Até esta terça-feira (7/5), as enchentes que atingem o Rio Grande do Sul ceifaram 85 vidas e deixaram 134 pessoas desaparecidas. Cerca de 345 municípios foram afetados pelas águas e 19.368 pessoas vivem, agora, em abrigos, além de 121.957 desalojados, segundo os dados atualizados, ontem, pela Defesa Civil do Rio Grande do Sul.
O desastre natural tem assustado não apenas os gaúchos, mas brasileiros que, de longe, acompanham a situação desesperadora. No Distrito Federal, moradores, como Sidney Bernal, presidente da Estância Gaúcha do Planalto, uniram-se, com o objetivo de arrecadar doações — de alimentos a cobertores — para enviar ao estado.
O Correio conheceu histórias de pessoas que sentem na pele, ainda que de longe, com mais intensidade, os efeitos da tragédia. São familiares que, residentes do DF, vivem a angústia de não poder ajudar, como gostariam, os entes afetados.
Aflição
A gaúcha Gabriele Stürmer, 19 anos, mora na W3 Sul desde o início de 2023. A estudante saiu de Estrela (RS) para cursar educação física em Brasília. Na última quinta-feira, a jovem telefonou para a família em busca de notícias sobre as chuvas, e ouviu que a água estava subindo rapidamente e temiam o alagamento da casa. Por volta da 1h, a chamada caiu e o contato só foi restabelecido após 13 horas, quando Gabriele recebeu uma mensagem da mãe relatando o que ela mais temia: a casa em que cresceu foi tomada pela enchente.
A mãe contou que saíram da residência somente com a roupa do corpo, nadando contra a correnteza, na esperança salvarem suas vidas e os gatos de família. Gabriela contou que ontem, por volta de 12 horas, os familiares ainda não tinham conseguido tomar banho para retirar as sujidades do corpo, uma vez que o fornecimento de energia e água ainda não havia sido normalizado. A estudante explicou que a família se abrigou na casa de uma amiga, que mora no centro, num apartamento localizado no topo de um morro, onde a cheia não alcançou.
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Sobre a mobilização da capital para enviar auxílio, declarou estar orgulhosa com tamanha solidariedade. “A única coisa que eu consegui fazer, estando em Brasília, foi organizar uma ‘vaquinha’ para ajudar meus pais a comprar os móveis de novo. Eu postei nas redes sociais e muitas pessoas que eu nem conheço começaram a compartilhar. Eu achei isso muito legal, consegui arrecadar R$1.500 até agora.”
Otilia Vitória Brustolon, 26 anos, moradora de Santa Maria, ouviu da irmã mais velha e da sobrinha, que vivem em Canoas, em Porto Alegre, relatos que jamais esquecerá. “Minha irmã foi resgatada do telhado, de jet ski, segurando uma corda para ajudar a puxar o barco com outras pessoas. Ela relatou que via muitas pessoas mortas, corpos boiando, pessoas entregando os filhos e ficando para trás”. Abatida, Otília, que é técnica de enfermagem, declarou que deseja ir ao encontro da família e que está à procura de um avião que leve voluntários para, finalmente, conseguir ajudar.
Desespero
No caso de Elisandra Padilha, 42 anos, moradora do Cruzeiro Novo, e Kika Missel, 62, moradora do Sudoeste, o sentimento é semelhante. As duas viram os lugares em que cresceram serem engolidos pela água. Elisandra vive em Brasília com o esposo e as três filhas há 21 anos, mas toda a família permanece no interior do Rio Grande do Sul, em Faxinal do Soturno. Na localidade, os moradores sobrevivem da agricultura e da agropecuária. “As pontes estão destruídas, as estradas estão devastadas, minha família está totalmente isolada. Agora que o rio está baixando, a ajuda está chegando de helicóptero e barcos, mas o problema é que a tragédia acontece em todo o estado, então o socorro precisa ser dividido”, relatou.
Kika mal conseguiu conversar com a reportagem. Em meio a soluços, contou que a casa que tem, em Canoas, está submersa. “O sentimento é devastador, estamos de luto. Tenho uma amiga que ficou mais de 12 horas em cima do telhado esperando ajuda. A Defesa Civil não tinha como resgatar todo mundo. Os amigos que estavam em situação de risco nos ligavam e daqui a gente contatava pessoas para salvá -los. Passamos a madrugada de sábado tentando salvar os amigos”, emociona-se.
Mobilização
Moradores do Sudoeste, Kika Missel, Jorge Lopes, 67 anos, e sua esposa Vera Lúcia Ranzan, 62, estão à frente de arrecadações para enviarem ao estado. Vera contou que sua mãe e sua irmã moram em Bento Gonçalves e, em setembro do ano passado, voluntariaram-se para ajudar pessoas afetadas pelas chuvas daquela época. Agora, ela está em contato com a família, que está ilhada, para enviar doações do DF.
“O que nós fizemos foi olhar para os necessitados. A família dela (da esposa) perdeu praticamente tudo, no ano passado, e ajudaram as pessoas afetadas. Estamos recolhendo itens no bloco do nosso prédio e conseguimos uma parceria com o Iate Clube de Brasília, agora eles estão com vários pontos de coletas para os associados e voluntários”, informou Jorge.
Nesta segunda, Kika passou o dia fazendo compras de itens de higiene e alimentos para enviar ao Sul. Por meio das redes sociais, pede toalhas, lençóis, cobertores e água para levar até a Força Aérea Brasileira (FAB). As doações podem ser entregues no salão dela, localizado no Sudoeste.
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