O temporal acompanhado de fortes ventos sobre a região metropolitana de Porto Alegre, na tarde de ontem, foi o prenúncio de mais dificuldades para um povo traumatizado pela enchente histórica que assola o Rio Grande do Sul. Os trabalhos de resgate tiveram que ser suspensos no Lago Guaíba, que banha a capital. A Defesa Civil do estado emitiu alerta para a possibilidade de mais chuva e ventos que podem passar de 90km/h.
Segundo a MetSul Meteorologia, a entrada de uma frente fria no estado, ontem, deve acabar com a breve trégua que o mau tempo deu nos últimos dois dias e que permitiu o avanço do trabalho de resgate de moradores que ainda estão ilhados nas áreas alagadas. A previsão para hoje é de queda de temperatura em todo o Rio Grande do Sul, o que aumenta a preocupação das autoridades em relação aos cuidados com os desabrigados. Muitos só saíram de casa com a roupa do corpo.
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De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a temperatura deve variar entre 4°C a 8°C nas áreas mais frias do sudoeste, do Planalto e da Serra. Na capital, a mínima fica ao redor dos 12°C. O mau tempo e o frio devem prevalecer até o início da próxima semana.
Segundo a Defesa Civil, em boletim divulgado no fim da tarde de ontem, 100 pessoas morreram desde que os temporais começaram a atingir o Rio Grande do Sul, na semana passada. Ainda há 130 desaparecidos, 425 feridos e 163,7 mil desalojados nos 425 municípios afetados pela tragédia ambiental. Quase 70 mil pessoas estão alojadas em abrigos públicos e de voluntários.
As duas maiores distribuidoras de energia elétrica do estado, CEEE Equatorial e RGE, informaram que subiu para 458 mil o número de unidades consumidoras, um aumento de 50 mil pontos ante a situação de terça-feira.
Pelotas e Rio Grande
A mudança no tempo também vai afetar as duas maiores cidades às margens da Lagoa dos Patos. Pelotas e Rio Grande começaram a enfrentar, ontem, a alagamentos provocados pelo aumento do nível da lagoa. Em Pelotas, voluntários e servidores públicos passam o dia empilhando sacos de areia na orla para barrar a entrada da água, mas a inundação foi inevitável. Nas duas cidades, vários bairros já estão inundados.
A Universidade Federal do Rio Grande (Furg) estima, no cenário mais severo, que o nível da lagoa suba até 1,65m acima do normal, o que significaria bater a marca da enchente histórica de 1941, quando o nível se elevou em 40cm. A situação deve atingir seu ponto crítico a partir de hoje e se prolongar até o início da semana que vem.
Para os especialistas, além do grande volume de água que chega do Lago Guaíba, na região metropolitana de Porto Alegre, outro fator ajuda a agravar a situação: o conhecido (para os gaúchos) minuano, o vento que vem do sul do continente, que derruba temperaturas e age como uma barreira natural da ligação da Lagoa dos Patos com o Oceano Atlântico pelo canal de Rio Grande, onde está um dos portos mais importantes do país. Aí estão os fatores da chamada "tempestade perfeita", que assusta os especialistas.
O prefeito de Rio Grande, Fábio Branco, determinou a retirada de todos os moradores das ilhas do município, mas enfrenta a resistência das pessoas, que insistem em não abandonar suas casas. "Estamos há dias conversando com a população de lá, mas muita gente não quer sair com medo de saques. Preferem ficar e proteger o patrimônio", disse ele, em entrevista. "Pelos prognósticos que recebemos, essa deve ser a maior enchente da cidade desde 1941", previu ele.
Para a MetSul Meteorologia, a quantidade de água que percorre os 300km entre o Guaíba e o sul da Lagoa dos Patos é "extraordinária". Em Pelotas, a quarta cidade mais populosa do estado, a enchente atingirá áreas que jamais foram alagadas. Em Rio Grande, a inundação atinge a região central, mas as operações do porto seguem sem interrupção. Ainda há previsão de bloqueios totais e parciais das estradas que ligam o sul do estado à capital e ao interior. A inundação também pode unir, de forma inédita, as lagoas dos Patos e Mirim em uma única massa de água.
Enquanto as enchentes castigam a capital e o sul do estado, nos municípios que ficam às margens dos rios Taquari, Jacuí, Caí e de seus afluentes começaram a ver a dimensão da tragédia, com a redução do nível das águas. O cenário é de destruição na maioria das cidades, com bairros inteiros devastados pela força da enchente. Em Cruzeiro do Sul, no Vale do Taquari, a situação é dramática. O município registrou oito mortes até agora. No bairro Passo de Estrela, com 3 mil moradores, cerca de 500 casas foram completamente destruídas. A trégua da chuva deve ser interrompida nos próximos dias, com a chegada da nova frente fria.
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