O início do oitavo mês deste ano marcou o começo da campanha Agosto Lilás, que visa trazer ações de enfrentamento e conscientização sobre a violência doméstica contra a mulher. Neste ano, os governos federal e estaduais trouxeram iniciativas que buscam aproximar a população brasileira da realidade de mulheres que enfrentam esse problema e informar sobre as possibilidades de apoiar a causa.
Segundo o Atlas da Violência 2024, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 48.289 mulheres brasileiras foram assassinadas entre os anos de 2012 e 2022. Além disso, segundo o 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma menina ou mulher é vítima de violência sexual a cada seis minutos no país.
O Projeto Banco Vermelho, lançado pelo governo federal na quinta-feira (1º/8), visa a instalação de assentos na cor vermelha em espaços públicos de grande circulação de pessoas, como escolas, universidades, estações de trem e metrô, rodoviárias e aeroportos. Os bancos estarão estampados com frases que estimulem a reflexão sobre a conscientização e alerta para a violência contra as mulheres, assim como o número 180 — telefone do Centro de Atendimento à Mulher, para onde as denúncias sobre o tema devem ser feitas.
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A instituição do projeto está prevista na Lei 14.942, publicada na edição de quinta do Diário Oficial da União, e promete premiações para as melhores iniciativas relacionadas à conscientização e ao enfrentamento da violência contra a mulher, assim como à reintegração da vítima.
Também na quinta, o Ministério das Mulheres lançou a cartilha Mais Mulheres no Poder, Mais Democracia, que reúne índices alarmantes relacionados às desigualdades e violências praticadas contra as mulheres no Brasil, e pretende ampliar e qualificar o debate sobre a importância política da participação das mulheres nos espaços de poder e tomada de decisão.
“Quando a gente não fala da violência doméstica, a vítima passa a ter uma impressão de que só ela passa por aquilo, que só ela está sofrendo uma violência, e isso não é verdade. Quando a gente explica pra mulher o que é uma violência doméstica, uma violência psicológica, uma violência moral, mostra que uma mulher, dentro de um casamento, pode sim, por exemplo, ser estuprada pelo seu marido, a gente mostra para essa mulher quais são os direitos que ela tem. E aí, muitas das vezes, além de perceber que ela não está só e que o que ela está passando é um crime, ela percebe que tem meios para buscar ajuda e sair daquele ciclo de violência. Isso é muito importante. Essas medidas de prevenção também vêm para, além de informar as mulheres, também lembrar a toda a sociedade o que é a violência doméstica”, afirma a especialista em Direito da Mulher e de Gênero, Cristina Alves Tubino.
Ex-diretora da Comissão de Enfrentamento à Violência Doméstica Contra a Mulher da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB-DF), Cristina defendeu que a violência contra a mulher é um problema que precisa ser atacado por todos, por ter repercussões que afetam a todos os âmbitos da sociedade. “É muito importante que mulheres, homens e todos nós nos conscientizemos de que a violência doméstica existe, está presente e precisa ser combatida, porque não é um problema só daquela mulher que foi agredida, é um problema de todo mundo e tem repercussões que afetam a todos nós”, ressaltou.
“Mulheres vítimas de violência doméstica, se lesionadas ou sofrendo danos psicológicos, podem vir a ser afastadas dos seus trabalhos, o que acaba onerando, por exemplo, o sistema da Previdência Social. Além disso, precisam ser atendidas no sistema médico do Sistema Único de Saúde (SUS), o que também gera gastos. Às vezes, elas ficam sem poder trabalhar e, muitas vezes, os filhos delas vão acabar tendo algum tipo de dificuldade escolar e isso vai acabar trazendo ônus, também, dentro da questão educacional”, complementou.
Pintando o oito
Agosto é visto como o mês de enfrentamento à violência doméstica contra a mulher por ser o mês em que foi aprovada a Lei Maria da Penha — reconhecida como uma das maiores conquistas em defesa da causa no país. Promulgada em 7 de agosto de 2006, a lei completa 18 anos em 2024.
