Análise

Alexandre Garcia: Os sons da praça

"Que as questões políticas devem ser tratadas nos plenários da Câmara e do Senado, não no Supremo, que está se desgastando ao se envolver em assuntos que são do Congresso", observa o jornalista

 30/10/2024. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil.  Brasilia - DF. Praça dos Três Poderes Supremo Tribunal Federal STF. -  (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
30/10/2024. Crédito: Minervino Júnior/CB/D.A Press. Brasil. Brasilia - DF. Praça dos Três Poderes Supremo Tribunal Federal STF. - (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)

Nesses agitados dias, a Praça dos Três Poderes foi abalada pela pirotecnia do chaveiro catarinense, que acabou em morte trágica. Mas não foram os únicos sons que se ouviu, nem o todo que se ouviu parecem fogos de artifício. As recentes vozes começaram pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Herman Benjamin, em entrevista à Folha de S.Paulo. O ministro disse que magistratura não é carreira para quem quer ser famoso, tem que ser reservado, só se manifestar nos autos. Querer ser polêmico, próximo à classe política, é incompatível com a magistratura. É comum que a má conduta de um reflita na instituição. E concluiu que quem não puder ser reservado, não deve ser juiz, mas procurar outra profissão.

Depois vieram presidentes das OABs de Minas e do Rio Grande do Sul, denunciando a falta do amplo direito de defesa. O de Minas, Sérgio Leonardo, diante do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, na Conferência Nacional da Advocacia, afirmou que ministros não recebem advogados, que recebem apenas cópias parciais de processos, e que os advogados repudiam essas atitudes.

Em Porto Alegre, o presidente da OAB-RS, Cláudio Lamachia, manifestou críticas ao Supremo, que se afastou da Constituição que deveria guardar. No Congresso, deputados e senadores cobram a omissão do Superior Tribunal Militar (STM) em relação a militares da ativa presos, e o presidente do STM, tenente-brigadeiro Joseli Camelo, responde com um argumento jocoso, de que se forem condenados na Justiça civil, a Justiça militar fará um processo ético.

Aí se ouve a voz pesada de um ex-presidente do Supremo, o único juiz de direito de carreira da corte, Luiz Fux, repetindo o seu discurso de posse na presidência, em 2020. Reiterou a seus pares que o STF é Judiciário e não Legislativo e, muito menos, político. Que as questões políticas devem ser tratadas nos plenários da Câmara e do Senado, não no Supremo, que está se desgastando ao se envolver em assuntos que são do Congresso.

E numa audiência sobre a necessidade de comprovante do voto e transparência na apuração, o vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro do Supremo Kássio Nunes Marques — que vai presidir as eleições de 2026 —, afirmou que comprovantes de voto e métodos de apuração eleitoral devem ser decididos no lugar próprio, que é o Legislativo — e não no STF.

Essas vozes repetem a voz de quem quer o cumprimento da Constituição, do devido processo legal, do amplo direito de defesa com juiz natural, liberdade de expressão e vedação a qualquer tipo de censura, da transparência — como diz a Constituição. Não se pode esquecer da gravíssima omissão do Senado.

A teoria dos Três Poderes prevê que haja, entre eles, um sistema de pesos e contrapesos, e o Senado é o contrapeso institucional para excessos do Supremo. Até as pedras portuguesas que pavimentam a Praça dos Três poderes já perceberam isso — menos os responsáveis.

 

Correio Braziliense
postado em 04/12/2024 03:55
x