A Justiça de São Paulo determinou que a Cacau Show deve indenizar em R$50 mil um homem que foi injustamente acusado de importunação sexual por funcionários da empresa em 23 de abril. Ele foi preso e teve que mostrar o pênis aos policiais para "reconhecimento".
Cabem recursos contra a sentença do juiz Fábio de Souza Pimentel, da 32ª Vara Cível da capital, publicada no início do mês. Ao Correio, a Cacau Show informou que tomou ciência da decisão e está "avaliando os próximos passos".
Ao término de um passeio de bicicleta entre São Paulo e Itapevi (grande São Paulo), o consultor financeiro Felipe Passos decidiu parar em uma loja da Cacau Show para tomar um sorvete.
Minutos depois, o consultor escutou um burburinho entre os colegas ciclistas de que um homem teria mostrado o pênis para uma funcionária da loja — inclusive manejado e colocado o membro no balcão.
A Polícia Militar foi até o local, e o gerente apontou que Passos era o responsável pela importunação sexual. À Folha de S.Paulo, ela disse que ficou em choque no momento. "Poxa, eu não tinha feito nada", afirmou.
No relato, Passos conta que foi levado à delegacia e repetiu ao delegado o que tinha dito aos PMs na loja: ele não tinha feito nada, e inclusive usava um macacão com abertura do zíper pelas costas. Só seria possível mostrar o pênis se estivesse praticamente sem roupa.
A suposta vítima, Vitoria Cardoso, apresentou então uma testemunha. Harison Souza, colega de trabalho dela, confirmou que o consultor teria mostrado o pênis.
Passos foi levado para uma cela na própria delegacia. Ali, ele foi obrigado a mostrar o pênis para as escrivãs, supostamente a pedido do delegado. Elas queriam "reconhecer" o membro e saber se batia com as características apontadas pela vendedora.
O advogado de Passos, Ronan Bonello, informou que o cliente precisou mostrar o pênis ao menos três vezes para as escrivãs e os PMs e, só não realizou o quarto reconhecimento porque a defesa, já no local, se opôs.
Segundo o advogado, a suposta vítima dizia que o pênis de Passos era preto. "Aí, você vê o cara é loiro, de olhos verdes. As investigadoras mesmo falaram: ‘É a primeira vez que temos que ver o pênis de um cara para ver se é pênis preto ou não’. As próprias investigadoras ficaram indignadas. Mas é o delegado quem manda. Então ele mostrou o pênis para praticamente a delegacia toda".
Em depoimento, o PM Elton Soares Coelho disse que o gerente da Cacau Show entregou a cópia de um vídeo de câmera de segurança da loja. Em péssima qualidade, as imagens não mostraram Passos exibindo o pênis.
Apesar de as imagens contrariarem o relato da suposta vítima, o delegado decidiu manter o flagrante, ao alegar que a filmagem mostrava quando "o homem faz um movimento bem rápido de abaixar a frente do short". Além disso, argumentou que os crimes sexuais são cometidos "às ocultas", o que torna a palavra da vítima é muito importante.
Passos foi preso e solto no dia seguinte na audiência de custódia.
A Cacau Show, acionada por Passos na esfera cível, alegou não ter detectado crime ao analisar as imagens. Os funcionários, chamados a dar explicações, admitiram ter mentido contra o cliente, o que levou a empresa a demiti-los.
O processo diz que, "ao ser questionada acerca do ocorrido, sra. Vitória Cardoso confirmou que havia mentido, sem apresentar justificativa plausível." Procurado pela Promotoria, o sr. Harison Souza confessou não ter presenciado o acontecido, "tendo sustentado a versão apresentada pela sra. Vitória dado o vínculo de amizade que mantinha com a mesma".
À Justiça, a Cacau Show argumenta que não tinha responsabilidade pela prisão do consultor, porque apenas acionou a polícia. Ao Correio, a empresa acrescentou que "no que tange aos depoimentos dos ex-funcionários somente eles podem esclarecer as razões que os motivaram a fazer as acusações".
Em nota enviada ao Correio, a Polícia Civil de São Paulo informou que "não há registro nem precedente legal para a dinâmica de reconhecimento mencionada na reportagem". "O caso foi arquivado pelo Poder Judiciário em maio de 2023 e demais detalhes devem ser verificados com a Justiça", acrescentou a organização.
Leia a nota na íntegra:
"A Polícia Civil esclarece que não há registro nem precedente legal para a dinâmica de reconhecimento mencionada pela reportagem. O homem citado foi preso em flagrante, no dia 23 de abril de 2023, e solto um dia depois, após passar por audiência de custódia. O caso foi registrado na DDM de Barueri. Na época dos fatos, a autoridade policial ouviu a vítima, uma testemunha, o autor e demais partes envolvidas na ocorrência. Um pendrive com imagens de câmeras do estabelecimento comercial foi apreendido e o vídeo, analisado pelo promotor de Justiça. O caso foi arquivado pelo Poder Judiciário em maio de 2023 e demais detalhes devem ser verificados com a Justiça."
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