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Queda de avião em Vinhedo (SP) mata 62 no pior acidente no Brasil em 17 anos

Bimotor da Voepass deixa Cascavel rumo a Guarulhos, mas, na aproximação do aeroporto, entra em parafuso e despenca — ninguém sobreviveu. Lula decreta três dias de luto

Um bimotor ATR-72 500 da empresa aérea Voepass Linhas Aéreas, que decolou do Aeroporto de Cascavel (PR) com destino ao Aeroporto de Guarulhos (SP) e que tinha a bordo 58 passageiros e quatro tripulantes, caiu em um condomínio residencial de Vinhedo (SP), na tarde de ontem, sem deixar sobreviventes. Vídeos feitos por moradores da região — amplamente compartilhados nas redes sociais — flagraram o momento da queda. O avião perdeu sustentação, despencou na vertical (situação conhecida como estol) e explodiu no jardim de uma residência, provocando uma densa coluna de fumaça negra que podia ser vista a quilômetros de distância.

Equipes do Corpo de Bombeiros e do Samu que atuam em Vinhedo e cidades vizinhas foram imediatamente deslocados para o local do acidente. Quatro horas depois, a Voepass confirmou o que as equipes de resgate haviam constatado: ninguém foi encontrado com vida no local do acidente. No fim da tarde, as caixas pretas da aeronave foram encontradas e serão analisadas pelos técnicos do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), órgão ligado ao Ministério da Aeronáutica.

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou que a aeronave “se encontrava em condição regular para operar, com certificados de matrícula e de aeronavegabilidade válidos”, assim como a documentação dos tripulantes, “todos devidamente licenciados e com as habilitações válidas”, segundo nota oficial do órgão regulador.

O avião prefixo PS-VPB é um bimotor turboélice modelo ATR- 72, fabricado em 2010 pela empresa franco-italiana Avions de Transport Régional, com capacidade de transportar 68 pessoas. A aeronave decolou de Cascavel às 11h46, com previsão de chegar por volta das 13h30 a Guarulhos. Mas, 10 minutos antes da aterrissagem, a torre de controle do terminal paulista perdeu o contato com o aparelho. Segundo o comandante do Cenipa, brigadeiro-do-ar Marcelo Moreno, nenhum problema foi relatado pela tripulação às equipes de controle de tráfego aéreo. O bimotor, simplesmente, sumiu do radar.

Sites especializados em navegação aérea, que monitoram voos pelo mundo todo, registraram que o ATR-72 voava a 17 mil pés de altitude (5 mil metros) às 13h20. Em dois minutos, a altitude caiu para 4 mil pés (1,2km), quando o sinal do GPS foi perdido. No fim da tarde, a Voepass divulgou a lista dos nomes das vítimas do acidente.

Em nota, a empresa lamentou a tragédia e declarou que acionou “todos os meios para apoiar os envolvidos”. Disponibilizou, ainda, o telefone 0800-9419712 para prestar informações “a todos os seus passageiros, familiares e colaboradores”. Nos terminais de Guarulhos e de Cascavel foram montados gabinetes de crise com a presença de órgãos federais, estaduais e municipais para atender às famílias das vítimas — incluindo psicólogos e assistentes sociais.

Mas nem todas as pessoas que compraram passagem para o voo 2283 embarcaram. Um empresário que faria conexão em Guarulhos para passar o Dia do Pais em Vitória com a filha chegou dois minutos atrasado ao terminal. Outro se confundiu e estava aguardando um voo de uma companhia diferente. Quando se deu conta do erro, chegou a discutir com um atendente para que pudesse embarcar no avião da Voepass, mas a aeronave estava com as portas fechadas.

Os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), estavam em Pedra Azul, na Região Serrana do Espírito Santo, participando da reunião de governadores do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud). Quando souberam da tragédia, deixaram o encontro e anteciparam o retorno aos respectivos estados para acompanhar o trabalho de atendimento às famílias das vítimas. A reunião do Consud foi encerrada antecipadamente pelo anfitrião, o governador capixaba Renato Casagrande (PSB), como gesto de solidariedade.

 

Investigação

O Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo enviou a Vinhedo cinco rabecões para remoção dos corpos. O porta-voz da Polícia Militar paulista, coronel Emerson Massera, disse que será um trabalho complexo pela quantidade de vítimas. A Polícia Federal (PF) também foi acionada para iniciar a investigação criminal e montou um gabinete de crise dentro do condomínio residencial Recanto Florido, onde o avião caiu — a residência foi cedida por um morador.

As causas do acidente começaram a ser apuradas por técnicos do Cenipa, que estão em Vinhedo. As duas caixas-pretas do avião foram enviadas para a sede do órgão, em Brasília. Uma traz informações sobre dados dos sistemas de navegação do aparelho. A outra, gravações das conversas de cabine entre piloto, copiloto e agentes de controle de tráfego aéreo. Esses dados são considerados fundamentais para a apuração.

Para o comandante do Cenipa, não é possível confirmar se condições meteorológicas adversas, como formação de gelo, contribuíram para a queda da aeronave. Ele ressaltou que esse tipo de informação é sempre considerado antes de cada voo e que o avião estava certificado para operar.

A Voepass é a quarta maior companhia aérea brasileira. Tem sede em Ribeirão Preto (SP) e atua em 40 cidades, segundo informações de seu site. Ainda de acordo com a empresa, opera 60 voos diários e transporta 70 mil passageiros por mês.

Em junho, detinha 0,5% do mercado brasileiro de transporte aéreo, ficando atrás da Latam (39,6%), Azul (31%) e Gol (28,8%). No fim de 2023, a Voepass contava com 859 funcionários, sendo 131 pilotos e tripulantes. O inventário de aeronaves dá conta de 10 aviões fabricados pela ATR.

Em número de voos domésticos, a Voepass havia sido, em 2023, a empresa a registrar o maior crescimento, com 22%. Em 2019 (último dado disponibilizado pela Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac), a companhia teve prejuízo de R$ 27 milhões. No mesmo ano, o caixa estava negativo em R$ 30 milhões.

*Estagiários sob a supervisão de Vinicius Doria e Fabio Grecchi

 

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