Tragédia no Sul

Mães da resistência: mulheres gaúchas celebram estarem a salvo e com seus filhos

Este não é o Dia das Mães que esperavam. Mas, seguras e ao lado dos filhos, elas têm bons motivos para celebrar

Porto Alegre (RS) — Em meio a muitas perdas e incerteza quanto ao futuro, o Dia das Mães chega para as gaúchas em um momento atípico, mas com esperança de recomeço. Um sentimento geral de tristeza ronda o Rio Grande do Sul, bem como a solidariedade e empatia. O Correio conversou com algumas mães que estão passando a data em abrigos de Porto Alegre.

"Essa enchente invadiu várias casas, as pessoas perderam suas coisas, seus empregos, e estamos no abrigo. É uma tristeza passar por tudo isso, mas estar aqui já é uma grande coisa porque tem lugar pra gente ficar", conta Claudia Pinheiro, 21 anos, de Guaíba, que está grávida do segundo filho. Ela foi resgatada por uma equipe em Porto Alegre, onde estava quando as chuvas castigaram a região, e foi levada a um abrigo.

"Desejo a todas as mães guerreiras, que estão batalhando pelos seus filhos, tudo de bom, paz, amor. E também que esse ano não traga outra coisa ruim para as mães, que elas consigam tudo o que perderam", diz a gestante, com uma ponta de esperança.

Para Lara Fernanda Boaventura, 40 anos, estudante de psicologia e vendedora, o abrigo tem sido um bom lar, com comida gostosa e acolhimento. No entanto, ela não titubeia sobre qual o presente de Dia das Mães ideal: voltar para casa e ter novamente água e luz. Ela e três filhos estão em um abrigo da capital gaúcha, enquanto o filho mais velho e o marido seguem em casa para cuidar da segurança do local.

A enchente inundou o primeiro andar da casa da família de Lara. Ela e os três filhos resolveram sair, com medo de o nível da água subir. Por terem tido apenas danos materiais nas enchentes, ela se considera "no lucro" e mostra uma empatia com as outras histórias que ouviu.

"Acho que vai ser um recomeço não só pra mim, mas para muitas mães. A gente acredita que vai ser tudo diferente. Não é aquela história do 'novo normal', o que vai ser diferente é a solidariedade das pessoas umas com as outras. Porém, vão ter algumas mães que nunca mais estarão com seus filhos e filhos que nunca mais estarão com suas mães e vão ter que achar um jeito de recomeçar", reflete emocionada a estudante de psicologia. O principal desafio de hoje, para ela, vai ser não poder estar com a mãe, que mora no interior do estado.

Carina Nunes, 34 anos, autônoma, conta que ainda nem tinha parado para pensar sobre a data. O presente que ela deseja também é voltar para casa, junto de suas duas filhas. "Foi muito rápida a coisa. Na segunda, era meio-dia e meia e uma vizinha começou a gritar dizendo que a água estava perto e quando a gente viu já estava em casa. Deu para levantar algumas coisas e colocar na parte de cima para salvar. E aí a água foi vindo e caminhamos até uma praça, paramos num banco, a água veio mais e fomos para um morro que tinha na frente da praça. Depois fomos para outra rua e uma conhecida nos deu carona", relembra a mulher sobre a fuga que teve com as filhas.

Apesar de estar abalada e preocupada com a situação que enfrenta, a mulher se diz aliviada, que as meninas estão gostando e brincando bastante. O local conta com atividades recreativas para as crianças e jovens que estão lá.

Valéria, 33 anos, autônoma, também gosta muito de onde está ficando com os filhos na capital gaúcha. "É divertido, conhecemos pessoas novas, a gente ri, brinca", conta animada. No entanto, ela desabafa que o momento é perverso.

"Esses dias eu chorei não por mim, mas por todos, porque foi uma perda muito cruel. A parte de ficar em abrigo é a primeira vez. Estou sendo também voluntária para ajudar as pessoas, para poder também ocupar a cabeça e não ficar pensando no que eu perdi, no que meus amigos perderam", conta emocionada. Para ela, o dia "não vai ser muito legal", mas ela pretende comemorar por estar com os dois filhos.

 

Eduarda Pagot / Voluntária do Colégio Julinho -
Eduarda Pagot / Voluntária do Colégio Julinho -
Eduarda Pagot / Voluntária do Colégio Julinho -
Eduarda Pagot /Voluntária do Colégio Julinho -

Cuidado integral

Muitos abrigos estão funcionando na capital gaúcha e Região Metropolitana. De iniciativa da sociedade civil ou em parceria com o município, a intenção das centenas de voluntários envolvidos é a de fazer o local ser o mais confortável possível. Com equipe de saúde física e mental, recreação para crianças e oficinas para os adultos, o espaço atende integralmente as pessoas que ali estão e não sabem quando devem voltar.

Um dos abrigos da reportagem está localizado no Colégio Julinho e aceita doações via Pix em 51996067480. No local estão 130 pessoas, 30 pets e 250 voluntários atuam na organização da estrutura.

O outro fica no bairro Serraria e está destinado somente a mulheres e crianças. Estão sendo atendidas 50 pessoas. Os itens mais necessários neste momento são cestas básicas e cobertores. O Pix é sobrenosbr@gmail.com.

 

 

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