tragédia no sul

Tragédia no Sul: leptospirose é a nova ameaça aos gaúchos

Chefe da Vigilância Epidemiológica do Rio Grande do Sul afirma que há casos confirmados e cerca de 200 outros são investigados

Governador acompanha trabalhos de limpeza e distribuição de mantimentos em São Sebastião do Caí. -  (crédito: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini)
Governador acompanha trabalhos de limpeza e distribuição de mantimentos em São Sebastião do Caí. - (crédito: Gustavo Mansur/ Palácio Piratini)

A chefe da vigilância Epidemiológica do Rio Grande do Sul, Roberta Vanacor, alertou, ontem que há uma possibilidade de o estado ser assolado por uma epidemia por leptospirose. Em entrevista ao Correio, ela assegurou que há casos confirmados da doença e aproximadamente 200 estão sendo investigados.

"A gente vem monitorando. Estamos com uma estratégia ampla de distribuição da medicação (contra a leptospirose) para que esteja nos municípios. Haverá casos (da doença), mas o que não queremos é a hospitalização e o óbito. Há o risco de se contaminar quando a água recua e deixa a lama. Por isso, a ameaça de transmissão não é somente no momento da enchente, mas também ao se retornar à casa para limpá-la", frisou.

Como os registros da doença estão sendo investigados, não há dados oficiais sobre a infecção. Mas, segundo a chefe da vigilância epidemiológica, o risco de contrair a leptospirose é para todos que têm contato com a água contaminada que inunda boa parte do Rio Grande do Sul.

"O risco é para as pessoas que se expuseram tanto para serem salvas, quanto para os socorristas que fizeram os salvamentos. Quanto maior o tempo de exposição às águas, maior o risco de contaminação. Quanto mais parada, sem correnteza, maior a probabilidade de contaminação", advertiu.

Incubação

Segundo Roberta, o período de incubação da leptospirose é de até 30 dias. "O desastre climático iniciou-se em 25 de abril e o tempo médio de incubação é de sete a 14 dias. Assim, estamos iniciando o período da doença", afirmou.

doencas enchentes rs
doencas enchentes rs (foto: pacifico)

Roberta explicou que a Vigilância Epidemiológica está fazendo o monitoramento de seis "agravos de interesse" — sintomas — intimamente relacionados às enchentes: leptospirose, doença diarreica aguda, hepatite A, acidentes por animais peçonhentos e tétano. "São mais de 80 mil pessoas em abrigos, que perderam as casas e não têm alojamento. Muitas pessoas estão expostas à leptospirose. Nossa preocupação também é para que, no retorno às casas, não haja acidentes com animais peçonhentos (cobras, aranhas, lacraias e escorpiões), pois eles procuram locais secos para se abrigar", observou.

Ela chama a atenção para, no retorno ao lar, proteger o corpo com roupas compridas, botas e luvas. "Na ausência disso, que utilizem sacos plásticos, de preferência dois, para não deixar a pele em contato com a lama ou a água da enchente", esclareceu.

À leptospirose, soma-se a preocupação com as doenças respiratórias. "São muitas pessoas abrigadas no mesmo ambiente. Estamos fazendo a imunização contra a influenza e, depois, será contra a covid-19 nos abrigos", disse. O Sistema Único de Saúde (SUS) pretende concluir até o dia 20 a imunização contra a influenza. Os agentes ainda monitoram casos de dengue no estado.

A enfermeira Brenda Tairini Horst, 24 anos, observa que os sintomas da leptospirose são semelhantes aos de dengue. Ela salienta que basta o contato com a água suja para que a pessoa corra o risco de contrair a doença.

No balanço da tragédia realizado, ontem, pela Defesa Civil gaúcha, são 151 mortos, 104 desaparecidos e 806 feridos. São 77.199 pessoas em abrigos e 540.192 desalojados. O nível do Lago Guaíba desceu para 4,86m e segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) a previsão é de que volte a chover hoje no estado, com risco de temporais.

Surfista deu alerta

Uma das primeiras pessoas a dar o alerta para as doenças causadas pela enchente no Rio Grande do Sul foi o surfista Pedro Scooby, que com amigos ajudou no resgate de pessoas que ficaram ilhadas pelas cheias. Ele usou as redes sociais para advertir que algumas das pessoas que com ele auxiliaram os desabrigados retornaram do estado infectados com o vírus da gripe H1N1. Uma delas, inclusive, precisou ser hospitalizada. Scooby disse, também, que precisou tomar vacinas antitetânica e contra a hepatite A, pouco depois de desembarcar de volta no Rio de Janeiro.

A advertência de Scooby chama a atenção para a nova preocupação das autoridades gaúchas de saúde. Segundo Eduardo Furtado Flores, professor de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), adverte que entre as doenças infecciosas provocadas pela água contaminada não está apenas a leptospirose. Ele chama a atenção para a possibilidade de haver um surto de dengue.

“À medida que as águas baixem e a temperatura suba, pode haver uma grande quantidade de criadouros [do mosquito Aedes aegypti] que são proporcionados por essa água empoçada”, aponta.

O médico Rafael Machado reforça o risco que correm os gaúchos. “Os insetos tendem a proliferar com o acúmulo de água parada e suja. Isso também é um potencial para agravamento das doenças transmitidas pelos mosquitos, como chikungunya, febre amarela e a dengue”, afirma.

Segundo Machado, a advertência feita por Pedro Scooby e o aumento de casos de diarreia causados pela água da enchente são um mau sinal. “Há registros por causa do consumo de água não tratada, pois a estação de tratamento não está funcionando. Ao primeiro sinal de um quadro febril, deve-se procurar atendimento para que a doença não avance”, indica.

Indagado sobre os medicamentos remetidos ao Rio Grande do Sul, o Ministério da Saúde afirmou ao Correio que enviou mais de 300 mil doses de vacinas contra tétano, difteria, hepatites A e B, coqueluche, meningite, rotavírus, sarampo, caxumba, rubéola, raiva, picadas de animais, entre outras. Esses imunizantes se somam aos 926 mil que estavam previstos para serem entregues ao estado.

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postado em 17/05/2024 03:55
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