A cor lilás foi escolhida por simbolizar a luta contra a violência de gênero e também simboliza respeito. Historicamente, o lilás tem raízes simbólicas ligadas ao movimento feminista, e é frequentemente associado à luta pelos direitos das mulheres e à igualdade de gênero.
A presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-DF, Nildete Santana de Oliveira, argumentou que a realização da campanha do Agosto Lilás e de outras ações relacionadas é permite a difusão da noção de que a violência contra a mulher não ocorre exclusivamente de forma física, e que, muitas vezes, decorre de uma sequência de eventos que envolve a retirada da vítima de sua rede de apoio.
“Nenhum relacionamento começa com violência. O homem começa com cuidado, com carinho, com engano e depois é que ele vai tirando todas as perspectivas de dignidade da pessoa humana daquela mulher, ele vai diminuindo, agredindo com palavras, vem com violência psicológica e só posteriormente a isso é que vem uma violência física. Ele tira a mulher da proximidade de sua rede de apoio dos seus familiares, às vezes do emprego e aí, depois que a mulher fica sem essas perspectivas de apoio, sem sua rede de apoio psicológico, de apoio familiar, dos amigos, é que começa efetivamente a violência física”, explicou.
A presidente da comissão reforçou a importância de que as vítimas denunciem seus agressores. Para ela, por mais que essas vítimas possam se sentir despreparadas para realizarem a denúncia, esse é o primeiro passo para se desvencilhar da toxicidade de um relacionamento violento. “O melhor caminho é sempre a denúncia, mesmo que a vítima não esteja completamente preparada. Quando ela faz a denúncia, ela dá um passo difícil de retroceder. A partir desse primeiro passo é que ela pode andar para frente para sair desse relacionamento tóxico, desse relacionamento com violência”, defendeu.
Fomento à voz
No Distrito Federal, a campanha do Agosto Lilás também teve início na quinta, sob a coordenação da Secretaria da Mulher do Distrito Federal (SMDF). A ação contará com diversos eventos destinados à divulgação dos serviços especializados da rede de atendimento à mulher e dos mecanismos de denúncia, e contará com a realização de palestras, encontros, distribuição de material informativo e ações de mobilização para fortalecer o enfrentamento a essa violência.
Uma das ações no DF é a campanha Mulher, Não se Cale!, lançada na sexta-feira (2/8), na praça ao lado da Feira Central de Ceilândia. A iniciativa percorrerá as principais feiras do DF até o dia 22 de setembro para levar informações, apoio e conscientização sobre os tipos de violência de gênero.
A secretária da Mulher do DF, Giselle Ferreira, afirmou que a ação visa esclarecer às mulheres que a violência vai além da agressão física e encorajar vítimas a denunciar e buscar opções de evasão da violência.
“A gente leva os canais de denúncia e leva informações sobre tipos de violência contra a mulher para locais de grande circulação. Hoje, se você for à feira da Ceilândia, ela está toda sinalizada com essa campanha. A violência é muito mais que física, ela é psicológica, moral e além. Então, a gente tem que levar o conhecimento, porque o conhecimento encoraja a mulher e inibe o agressor”, explicou.
Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), entre janeiro e março de 2024, o DF teve 4.674 vítimas de violência doméstica — uma média de 52 casos registrados diariamente. Contudo, Giselle Ferreira alegou que as ações de enfrentamento realizadas pelo GDF diminuíram o número de feminicídios na unidade federativa em 63% no primeiro semestre do ano.
“No primeiro semestre, diminuímos o número de feminicídios em 63%. A gente tem acompanhado essa redução, mas só vamos comemorar quando for zero. Os equipamentos públicos — Casa da Mulher Brasileira, Centros de Atendimento Especializado à Mulher — também têm aumentado muito a procura por parte das mulheres, porque elas entendem que a nossa Secretaria da Mulher é para prevenção, é para orientação, é para capacitação. Por isso que essas campanhas são tão importantes para a gente divulgar o trabalho da Secretaria da Mulher”, finalizou.
*Estagiário sob supervisão de Ronayre Nunes
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