Relatório da Organização Mundial da Saúde elaborado em parceria com a Unicef, divulgado em julho de 2024, retirou o Brasil da lista dos 20 países com piores índices de imunização — desde 2016, o país vinha caindo nos índices de cobertura vacinal. Segundo a biomédica e cientista de dados Thayssa Neiva da Fonseca Victer, coordenadora-geral de Insumos e Rede de Frio do Programa Nacional de Imunizações (PNI), a recolocação do Brasil entre as nações que mais fornecem vacinas à população é uma vitória do Ministério da Saúde. Em entrevista à edição desta quinta-feira (2/1) do CB.Saúde — uma parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília —, ela salientou que um maiores esforços é o de recuperar a confiança da população nos imunizantes, depois da intensa campanha de desinformação realizada nas redes sociais e da falta de apoio de setores de governos anteriores. A seguir, os principais pontos da entrevista concedida aos jornalistas Ana Maria Campos e Ronayre Nunes.
Qual a importância da imunização para a saúde pública?
A vacinação é uma das estratégias de saúde pública mais eficazes e econômicas. A cada dólar investido em vacinação, economiza-se em torno de US$ 20 em tratamentos e investimentos. O suporte que seria necessário para tratar a doença demonstra a importância do nosso PNI. A prioridade da imunização, da vacinação e do PNI são essenciais para a gestão do Ministério da Saúde. A vacinação protege o indivíduo de ter doenças graves, de hospitalização e de morte. Mas, também, quanto mais pessoas imunizadas no país, menores as chances de doenças se propagarem. O benefício da vacinação é individual e social.
Como funciona a logística da produção da vacina até a chegada à população?
Este é um tema complexo. A logística de um programa de imunização tão capilarizado quanto o do Brasil, em que as vacinas estão disponíveis em mais de 35 mil postos, é um grande desafio do nosso país, que tem contextos geográficos diferentes. Cada processo de produção de vacinas, a aquisição e a distribuição desses produtos, é complexa e o Ministério da Saúde coordena todas essas ações, em conjunto, claro, com estados e municípios. A gestão da logística é compartilhada entre os governos federal, estaduais e municipais para que a vacina chegue da maneira mais segura possível. Para dar uma ideia da dimensão, são distribuídas anualmente mais de 300 milhões de doses para os mais de 5,5 mil municípios. Isso exige um esforço logístico muito grande.
Como está o trabalho de convencimento da população de que as vacinas são seguras?
Desde que nossa gestão começou, nos deparamos com esse cenário. Primeiro, houve a necessidade de fazer um diagnóstico e entender como isso, de fato, estava impactando. Para isso, contamos com a colaboração e a parceria de diversas instituições acadêmicas e profissionais, que trouxeram dados para que a gente pudesse entender a situação. Começamos, também, um programa que se chama Saúde e Consciência, que envolve vários ministérios e entidades parceiras, com o tema vacinação e fake News. Todas as vacinas incluídas no PNI têm evidências robustas, científicas e clínicas de que elas são seguras. Um fato que posso citar como exemplo: todos os lotes, de todas as vacinas, independentemente se são novas ou não, são avaliados pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde. Ou seja: cada frasco é avaliado para determinar a segurança daquele produto, não só de vacinas novas, como de imunizantes que faziam parte do nosso programa.
Como foi 2024 para a cobertura vacinal?
Trago algumas evidências de que todas as estratégias feitas e trabalhadas desde 2023 trouxeram bons resultados em 2024. Aumentamos a cobertura vacinal de 15 das 16 vacinas do calendário infantil — todas as iniciativas e estratégias elaboradas desde 2023 têm dado resultados. Isso é muito importante. Inclusive, demonstrou que o Brasil saiu da lista dos 20 países que menos vacinaram suas crianças. Houve uma mudança de cultura do brasileiro nos últimos anos, principalmente nos últimos cinco anos, em relação à vacinação. Os pais não estavam indo aos postos, não estavam vacinando seus filhos. O grande desafio que temos é o de retomar a confiança na vacinação, a confiança no processo de proteção das crianças.
Existem doenças que estão voltando pela falta de vacinação?
Tínhamos perdido a certificação de país livre de sarampo, em 2018, justamente pela reintrodução dessa doença no nosso país. Em 2023, com esforço, estratégias, planos e um trabalho muito coeso entre estados, municípios e população, conseguimos aumentar as coberturas vacinais. Por esse motivo, somos certificados novamente — é uma grande conquista do nosso programa. Ainda estamos livres da poliomielite, mas precisamos manter as altas coberturas para que a gente continue dessa maneira. O risco de reintrodução da doença no país existe e precisa continuar sendo vigiado. A melhor maneira de fazermos isso é vacinando as crianças.
Por que houve a mudança da aplicação da gotinha nas crianças?
É uma tendência mundial e o Brasil ainda não tinha aderido a essa estratégia. Foi importante porque existe risco de expansão ambiental nas vacinas orais. A vacina oral contra a poliomielite era uma tecnologia de produção de vírus atenuado, ou seja, tinha um risco de exposição e contaminação ambiental, mas que é controlável. Substitui-se duas doses de reforço, que eram orais, por uma dose de vacina inativada, que é injetável.
Como o PNI está na comparação com outros países?
Continuamos sendo referência mundial de vacinação. Somos reconhecidos internacionalmente pela nossa capacidade, não só pelo magnitude do programa — são 35 mil salas de vacina, mais de 30 vacinas oferecidas à população, além de soros e imunoglobulinas, por exemplo. A comparação com outros países é complexa porque depende muito de como cada um encara e faz sua política de vacinação. Não são todos os países que têm programas públicos. Então, a comparação pode ser injusta. O que a gente se orgulha é de oferecer vacinação gratuita dentro dos SUS (Sistema Único de Saúde) para toda a população, sem nenhum tipo de distinção, para evitar hospitalizações e mortes.
Que medidas o Ministério da Saúde toma para prevenir o desperdício de vacina?
Existe o constante monitoramento. Fazer um planejamento operacional robusto é essencial para a prevenção do desperdício.
- Leia também: Visão do Correio: A importância da vacinação
Quando o Ministério da Saúde fornecerá a vacina contra a herpes zoster?
A gente se compromete a fazer o mais importante para a população. Essa vacina está na nossa lista de prioridades.
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi
Saiba Mais