O Brasil superou a média global em igualdade de gênero, mas ainda está atrás de outros países latinos como o México, o Uruguai, o Peru e o Paraguai. Segundo o Banco Mundial, por meio do relatório Mulheres, Empresas e a Lei (WBL, na sigla em inglês), publicado neste ano, o planeta avançou 77,9 em 100 no índice, considerando a realidade de 190 economias ao redor do globo. O Brasil, por sua vez, pontuou 85,0, mantendo o mesmo resultado da edição anterior. Para Natália Mazoni, especialista em Gênero e Desenvolvimento Internacional do Banco Mundial, há lacunas na legislação que atrasam a igualdade de gênero. “Apesar de contar com a Maria da Penha como legislação modelo no combate à violência de gênero, o Brasil ainda apresenta desempenho insuficiente nesta esfera, com lacunas na proteção contra o assédio sexual em locais públicos e o casamento infantil”, apontou. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Quais são as maiores dificuldades para alcançar a equidade de gênero na sociedade?
Os empecilhos são multifacetados. A começar pela persistência de desigualdades do ponto de vista legal. Globalmente, as mulheres possuem apenas dois terços dos direitos legais que os homens têm, o que impacta negativamente sua participação econômica e acesso a melhores oportunidades no mercado de trabalho e na esfera empreendedora. Outro empecilho crítico é a implementação inadequada das leis existentes.
Algumas nações já avançaram nessas questões, certo?
Embora muitos países tenham avançado na criação de legislação para promover a igualdade de gênero, a aplicação dessas leis permanece deficiente. Esse “gap de implementação” significa que, na prática, as mulheres continuam a enfrentar barreiras significativas no acesso a direitos econômicos e sociais, apesar das reformas legais. Essa combinação de lacunas na legislação e na implementação perpetua a desigualdade de gênero e impede o progresso em direção a uma sociedade mais equitativa.
Quais são os destaques do relatório do Banco Mundial?
O relatório destaca avanços e desafios na promoção da igualdade de gênero no ambiente econômico. O relatório deste ano expandiu a cobertura de seus indicadores originais — mobilidade, local de trabalho, remuneração, casamento, parentalidade, empreendedorismo, ativos e pensão — para incluir dois novos indicadores: segurança e cuidado infantil, refletindo uma abordagem mais abrangente para medir a inclusão econômica das mulheres.
A questão de gênero no trabalho também foi observada?
Em 2023, os governos de alguns países promoveram reformas para avançar três categorias: igualdade de remuneração, direitos parentais e proteções no local de trabalho. Azerbaijão, Jordânia, Malásia, Omã, Serra Leoa e Uzbequistão implementaram reformas para garantir remuneração igual por trabalho de igual valor e remover restrições ao trabalho das mulheres em diferentes setores da economia. Chipre, Malásia, Omã, Ruanda, Serra Leoa, República Eslovaca e Togo introduziram reformas para expandir licenças maternidade e paternidade, e para proibir a demissão de mulheres grávidas. Armênia, Guiné Equatorial, Jordânia, Moldávia e Suriname implementaram reformas para proibir o assédio sexual no local de trabalho. Apesar do progresso observado, as disparidades de gênero ainda são amplas e persistentes.
Onde está a maior desigualdade?
Os maiores desafios se encontram no indicador de segurança, que tem uma pontuação média global de apenas 36 em 100, o que indica que as mulheres ao redor do mundo têm apenas um terço das proteções legais necessárias contra violência doméstica, assédio sexual, casamento infantil e feminicídio. Embora 151 economias tenham leis contra o assédio sexual no local de trabalho, apenas 39 têm leis que o proíbem em espaços públicos, expondo mulheres a perigos ao usar transporte público. Além disso, 139 economias carecem de legislação adequada contra o casamento infantil, que geralmente impede o futuro educacional e econômico das meninas.
A Lei Maria da Penha foi um importante avanço…
Apesar de contar com a Maria da Penha como legislação modelo no combate à violência de gênero o Brasil ainda apresenta desempenho insuficiente nesta esfera, com lacunas na proteção contra o assédio sexual em locais públicos e o casamento infantil. Além disso, a percepção dos especialistas contrasta com o cenário legal: 57,1% dos especialistas consultados no Brasil acreditam que quase nenhuma mulher brasileira está realmente livre da violência de gênero na prática.
O que é preciso fazer para viabilizar as oportunidades econômicas para as mulheres?
Três pontos são essenciais para viabilizar as oportunidades econômicas para as mulheres: 1. Identificar as áreas de melhoria é crucial para mobilizar esforços para reformas legislativas visando eliminar as barreiras ainda presentes que restringem a participação econômica das mulheres. 2. Uma lei que não é implementada é como uma carta escrita, mas nunca enviada. Ela não alcança os efeitos que desejamos observar. 3. Por último, é crucial uma mudança estrutural que considere as normas sociais e culturais que perpetuam a desigualdade de gênero. Iniciativas de educação e sensibilização são fundamentais para alterar percepções e comportamentos que restringem as aspirações profissionais das mulheres.
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br