Terra Júnior, também expressou sua indignação com a nova mudança, afirmando que a demora na efetivação da pena reforça o sentimento de impunidade. “Meu pai passou a vida lutando por justiça e morreu sem ver esse caso resolvido. Minha mãe está há 24 anos enfrentando esse sofrimento, inclusive, muito doente. Agora, mais uma mudança que pode atrasar ainda mais o julgamento”, relatou Junior.
Ele também lamentou o impacto das estratégias jurídicas no desenrolar do processo, frisando que o poderio financeiro e jurídico da defesa dos pastores é muito maior que o da família da vítima. “A defesa utiliza todas as brechas da lei para evitar que eles sejam presos. Enquanto isso, minha família continua vivendo esse pesadelo”, afirmou.
Pastores livres
Os pastores Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda, condenados a 21 anos de prisão pelo crime de estupro e assassinato de Lucas Terra, seguem em liberdade e continuam exercendo a profissão. A equipe do Correio apurou que um deles atua em Minas Gerais e o outro no Rio de Janeiro. A reportage, tentou contato por telefone com o advogado de defesa dos dois pastores, o jurista Nestor Távora, mas não obtivemos resposta. Também buscou um posicionamento da assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). O texto será atualizado em caso de resposta.
Em nota, a Igreja Universal declarou "esclarecemos que a Igreja tem convicção quanto à inocência de Fernando Aparecido da Silva e Joel Miranda. Reforçamos que quem conhece o trabalho da Igreja sabe que ela exige de todos os membros de seu corpo eclesiástico um comportamento irretocável, para que possam exercer a atividade missionária a eles confiada, como um verdadeiro exemplo de conduta para a comunidade onde atuam. Afastamos, assim, qualquer um que tenha um comportamento contrário à fé cristã e ao que é requerido de bispos e pastores".
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