O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, ontem, lideranças indígenas, em reunião no Palácio do Planalto, mas não deu a elas a resposta que queriam ouvir: o avanço nas demarcações de terras. Isso porque há questões políticas e jurídicas que envolvem algumas das áreas reivindicadas pelos povos nativos. Porém, ele comprometeu-se a montar uma força-tarefa para apresentar, em duas semanas, uma alternativa que viabilize a retirada dos invasores desses locais.
Quatro terras indígenas estão nessa situação — duas em Santa Catarina, uma na Paraíba e outra em Alagoas. No caso das terras na Região Sul, que envolvem as etnias kaigangue e guarani, o problema terá que ser resolvido no Supremo Tribunal Federal (STF), em processo que está nas mãos do ministro Gilmar Mendes. No Nordeste, a questão é "política", como reconheceu o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Márcio Macêdo. Nos dois estados, as terras indígenas estão ocupadas por mais de mil pessoas — a maioria pequenos agricultores.
"Vamos dialogar com os governadores da Paraíba e de Alagoas para que a gente possa verificar o que pode ser feito para retirar as pessoas de lá", disse Macêdo, ao fim da reunião.
Complexidade
Segundo o ministro, a remoção de não indígenas das áreas reivindicadas é um processo complexo. É preciso identificar as famílias que atendam aos critérios de reforma agrária, a fim de que possam ser reassentadas e definir com os governadores e com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para onde irão.
Outra preocupação, segundo o ministro, é fazer tudo pacificamente. "Não se pode criar um conflito entre irmãos indígenas e irmãos da agricultura familiar, ou entre polícia e agricultores ou indígenas. Isso tem que ser resolvido politicamente", frisou.
A força-tarefa será coordenada pelo Ministério dos Povos Indígenas e terá representantes das pastas da Justiça e do Desenvolvimento Agrário, além da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Secretaria-Geral da Presidência.
Até agora, o governo homologou 10 terras indígenas. Além das quatro que serão tratadas pela equipe governamental nas próximas duas semanas, ainda há mais 25 cujos processos estão concluídos técnica e juridicamente, aguardando apenas a avaliação do Ministério da Justiça antes de seguir para a assinatura de Lula.
Dinamam Tuxá, um dos coordenadores da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) — que organiza o Acampamento Terra Livre —, disse que as lideranças reafirmaram, na conversa com Lula, a necessidade de acelerar as demarcações. "Ao nosso ver, não há nenhum impedimento legal. O que há é um impedimento político, que esperamos seja sanado com essa força-tarefa. Essa é uma cobrança do movimento indígena para que se consiga destravar as demarcações", explicou Dinaman.
Na reunião, Lula também reafirmou a convicção de que o Marco Legal para demarcação de terras, aprovado pelo Congresso, é inconstitucional, e acredita que isso será ratificado pelo STF. Também se comprometeu a ampliar as ações para garantir a segurança das comunidades, ameaçadas pelo crime organizado, pelo garimpo ilegal, por madeireiros, traficantes e grileiros.
Do lado de fora do Planalto, milhares de indígenas, representantes de organizações não governamentais e pessoas que apoiam a causa dos povos originários, que mais cedo tinham descido a Esplanada dos Ministérios em passeata, aguardavam o fim da reunião das lideranças com Lula. Mais de 180 etnias estavam representadas na marcha, que saiu do acampamento montado no estacionamento da Fundação Nacional de Artes (Funarte), por volta das 15h.
Na Praça dos Três Poderes, o jovem Atxuha Pataxó, da Bahia — estreante no Terra Livre — sabia bem o que se discutia no Palácio. "É a demarcação de terra, o assassinato que acontece em nossas comunidades, a falta de recursos", salientou.
Fernando Azevedo, dos terenas de Mato Grosso do Sul, reforçou a necessidade das demarcações: "Estamos reivindicando o básico que precisamos, que é o território. É nossa vida, nossa alma. Queremos o direito de ter a nossa terra homologada, sem interferência de questões políticas e ruralistas", cobrou.
Colaboraram Fernanda Cavalcante e Hítalo Silva, estagiários sob a supervisão de Fabio Grecchi
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