O Ministério Público do Trabalho do Rio de Janeiro (MPT-RJ) e a Auditoria-Fiscal da Superintendência Regional do Trabalho no estado resgataram 14 trabalhadores em situação análoga à escravidão no Rock in Rio deste ano. A força-tarefa, criada em setembro, responsabilizou diretamente a empresa Rock World S.A, organizadora do evento, pela situação dos trabalhadores, em razão da negligência na fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista. A empresa nega as acusações.
Em uma coletiva de imprensa, nesta quarta-feira (18/12), os procuradores do MPT informaram que os resgates tiveram início em 22 de setembro como parte de uma fiscalização para verificar se os expositores, comerciantes e contratantes de músicos estavam cumprindo as obrigações trabalhistas. As investigações apuraram trabalho análogo à escravidão em decorrência das condições degradantes do alojamento, da jornada exaustiva e de trabalho forçado.
De acordo com o MPT, as vítimas trabalhavam como carregadores de grades, caixas de equipamentos, iluminação, bebidas, barricadas, brindes e estruturas metálicas, além de atuarem na montagem e na limpeza dos espaços. A diária dos empregados variava entre R$ 90 e R$ 150, e foi constatado que muitos chegavam a trabalhar até 21 horas por dia na expectativa de aumentar os ganhos, mas não foram pagos integralmente.
Na madrugada de 22 de setembro, auditores fiscais estiveram no local e encontraram os 14 empregados dormindo na base da empresa, deitados sobre papelão, sacos plásticos e lonas, “alguns com cobertores, demonstrando que havia um planejamento prévio para pernoitar no local”. “No momento em que encontramos os trabalhadores dormindo precariamente sobre lonas e papelões, foi difícil acordá-los para as entrevistas, tamanho era o cansaço deles”, disse Raul Capparelli, auditor fiscal do Trabalho que participou da operação.
A Auditoria-Fiscal do Trabalho lavrou 21 autos de infração punindo a empresa contratada, FBC Backstage Eventos Ltda, e 11 autos de infração em relação à realizadora do evento, Rock World S.A., que foi responsabilizada diretamente pelo trabalho análogo à escravidão.
Para Thiago Gurjão, procurador do Trabalho responsável pelo inquérito, “não é possível tolerar trabalhadores nas condições em que foram encontradas, dormindo em papelões por três horas antes de voltar para uma nova jornada de um trabalho pesado, carregando materiais, por até 20 horas. É inadmissível que isso ocorra em um evento de grande porte, com um discurso voltado para a sustentabilidade e a responsabilidade social, que tem todos os recursos necessários para que isso não ocorra”.
A empresa Rock World negou as acusações de trabalho escravo e disse que o MPT e os auditores-fiscais "lançaram sérias acusações contra a Rock World, de maneira precipitada, desrespeitando o direito constitucional ao contraditório, ampla defesa e presunção de inocência, já que os fatos ainda estão sob o crivo de um processo administrativo recém iniciado". De acordo com a empresa, nenhuma alegação foi comprovada. Além disso, a Rock World ainda afirmou que o episódio envolve apenas trabalhadores de uma empresa terceirizada chamada “Força Bruta”.
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Histórico de trabalho escravo
Este é o terceiro caso de trabalho escravo envolvendo o festival. Em 2013, 93 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão na rede de lanchonetes Bob’s. Segundo as investigações, os empregados estavam alojados em locais sem as mínimas condições de dignidade, além de muitos passarem a noite ao redor do evento sem saber se poderiam trabalhar, sem garantia de alimentação e água ou local de repouso.
No Rock in Rio de 2015, 17 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão de uma empresa que vendia batata frita. Os empregados atuavam como ambulantes para a empresa Batata no Cone, dentro do festival, e gastavam mais do que recebiam para trabalhar no local.
*Estagiária sob a supervisão de Vinicius Doria