Após enfrentar dificuldades para encontrar informações e tratamento para o filho, Natália Jereissati, 46 anos, e o marido, Igor Cunha, 52, iniciaram uma caminhada para tornar o diagnóstico e o tratamento mais acessíveis. João, 6, nasceu com síndrome de Apert — condição genética rara que leva à fusão dos ossos do crânio, das mãos e dos pés. A doença faz parte de um grupo de anormalidades congênitas, chamado de craniossinostose sindrômica, que causa alterações no formato do crânio.
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A experiência pessoal do casal de empresários os levou a idealizar o primeiro simpósio internacional sobre o assunto no Brasil. O evento ocorrerá em 14 e 15 de março, no Hospital de Reabilitação e Anomalias Craniofaciais (HRAC) da Universidade de São Paulo (USP), em Bauru.
Natália Jereissati relatou que o diagnóstico do filho ocorreu após a gravidez e a opção de tratamento era uma cirurgia de grande porte, o que exigiria dias de internação e transfusões de sangue.
Por meio de pesquisas e a ajuda de amigos e familiares, ela encontrou um tratamento menos invasivo, fora do país, realizado aos três meses de vida do bebê, no Boston Children's Hospital, da Universidade Harvard, nos Estados Unidois, para onde se mudou com os outros dois filhos. Até agora, foram 10 cirurgias. Futuramente, ele precisará de novas intervenções.
"Atualmente, ele está ótimo, ainda vai passar por mais algumas cirurgias. A gente é muito grato por tudo que conseguimos com ele. Daí, veio a ideia de fazer esse simpósio. As informações sobre a condição são escassas e a intenção é fazer esse intercâmbio entre esses centros de excelência para que futuramente os médicos consigam fazer uma pesquisa mais colaborativa."
Debate
O evento pretende chamar a atenção da classe médica para importância de o Sistema Único de Saúde (SUS) estar preparado para conduzir eventuais casos na rede pública. Há ainda a subnotificação das síndromes, com impacto direto na assistência. Ao fim da conferência, um novo protocolo de atendimento e tratamento deve ser formalizado junto ao Ministério da Saúde. A craniossinostose atinge 1 em cada 2.500 nascidos.
"Meu filho está no limbo dos casos subnotificados. São discussões que a gente quer entender onde existem falhas para que consigamos trabalhar nas melhorias. A ideia é que a gente saia do simpósio com algum tipo de documento de diagnóstico e a gente consiga trabalhar isso junto ao Ministério de Saúde, aos comitês de doenças raras, que esse diálogo possa trazer mudanças políticas, legais e de governança no Brasil", explicou Natália Jereissati, que é filha do ex-senador e ex-governador do Ceará Tasso Jereissati (PSDB).
"João está na escolinha. Sabe ler, faz matemática superbem, é um excelente aluno. Ele foi desabrochando e tem autonomia como qualquer outra criança de 6 anos. No ano passado, nossa preocupação era se ele ia conseguir pegar no lápis. E ele está escrevendo, desenhando do jeitinho dele. Queremos mostrar a outras famílias que é possível proporcionar qualidade de vida a pacientes com outras síndromes similares", afirmou a empresária.
Igor Cunha lembrou que os primeiros anos foram de incertezas. "Houve falta de informação e tantas dúvidas. Estávamos em um lugar superescuro e tinha algumas luzes no fim do túnel e tudo se transformou num quadro de um milagre. É o tamanho da felicidade que hoje o João transformou a nossa vida. Essa sensação de felicidade, essa mudança foi tão boa pra gente. Queremos passar isso para outras famílias e que elas não passem pela mesma dificuldade", disse.
Parceria
O simpósio conta com a participação de especialistas do Boston Children´s Hospital e do Necker Enfants Malades, de Paris. Uma das painelistas, Michele Brandão, neurocirurgiã do HRAC USP Bauru, explica que a craniossinostose consiste no fechamento precoce das estruturas do crânio. A especialista destaca que quanto mais cedo é feito o diagnóstico e a cirurgia, maiores são as chances de sucesso.
"O crânio é como se fosse uma roupa costurada com elástico. Conforme o cérebro cresce, a roupa vai esticando. Quando um desses elásticos está fechado, o crânio não cresce no mesmo ritmo que o cérebro precisa, provocando a chamada hipertensão intracraniana. É muito importante que a criança seja tratada adequadamente."
Ela explica que a técnica cirúrgica depende do tipo da condição e da idade da criança. "Vai depender se é síndrome, se é isolada e da idade da criança. Além disso é muito importante no comecinho cuidados com a alimentação, com a respiração. É preciso toda uma equipe de fono, odontologia, neurologista, conforme ela cresce."
Também está confirmada a presença de Natan Monsores, especialista no tema, e dos principais representantes de hospitais que tratam craniossinostose no Brasil, além de pais e familiares que lidam com a doença. As inscrições estão abertas para diversos públicos, desde estudantes a profissionais especializados.
O evento tem o apoio da InciSioN, organização não governamental de defesa a cirurgias acessíveis a todos, do Instituto Coalizão Saúde (ICOS), da Sociedade Brasileira de Auditoria Médica (SBAM) e da Associação Brasileira dos Enfermeiros Auditores (ABEA).
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