O comando da Força Aérea Brasileira (FAB) assegurou, ontem, que a distribuição de alimentos e a fiscalização contra os voos clandestinos dos garimpeiros irregulares que ainda atuam na reserva ianomâmi, em Roraima, em momento algum foi interrompido. Ao Correio, a instituição rebateu acusações de que integrantes da força não estariam combatendo os exploradores ilegais e que, também, deixariam falhas na assistência às comunidades nativas.
Segundo a FAB, a prova de que não há interrupção ou redução no auxílio aos ianomâmis é que, nos próximos dois meses, serão entregues 15 mil cestas básicas às comunidades. Em nota, a força afirmou que "o monitoramento na região foi intensificado em 2023 por meio da ativação da Zona de Identificação de Defesa Aérea (Zida) sobre o espaço aéreo sobrejacente e adjacente à TIY (Terra Indígena Yanomami), a fim de incrementar as ações de repressão ao garimpo ilegal". Observa, ainda, que a Zida "permanece ativada e os sobrevoos previstos estão autorizados, desde que seja preenchido o plano de voo regulamentar e seguidas as regras de tráfego aéreo".
A FAB salienta que o "Comando de Operações Aeroespaciais (ComAe) utiliza a rede de radares existente para o controle do espaço aéreo e, em complemento, tem mantido operações de Inteligência, Vigilância e Reconhecimento (IVR), principalmente com aviões-radar E-99, que aumentam significativamente a capacidade de cobertura do monitoramento realizado diuturnamente pela FAB".
Como prova de que a segurança aérea e o atendimento aos ianomâmis não foi interrompido, a FAB afirmou que, na segunda-feira, inutilizou uma aeronave usada por garimpeiros clandestinos. "A ação faz parte do apoio da FAB à PF (Polícia Federal) no contexto da Operação Libertação, que recolhe ou inutiliza materiais utilizados na logística ou segurança dos garimpeiros", informou.
Porém, fontes ouvidas pelo Correio, no começo da semana, asseguraram que os militares estariam deixando lacunas na assistência à região. Da mesma forma, a colunista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, publicou que há na reserva indígena uma espécie de "aquartelamento" — no qual não se realizam o combate aos garimpeiros e a proteção dos ianomâmis. Ainda de acordo com a jornalista, os militares pediram R$ 993 mil, por dia, para manter o apoio às ações de desintrusão ao garimpo ilegal, um mês depois de receberem crédito suplementar de R$ 275 milhões.
Lideranças dos ianomâmis acusam que continua a invasão das terras, a contaminação dos rios e a disseminação de doenças pelos garimpeiros ilegais. Dados registrados no Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena destacam que 308 mortes foram registradas no território indígena em 2023, contra 343 em 2022. O número representa uma queda de 10%.
Barroso pediu investigação
Em janeiro do ano passado, o ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apurasse informações repassadas pela Polícia Federal (PF) de que a Força Aérea Brasileira tinha deixado de interceptar voos ilegais na região de Roraima, o que quase teria causado a colisão de aeronave irregular com um avião comercial. Na ação, estava um relatório da investigação apontando que 29 aparelhos apreendidos pelos agentes federais, que estavam em poder da FAB, tinham desaparecido — sendo que alguns teriam sido vistos operando posteriormente, em vez de serem destruídos.
Procurada pelo Correio, a Presidência da República informou que os militares têm cumprido determinações e normas. Questionada sobre um voo que teria sido negado às ministras Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima), Sônia Guajajara (Povos Indígenas) e outros integrantes do governo que viajariam até a região de Auaris, no extremo noroeste de Roraima — ainda dentro da terra dos ianomâmis —, a Presidência justificou que a FAB não dispunha de um aparelho com autonomia de voo para ir até lá. Por isso, o grupo seguiu em três aeronaves fretadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
"As Forças Armadas, desde janeiro de 2023, fazem parte do esforço conjunto dos diversos órgãos do governo federal, seja no suporte logístico das operações das forças de segurança, seja na entrega de cestas básicas em caráter emergencial que foi retomada nesta semana, atuando em conformidade com os decretos e portaria que orientam a ação na região", destacou a Presidência.
No último dia 9, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu os ministros e organismos do governo que atuam na defesa dos ianomâmis para avaliar os resultados das ações de proteção e assistência aos indígenas implementadas no ano passado. Ele salientou que é preciso, "de uma vez por todas, definir o que o governo vai fazer para evitar que os indígenas continuem sendo vítimas de massacres, vandalismo, garimpagem e de pessoas que querem invadir as áreas preservadas que têm dono, que são os indígenas, e que não podem ser utilizadas (exploradas)".
Lula salientou que a situação dos ianomâmis — vítimas de uma grave crise humanitária, decorrente da exploração ilegal de ouro e recursos naturais nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro — é "uma questão de Estado" e que é preciso usar "todo o poder da máquina pública para deter" [essas atividades ilegais]. (Com Vinicius Doria)Saiba Mais