O Conselho Federal de Medicina (CFM) prepara um recurso para tentar reverter a decisão individual do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu uma resolução publicada pela entidade no mês passado para restringir o aborto em casos de estupro.
O CFM proibiu os médicos de fazerem um procedimento clínico chamado "assistolia fetal", que consiste na indução da parada do batimento cardíaco do feto antes da retirada do útero, em gestações com mais de 22 semanas, mesmo nos casos de violência sexual.
Como o método é considerado essencial para o aborto depois das 20 semanas, na prática, a resolução dificulta a interrupção da gestação.
Uma das justificativas usada pelo Conselho de Medicina foi a de que o procedimento é "profundamente antiético e perigoso em termos profissionais". "Optar pela atitude irreversível de sentenciar ao término uma vida humana potencialmente viável fere princípios basilares da medicina e da vida em sociedade."
O PSOL acionou o STF, alegando que houve interferência indevida na independência dos médicos e violação ao direito à saúde das mulheres.
Alexandre de Moraes decidiu suspender os efeitos da resolução até o STF bater o martelo sobre o tema, o que na prática privilegia a independência dos médicos para decidirem fazer ou não o procedimento. Ele afirmou que o Conselho Federal de Medicina "abusou do poder regulamentar" ao criar barreiras para o aborto legal.
O ministro argumentou que, nos casos de estupro, o ordenamento penal "não estabelece expressamente quaisquer limitações circunstanciais, procedimentais ou temporais para a realização do chamado aborto legal".
A decisão liminar foi enviada para análise dos demais ministros. O caso será julgado no plenário virtual do STF a partir do dia 31 de maio. Nessa modalidade, os ministros registram os votos em uma plataforma online, sem debate em tempo real.
Como a pauta do plenário físico está definida nas próximas sessões, não havia data próxima disponível para encaixar o processo. Além disso, por se tratar de uma decisão provisória, que ainda será debatida no mérito, o plenário virtual foi considerado a melhor opção. Assim, se for confirmada, a decisão de Alexandre de Moraes contará com a chancela dos colegas, o que reduz o desgaste ao ministro pelas críticas dirigidas por setores conservadores.
O Conselho de Medicina já se movimenta para tentar restabelecer a validade da resolução. A autarquia terá 10 dias para se manifestar ano processo. A decisão de Alexandre de Moraes foi tomada sem ouvir o CFM. O ministro alegou que o caso era urgente e que havia risco de "perigo de lesão irreparável".
Em nota, o Conselho Federal de Medicina disse que "estanha" não ter sido notificado para prestar informações antes da decisão. A entidade afirmou ainda que vai encaminhar justificativas que, em sua avaliação, "serão suficientes para o convencimento dos ministros do STF sobre a legalidade de sua resolução".
O CFM reúne argumentos técnicos sobre a eficiência do procedimento. Também deve alegar que a resolução foi editada no exercício de suas atribuições.
O Supremo Tribunal Federal tem na fila para julgamento uma outra ação, também movida pelo PSOL, que discute a descriminalização do aborto até a 12ª semana da gestação. O processo está engavetado, sem previsão de entrar na pauta. O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do tribunal, que é a favor da mudança, avalia que o debate ainda não está maduro.