O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu cinco dias para a Procuradoria-Geral da República (PGR) se manifestar sobre a resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que dificulta o acesso das mulheres ao aborto legal em casos de estupro. Em maio, o magistrado havia suspendido a norma após o PSol entrar com uma ação questionando a constitucionalidade do documento.
A resolução proibia a utilização de uma técnica clínica (assistolia fetal) para interrupção de gestações acima de 22 semanas após a violência sexual. O método, considerado o mais seguro, consiste em usar medicamentos para interromper os batimentos cardíacos do feto, antes da sua retirada efetiva do útero. Segundo a ação do PSol, em conjunto com o Centro de Estudos em Saúde (Cebes); a Sociedade Brasileira de Bioética (SBB); a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e a Associação Brasileira da Rede Unida, a proibição da técnica restringiria a liberdade científica e o livre exercício profissional dos médicos, além de, na prática, submeter meninas e mulheres à manutenção de uma gestação compulsória ou à utilização de técnicas inseguras para o aborto.
A decisão de Moraes começou a ser julgada no plenário virtual do STF, mas o julgamento foi interrompido por um pedido de destaque do ministro Nunes Marques, o que leva o caso para o plenário físico. Ainda não há previsão para o caso ser analisado pela Corte. Na avaliação de Moraes, há, na hipótese, indícios de abuso do poder regulamentar por parte do CFM ao limitar a realização de procedimento médico reconhecido e recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e previsto em lei.
O magistrado afirmou que, aparentemente, o Conselho ultrapassou sua competência regulamentar, impondo tanto ao profissional de medicina quanto à gestante vítima de um estupro, uma restrição de direitos não prevista em lei, “capaz de criar embaraços concretos e significativamente preocupantes para a saúde das mulheres”. A liminar de Moraes levou a bancada evangélica da Câmara dos Deputados a buscar a aprovação de um projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação, mesmo em casos de estupro, ao crime de homicídio.
O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) informou ao STF que estão paralisadas todas as investigações abertas para apurar possíveis desvios éticos a médicos que realizaram abortos legais no estado. Na avaliação da advogada Beatriz Alaia Colin, especialista em direito penal, há, sim, indícios de abuso do Conselho ao aprovar a resolução. “A legislação brasileira não estabelece expressamente quaisquer limitações circunstanciais, procedimentais ou temporais para a realização do chamado aborto legal. Por isso, a norma consiste em abuso do poder regulamentar por parte do CFM”, defendeu.
Críticas
A resolução foi alvo de críticas de associações médicas e da área da saúde, como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia (ABMMD), e a Sociedade Brasileira de Bioética. Em junho, o presidente da entidade, José Hiran Gallo, se reuniu com o ministro Alexandre de Moraes para discutir o assunto.
Segundo ele, o método é desumano. “O procedimento da assistolia fetal é cruel para o feto. Nós viemos explicar para ele (Moraes) como é essa técnica. Essa técnica é feticídio”, afirmou a jornalistas, na ocasião. No início deste mês, o CFM divulgou uma nota sobre o PL do aborto.
A entidade lamentou “distorções” sobre o assunto e afirmou que não teve participação ou contribuição para a elaboração proposta. “O tema deve ser discutido no âmbito do Congresso Nacional, ouvindo todos os segmentos envolvidos e promovendo um amplo debate com a sociedade”, disse.
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