Desigualdade

Pobreza infantil ainda atinge 55,9% das crianças e adolescentes no Brasil

Estudo realizado pela Unicef mostra que o número de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos vivendo na pobreza, em suas múltiplas dimensões, caiu de 34,3 milhões em 2017 para 28,8 milhões em 2023

Com relação à pobreza multidimensional extrema, o número passou de 13 milhões (23,8%) para 9,8 milhões (18,8%) -  (crédito: Marcello Casal/Arquivo/Agência Brasil)
Com relação à pobreza multidimensional extrema, o número passou de 13 milhões (23,8%) para 9,8 milhões (18,8%) - (crédito: Marcello Casal/Arquivo/Agência Brasil)

O Brasil reduziu em 6,6% o número de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos vivendo na pobreza, em suas múltiplas dimensões, nos últimos seis anos. Segundo o estudo Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil, publicado nesta quinta-feira (16/1) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em 2017, eram 34,3 milhões (62,5%) e, em 2023, o número caiu para 28,8 milhões (55,9%). 

O levantamento, baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), analisou sete dimensões fundamentais: renda, educação, acesso à informação, água, saneamento, moradia e proteção contra o trabalho infantil, além da segurança alimentar.  

Com relação à pobreza multidimensional extrema, o número passou de 13 milhões (23,8%) para 9,8 milhões (18,8%), no mesmo período. De acordo com os dados, a redução da pobreza desse indicador foi influenciada principalmente pelo aumento da renda — beneficiado em especial pela ampliação do Bolsa Família —, e pela melhoria no acesso à informação. 

A pobreza multidimensional é um conceito que considera vários fatores que contribuem para a pobreza, além da renda monetária. É resultado da relação entre privações, exclusões e vulnerabilidades que comprometem o bem-estar de meninas e meninos.

Segundo a chefe de Políticas Sociais do Unicef no Brasil, Liliana Chopitea, os resultados do estudo mostram que o Brasil conseguiu avançar nas diversas dimensões avaliadas. No entanto, o percentual ainda é preocupante. “Naturalmente, é positivo e esperançoso saber que essa situação está melhorando”, destaca. 

A pobreza infantil pode ter impactos duradouros na saúde, no desenvolvimento cognitivo e nas oportunidades da criança. “A pobreza infantil é importante, porque se nós endereçarmos esses primeiros anos essa pobreza pode se perpetuar e os impactos podem ser duradouros para crianças e adolescentes. Então é importante entender que a pobreza afeta mais as crianças e adolescentes porque está justamente em um momento de desenvolvimento. Qualquer direito que não seja garantido na idade certa pode ter consequências a médio e longo prazo para o desenvolvimento das crianças”, explica Chopitea.

A longo prazo, esses efeitos também podem ser sentidos na economia do país. “Se tivermos crianças que não estão devidamente desenvolvidas e apoiadas, naturalmente vamos ter menos adultos que possam contribuir economicamente para o país. Então é importante colocar como prioridade as políticas endereçadas a acesso aos direitos das crianças e adolescentes na idade certa”, complementa.

No período analisado, entre 2017 e 2023, o percentual de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos privados de renda caiu de 25,4% em 2017 para 19,1% em 2023. O percentual de crianças sem acesso à informação caiu de 17,5% para 3,5%. 

Dentre as dimensões avaliadas, no acesso a água a queda foi de 6,8% para 5,4%. Na dimensão de saneamento, o percentual caiu de 42,3% para 38%. Eram 13,2% crianças e adolescentes sem acesso adequado a moradia em 2017, caindo para 11,2% em 2023. 

Trabalho infantil e educação 

Já o percentual de crianças e adolescentes em trabalho infantil ficou estável, passando de 3,5% em 2017 para 3,4% em 2023. Em relação à educação, o estudo analisou as privações de acesso à escola na idade certa e alfabetização. Olhando apenas a dimensão de alfabetização, cerca de 30% das crianças de 8 anos não estavam alfabetizadas em 2023. 

De acordo com o estudo, esse é um dos reflexos da pandemia entre os anos de 2020 e 2021, período marcado pelo ensino remoto e pela falta de acesso a recursos educacionais e suporte pedagógico adequados. À época essas crianças, que tinham tinham entre 5 e 6 anos, estavam na alfabetização. Em um recorte racial, as crianças negras tiveram maiores privações em educação, especialmente em relação ao analfabetismo.  

Desigualdades regionais 

Separado por Unidades da Federação, o estudo mostra avanços na grande maioria dos estados. Embora o Norte e Nordeste continuem apresentando os maiores desafios, foram observadas reduções de até 10 pontos percentuais da pobreza multidimensional em alguns estados dessas regiões entre 2017 e 2023.  

O estudo destaca ainda o impacto geográfico da privação de crianças e adolescentes, os que residem em áreas rurais enfrentam consistentemente níveis muito altos de privação. Em 2023, a taxa geral cai levemente para 95,3%, após ter atingido 96,9% em 2019. Por outro lado, nas áreas urbanas, o percentual de crianças e adolescentes com alguma privação mostra uma tendência de redução mais acentuada, caindo de 55,3% em 2017 para 48,5% em 2023. 

Apesar de as áreas rurais terem significativamente mais crianças e adolescentes com alguma privação em todos as dimensões, saneamento se destaca. Enquanto em áreas urbanas, o percentual com privação de saneamento é de quase 28%, no caso de áreas rurais esse percentual é de quase 92%.  

O resultado reflete as dificuldades contínuas enfrentadas por crianças e adolescentes em áreas rurais, onde o acesso a serviços básicos, educação e infraestrutura é frequentemente limitado, destacando a necessidade de políticas específicas que abordem as necessidades particulares de crianças e adolescentes em comunidades rurais para reduzir essa lacuna de privação. 

Rafaela Gonçalves
postado em 16/01/2025 12:41
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