O desmatamento no Cerrado aumentou 67,7% no ano passado, se comparado com 2022. A constatação é do Relatório Anual do Desmatamento no Brasil, divulgado ontem pelo MapBiomas. De acordo com o levantamento, a maior parte da área devastada ocorreu na região do Matopiba — composta pelos estados da Bahia, Piauí, Tocantins e Maranhão — e correspondeu a 47% da vegetação nativa perdida pelo país no período.
A devastação do Cerrado, em 2023, foi medida em 1.110.326 hectares, contra 662.186 hectares devastados em 2022. Isso levou o bioma a superar, pela primeira vez, a Amazônia no sistema do MapBiomas Alerta, que faz a coleta de dados desde 2019. O avanço da fronteira agrícola é a principal razão para o desmatamento.
"A região vem atraindo investimentos devido ao alto valor de mercado, como as commodities. Isso faz com que grandes áreas do Cerrado sejam convertidas para o uso agrícola", aponta a mestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável Talita Martins.
Ela alerta que a vulnerabilidade do Cerrado se potencializa porque o bioma "não recebe o mesmo nível de proteção e atenção que a Amazônia, por ser mais famosa e ter todos os olhares voltados a ela". Talita, porém, destaca que "o Cerrado tem uma riqueza biológica muito grande. Seus solos são mais adequados à agricultura, se comparados com os da Amazônia, que são ácidos e pobres em nutrientes. Essa característica o torna mais vulnerável ao desmatamento por falta de reconhecimento adequado do valor que tem".
Amazônia
Enquanto o Cerrado enfrenta uma escalada no desmatamento, a Amazônia registra queda de 62,2% na devastação — 454,27 mil hectares derrubados em 2023 — se comparado a 2022. Outros biomas que apresentaram redução foram o Pampa, com 50%, e a Mata Atlântica, com 60%. No sentido contrário, o Pantanal teve um aumento de 59% na destruição e a Caatinga, 43%.
O relatório do MapBiomas aponta que, dos 50 municípios que mais desmataram em 2023, 33 estão no Cerrado. No Maranhão as derrubadas avançaram velozmente e foram 331.225 hectares de vegetação nativa destruída. Tal crescimento coloca o estado à frente de outros líderes históricos da devastação, como Pará e Mato Grosso — que registraram quedas de 60,3% e 32,1%, respectivamente.
Por sua vez, o Tocantins botou abaixo 230.253 hectares de Cerrado, tornando-se o terceiro maior desmatador em 2023, atrás da Bahia (290.606 hectares) e do Maranhão. Contrariando a tendência dos estados que compõem o Matopiba, o Piauí registrou diminuição na área desmatada em 2023.
Indígenas
Ente os maiores prejudicados pelas derrubadas no Cerrado estão as terras indígenas. A TI Porquinhos dos Canela-Apãnjekra, no Maranhão, foi a mais afetada — com 2.750 hectares devastados em 2023. No total, 7.048 hectares de vegetação em terras indígenas no bioma foram postos abaixo no ano passado, o que representa o aumento de 188% em relação a 2022.
Outro aspecto destacado pelo relatório do MapBiomas é a mudança no tipo de vegetação desmatada. Em 2023, pela primeira vez, houve um predomínio em formações savânicas, com 54,8%, superando as formações florestais, com 38,5%, que haviam dominado nos quatro primeiros anos do levantamento.
Nos últimos cinco anos, o Brasil perdeu 8.558.237 hectares de vegetação nativa, equivalente a duas vezes o estado do Rio de Janeiro. Apesar da queda de 11,6% no desmatamento em 2023 — 1.829.597 hectares perdidos em comparação com 2.069.695 hectares em 2022 —, houve um aumento de 8,7% no número de alertas de devastação de biomas se comparado com o ano anterior.
*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi