questão indígena

Marco temporal: STF busca acordo para agradar indígenas e ruralistas

Tema tem decisões conflitantes entre Judiciário e Legislativo. Corte busca saída que seja aceita por povos originários e ruralistas

residente do STF, ministro Luís Roberto Barroso abre a primeira reunião da comissão especial de conciliação designada pelo ministro Gilmar Mendes para tratar das ações que envolvem o marco temporal para demarcação de terras indígenas. -  (crédito: Gustavo Moreno/STF)
residente do STF, ministro Luís Roberto Barroso abre a primeira reunião da comissão especial de conciliação designada pelo ministro Gilmar Mendes para tratar das ações que envolvem o marco temporal para demarcação de terras indígenas. - (crédito: Gustavo Moreno/STF)

O Supremo Tribunal Federal (STF) deu início, ontem, a uma série de audiências para tentar uma conciliação sobre o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Os debates estão previstos para ir até 18 de dezembro. A Corte rejeitou ações que pediam que o dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, fosse o parâmetro para a definição das reservas — e considerou essa proposta inconstitucional. O Congresso, porém, reagiu e aprovou a Lei 14.701/23, que estabelece o marco.

Para a procuradora da República Eliana Torelli, que representa a Procuradoria-Geral da República (PGR) na comissão, há "alguma margem" para negociação no tema "mas sem nunca abrir mão dos direitos dos povos indígenas". "Grande parte da violência decorre da omissão do Estado brasileiro", lembrou. A PGR, porém, é apenas observadora e não terá voto na comissão.

O ministro Gilmar Mendes, que propôs as audiências, rebateu críticas de que uma tentativa de conciliação seria um "balcão de negócios". Para o decano do STF, é preciso entender as razões de todos os envolvidos antes que a Corte decida novamente sobre a matéria.

"Conforme consignei em decisões proferidas nestes autos, a questão relativa aos direitos dos povos originários, profunda em suas origens e sistêmica em suas consequências, não será resolvida apenas com uma decisão judicial. É curioso observar que a instauração desta comissão especial tenha ensejado o protesto de vozes que, incapazes de compreender a função da jurisdição constitucional e de analisar a crise sob todos os ângulos, rotulam esta mesa de debates como bazar de negócios", criticou.

Gilmar defendeu o diálogo entre todos os afetados pelo proposta do marco. "Não há verdadeira pacificação social com a imposição unilateral de vontades e visões de mundo. Ignoram que sem diálogo honesto, tolerância e compreensão recíproca, nada surgirá, muito menos a afirmação de direitos fundamentais. Desconsideram o que os povos originários ensinam há gerações àqueles que aportaram nestas terras: este país comporta todos nós, em seus múltiplos modos de vida e valores", ressaltou.

Para o líder do governo no Senado, Jacques Wagner (PT-BA), a audiência de conciliação é para "não eternizar" os confrontos envolvendo os povos originários. "A eternização dos problemas não é salutar para ninguém, nem para indígenas, nem para não indígenas", afirmou o parlamentar, que é um dos representantes do Senado na comissão.

A senadora Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro, disse esperar que se alcance um "denominador comum". "Podemos caminhar se todos viermos despidos de preconceitos. Que possamos chegar a um denominador comum sem que ninguém saia prejudicado. Temos coisas graves acontecendo, como invasões", frisou.

O principal momento de constrangimento na audiência foi quando representantes dos povos nativos foram barrados pela segurança da Corte na tarde de ontem. O caso ocorreu quando os indígenas tentaram acessar o prédio do tribunal para participar da primeira audiência de conciliação. Isso levou o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, a se manifestar logo no começo da audiência.

A próxima audiência está marcada para o próximo dia 28. Prossegue em 9 e em 23 de setembro, das 15h às 19h.

Acusação de omissão

O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) autorizou a atuação da Força Nacional de Segurança Pública na segurança dos indígenas da região de Rio dos Índios (RS). Porém, a corporação vem sendo acusada pelos representantes dos povos nativos de não reprimir ações violentas pelos produtores rurais que se recusam a deixar as terras demarcadas.

Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), os indígenas acusam a Força Nacional de ser conivente com a violência contra os povos originários. Isso porque é acusada de abandonar as retomadas das Terras Indígenas Panambi-Lagoa Rica, em Douradina (MS), e Kurupa Yty e Pikyxyin, em Dourados (MS), no último final de semana. Os dois territórios foram alvos de novos ataques armados de ruralistas.

O secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Eloy Terena, procurou o MJSP para cobrar explicações sobre a retirada da Força Nacional dos dois territórios sul-matogrossenses. Tanto que pediu que fosse garantida a permanência do efetivo no local para coibir novos casos de violência.

Ao Correio, o MJSP negou, por meio de nota, que as equipes da Força Nacional tenham sido retiradas do local. A pasta afirmou que o efetivo da força no Mato Grosso do Sul será reforçado.

No caso da reserva indígena do Rio Grande do Sul, a corporação auxiliará os servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, com apoio das forças de segurança estaduais, por 90 dias. A Terra Indígena (TI) Rio dos Índios, no município de Vicente Dutra, foi homologada em abril de 2023. (Com Agência Estado)

 

*Estagiário sob a supervisão de Fabio Grecchi

 

 

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postado em 06/08/2024 03:55
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