![Setor de pesca se mobiliza e cria projeto para modernizar a lei atual, que não atende as necessidades e demandas da atividade - (crédito: Oceana/Andressa Anholete) Setor de pesca se mobiliza e cria projeto para modernizar a lei atual, que não atende as necessidades e demandas da atividade - (crédito: Oceana/Andressa Anholete)](https://midias.correiobraziliense.com.br/_midias/jpg/2025/01/27/360x240/1_lei_da_pesca-45409577.jpg)
Protocolado em dezembro no Senado, o Projeto de Lei (PL) 4789/2024, do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), visa instituir a nova Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Pesca. A proposta tem o objetivo de modernizar a legislação atual, diante da insatisfação do setor.
O PL nasceu de uma série de debates, mais de 600 horas de discussões que envolveram diversas lideranças do setor produtivo da pesca artesanal e industrial junto com a organização internacional Oceana, idealizadora da proposta.
Atualmente na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), esperando pela apreciação, a nova diretriz tem como um dos objetivos garantir a preservação, conservação, manutenção e recuperação dos recursos pesqueiros, biodiversidade e ecossistemas aquáticos. Prevê a produção responsável de alimentos e também eliminar a pesca ilegal não reportada e regulamentada.
Além disso, a proposta promove a participação social, desenvolvimento socioeconômico e qualidade de vida para as comunidades pesqueiras. Um dos pontos mais importantes da lei é garantir o papel desempenhado por mulheres na atividade e inserir jovens na pesca, garantindo a continuidade da atividade.
Outro ponto abordado no texto é a responsabilização e geração de dados sobre a pesca no Brasil, para que a tomada de decisão seja baseada na melhor informação técnica e científica disponível, além do conhecimento tradicional e local. Medidas de conservação e redução da poluição também são contempladas no texto.
Para o autor da proposta no Senado, o PL tem uma extrema importância nacional, ao propor uma política nacional que visa garantir a exploração sustentável dos recursos pesqueiros, com a inclusão social e a proteção ambiental. "O PL busca conciliar o desenvolvimento econômico com a preservação dos ecossistemas aquáticos, beneficiando pescadores, comunidades e o país como um todo", disse o senador Alessandro Vieira (MDB-SE).
Base de dados
O texto esteve em desenvolvimento desde 2022 e contempla a diversidade e importância da pesca no Brasil. Nascido da organização internacional Oceana, a instituição procurou diversos atores do setor pesqueiro para contribuir com a proposta e instigou entidades da pesca artesanal a liderarem o movimento. De acordo com o Martin Dias, diretor científico da ONG, o projeto é raro, porque todo mundo ganha com ele.
De acordo com Dias, a proposta instaura uma espinha dorsal, criando uma estrutura para a pesca se desenvolver. "Se olharmos para o histórico, principalmente o mais recente da pesca brasileira, temos um contexto de muita instabilidade institucional. Você tem essa instabilidade institucional associada a uma política que não diz claramente o que as autoridades têm que fazer, não cria os instrumentos de maneira muito clara e não estabelece em leis os papéis e responsabilidades, um cenário de caos. Isso prejudica todo mundo, desde um grande empresário que quer exportar lagosta ou pescar atum, ao pescador artesanal que está catando o caranguejo no mangue e também o meio ambiente", destacou.
Dias ressalta ainda que a ineficiência das políticas públicas voltadas para o setor se deve ao fato de que o Brasil não produz dados sobre a pesca no país. "Como você vai avaliar a efetividade de uma política se você não sabe o quanto de peixe os pescadores estão produzindo, se os estoques que eles estão pescando estão bem ou mal? Ou criar um programa para a pesca industrial de subsídio para reduzir o preço do custo do óleo diesel, que é um dos maiores custos", indagou.
"Como você faz um programa desse sem saber se os peixes que eles estão pescando estão numa situação boa ou ruim? Você estaria subsidiando a sobrepesca e o governo não deveria dar dinheiro para isso, deveria segurar porque aquele estoque está precisando de um fôlego", emendou.
Para que as políticas públicas sejam feitas de forma eficaz no setor, Martin destaca a importância da geração de dados do setor através de pesquisas e estudos. "Precisamos ter os estudos de avaliação dos estoques para saber qual é a situação dos nossos estoques de peixe. Quem é contra isso? Ninguém", enfatizou.
"Obviamente que, se o estudo apontar que precisa pescar menos, vai ter um problema, um conflito. Mas isso é uma coisa que vem a partir dos dados e hoje estamos lutando para que existam os estudos. Queremos criar uma base de desenvolvimento mais sólida, que consiga trazer segurança jurídica e um pouco mais de estabilidade nessas tarefas que o governo tem que cumprir", defendeu.
União faz a força
A união entre os setores industrial e o artesanal foi o maior destaque da formulação da proposta. Para que tivesse chances reais de aprovação, tanto no Senado quanto na Câmara dos Deputados, o projeto precisava estar o mais alinhado possível com todos os atores da atividade.
Por isso, o diálogo foi de extrema importância, conforme afirmou Denison da Anunciação Santos, 31, pescador e coordenador do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) e morador de Santa Luzia do Itanhy (SE). "A união foi indispensável e indiscutível, pois cada um colaborou de uma forma. A pesca artesanal, setor da pesca industrial e tantos outros movimentos que participaram, foi de extrema importância a união de cada um, é um marco para o Brasil", disse.
Santos destacou ainda como a proposta responde bem a uma das maiores demandas do setor pesqueiro, que é a participação de mulheres e jovens na atividade. De acordo com o coordenador do movimento, o novo PL prevê uma participação de mulheres e jovens, algo que não existe na lei vigente.
"Uma das principais demandas que nós temos hoje e colocamos na proposta foi a participação da mulher, ou seja, que a mulher seja protagonista. O nosso principal objetivo é derrubar o muro da desigualdade que ainda existe. Na lei atual, as mulheres não têm participação, não são reconhecidas como pescadoras e a juventude também não. Mas no PL criado as mulheres e a juventude estão incluídas e isso é muito bom, de extrema importância", disse.
Assim como a pesca artesanal emplacou as suas principais demandas, o setor industrial também foi ouvido. Cadu Villaça, presidente do Coletivo Nacional da Pesca e da Aquicultura (Conepe), representante da pesca industrial, disse que a busca por segurança jurídica foi um dos principais objetivos do seu lado.
"A indústria pesqueira busca segurança jurídica e esta se faz a partir de um arcabouço legal sólido. Hoje a atividade é muito infralegal, muito sujeita a adaptações de interesses momentâneos ou mandatários e isto torna o planejamento e desenvolvimento muito difícil, estamos sempre pisando em ovos. Hoje buscamos solidez, estabilidade e confiabilidade", comentou.
Villaça comentou ainda que outro ponto fundamental foi a separação de políticas para aquicultura e pesca. "Sob a atual Lei da Pesca, as duas atividades — que têm pontos semelhantes, mas são essencialmente distintas — estão sob a mesma política, e isso é outro complicador. Enquanto de um lado você tem atividades mais semelhantes, com uma granja, do outro você tem uma espécie de caça, e isso torna as forças, atores e a gestão completamente distintas", explicou.
De acordo com o presidente do Conepe, a pesca industrial também busca equilibrar a atividade com o meio ambiente. "Queremos ter o equilíbrio entre o que se retira da natureza e a capacidade de reposição estabelecido pela melhor ciência e pelo conhecimento empírico. Ser o guia para gestão de frotas, de estímulos e reduções, ver legalizado o princípio da sustentabilidade com ferramentas para buscá-la através de fundos de pesquisa, instrumentos de monitoramento e controle", destacou.