Tragédia no Sul

Relatos feitos em meio à tragédia e meio milhão desalojados no RS

Correio acompanha o drama dos gaúchos que perderam tudo, que enfrentam falta de água e luz e resistem em deixar suas casas para trás com receio de saques do que sobrou de uma vida inteira; depoimentos do cotidiano dos sobreviventes

Não há previsão da volta de alguma normalidade no estado, que segue dependendo de todo tipo auxílio, que vai da ajuda do governo federal às doações dos cidadãos do país -  (crédito: Fotos: Henrique Lessa/CB)
Não há previsão da volta de alguma normalidade no estado, que segue dependendo de todo tipo auxílio, que vai da ajuda do governo federal às doações dos cidadãos do país - (crédito: Fotos: Henrique Lessa/CB)

Canoas (RS) — A tragédia com as chuvas no Rio Grande do Sul já deixou mais de meio milhão de pessoas desalojadas. São 537.380. O número de mortos chegou a 136 pessoas. Apesar do perigo, desses números e das fortes chuvas dos últimos dois dias, nem todos os isolados pelas águas aceitam abandonar suas casas. Cercados, sem energia elétrica, centenas de moradores da Região Metropolitana de Porto Alegre resolveram esperar até o último minuto dentro de casa com o receio de assaltos e saques.

O Correio visitou de barco o bairro Mathias Velho, um dos mais afetados em Canoas, e conversou com alguns moradores que permaneceram nas janelas e varandas de suas casas, sempre com dois, ou mais, andares. Conforme o barco com a reportagem passava pelas casas, alguns moradores pediam água para beber ou cumprimentavam alguém em alguma das inúmeras embarcações que cuidadosamente circulam entre os restos da cidade.

Depois da destruição e saques realizados no comércio local, muitos objetos curiosos boiam sobre as águas. Navegar nessa área é deparar-se com pedaços de manequins de boutiques flutuando entre caixas de remédio e roupas. Objetos que vão esbarrando nas embarcações. 

Nesse cenário de destruição, a circulação é cuidadosa. Cercas e muros que antes serviam de proteção, agora são armadilhas submersas para as embarcações que tentam se aproximar das casas para atender aos moradores. Todos apontaram que, apesar dos riscos, resistem em abandonar suas casas, para evitar saques contra os imóveis e indicam uma baixa confiança na capacidade de resposta das autoridades na proteção da região.

Luiz Carlos, de 60 anos, trabalha com a confecção de toldos para lojas e garante que não deixará a casa onde vive.  "Eu não tenho o que fazer na rua, eu serei apenas mais um. Risco aqui não tem. Os bombeiros passam a toda hora, mas eu não posso sair. Durante a noite estão roubando tudo", disse.

Vendedor de frutas do Ceasa, Luiz Carlos se junta ao filho de 15 anos, à mulher e mais duas famílias de vizinhos. Eles compartilham os dias ilhados em prédio de dois andares e garantem acreditar ser mais seguro continuarem em casa, já que não acreditam no risco de uma nova subida das águas, apesar da chuva persistente. "Ficar aqui em casa é mais seguro, aqui na frente teve vários casos de roubos, de saques. Aqui no prédio nós selamos as portas todas, ninguém entra aqui, e enquanto eu puder ficar aqui, nós não vamos sair", garantiu.

José Leal, socorrista integrante da Defesa Civil de Macapá (AP), depois de uma semana resgatando, diz-se impressionado por ter visto uma destruição digna de um cenário de guerra. Segundo ele, muitas pessoas tidas como desaparecidas podem ter sido encurraladas dentro de suas casas com a velocidade com que as águas subiram. "Estamos resgatando, mas nem todos. A prioridade são os vivos", comentou o voluntário sobre o resgate de corpos.

Integrante da Força Nacional e investigador da Polícia Civil do Amazonas, Luke Carvalho, apesar de ser de um estado habituado com cheias de rios, diz que se surpreendeu com a destruição com a qual se deparou. "Por ser da Amazônia, nós estamos acostumados com enchentes nas regiões ribeirinhas, mas não nessa proporção, isso aqui é gigantesco", disse o policial.

 

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postado em 12/05/2024 00:01 / atualizado em 12/05/2024 05:06
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