O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) recebeu, na quinta-feira (11/7), um pedido de habeas corpus para trancar ação penal do Ministério Público de Alagoas (MP-AL) contra um homem negro acusado de injúria racial (racismo) contra um homem branco. A ação do MP foi aceita em primeira e segunda instâncias na Justiça alagoana.
Nove advogados assinam a petição direcionada à presidência do STJ, a qual alega que o Judiciário alagoano acolheu a tese do "racismo reverso", sem fundamento legal no Brasil.
Os advogados afirmam que a Lei nº7.716/89, que tipifica o crime de racismo, visa proteger "grupos historicamente discriminados na sociedade brasileira".
"As práticas discriminatórias da sociedade brasileira sempre se voltaram à população negra, que sofre um processo de marginalização e exclusão social e cultural. Desta maneira, o racismo, enquanto ideologia e mecanismo de manutenção e reprodução de poder, não constitui mero ato de xingamento, desprovido de um contexto histórico", diz um trecho do habeas corpus, disponibilizado na coluna de Carlos Madeiro no Uol.
A decisão do STJ será determinante para enterrar ou abrir precedente em casos parecidos nos Judiciários nacionais. Nesse sentido, a Defensoria Pública da União (DPU) publicou uma nota técnica contra o uso do "racismo reverso" no Judiciário nacional.
"Ora, dizer que uma pessoa branca é vítima de racismo no Brasil tem como premissa a invenção de um contexto histórico e social de exclusão, silenciamento, violência e extermínio que nunca
existiu para esse segmento populacional. Por evidente, nem a lei, nem os tribunais, têm a capacidade de (re)construir essa História, que, ao fim e ao cabo, sequer poderia ser tida como revisão, mas como verdadeiro negacionismo histórico", diz a nota.
O texto ainda ressalta que a tese do "racismo reverso" nega as práticas discriminatórias e segregacionistas da sociedade brasileira, com foco na população negra e nos povos originais. A decisão por aceitar a decisão da Justiça alagoana, de acordo com a DPU, "cria precedente que descredibiliza e mesmo invalida a luta histórica antirracista, já que abre divergência quanto ao real significado do racismo no Brasil".
O caso
A Justiça de Alagoas recebeu o caso em setembro de 2023, quando um italiano realizou uma queixa contra um homem negro de Coruripe, no litoral do estado. Em diálogo pelo WhatsApp em 6 de julho, o réu disse ao estrangeiro que "essa cabeça branca, europeia e escravagista não deixava enxergar nada além dele mesmo".
Com a sanção da lei nº 14532/2023, a ação penal passou a ser pública, e só o MP pode fazer denúncia de suspeitos. Em janeiro, a Promotoria decidiu fazer uma denúncia ao homem negro por "crime de injúria racial". O juiz aceitou a denúncia. Quem realiza a defesa do réu é o Instituto Negro de Alagoas (Ineg).
Em maio, a Câmara Criminal do TJ-AL negou recurso do Ineg para trancar a ação. O homem permaneceu como réu no processo.
"[O réu], através do aplicativo whatsapp, chamou a vítima de “escravista cabeça branca europeia”, além de mandar várias mensagens dizendo que este era uma pessoa má e que queria dar golpe nas pessoas [..] Acrescentando que tal fato causou um mal-estar na vítima e seus familiares e por se sentir ofendido por tal situação, procurou a delegacia", escreveu o delator João Luiz Azevedo Lessa ao não aceitar o habeas corpus em segunda instância.
Ao Correio, o Ineg disse que considera o caso uma aberração jurídica. "Não existe, no ordenamento jurídico brasileiro, a possibilidade de que pessoas que compõem grupos socialmente majoritários e privilegiados possam sofrer crimes raciais, em função de seu pertencimento à este grupo", afirma.
A defesa da outra parte não foi encontrada, mas o espaço segue aberto para possíveis manifestações.
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br