O afundamento gradativo do solo no bairro de Mutange, em Maceió, intensificou o confronto entre os dois principais grupos políticos do estado — o do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o do senador Renan Calheiros (MDB-AL). E os reflexos disso chegaram ao Congresso.
Ontem, o presidente do Senado em exercício, Rodrigo Cunha (Podemos-AL), recebeu o prefeito da capital alagoana, João Henrique Caldas (o JHC), para discutir a crise da extração de salgema pela Braskem — responsável pelo afundamento de parte da cidade. Depois do encontro, o parlamentar criticou a criação da CPI para investigar a empresa gestora da mina 18, que causou o desastre ambiental em Maceió.
Segundo o senador, que é aliado de Lira em Alagoas, assim como JHC, a CPI "surgiu de maneira viciada". Para ele, o colegiado, da forma que foi proposto, não daria "clareza" aos atos de omissão que levaram ao risco de colapso do bairro na capital alagoana.
Renan é o propositor da CPI. De acordo com Cunha, o emedebista tem ligações com a Braskem. "Começam a gerar dúvidas de quem será o investigado e de quem será o investigador. A propositura, da forma em que foi colocada, surgiu de maneira viciada", criticou.
Aliado do governador de Alagoas, Paulo Dantas, Renan é acusado por Cunha de estar por trás de uma licença ambiental que vem "sendo renovada constantemente pelo estado de Alagoas". "O governador, à época, era o Renan Filho, que é senador, hoje ministro do Transporte, e filho do Renan Calheiros, que é propositor desta ação", disse o presidente em exercício do Senado.
Segundo Cunha, Renan também foi presidente da extinta Salgema, adquirida pela Braskem, e que, desde 1970, explora o mineral na área urbana de Maceió. "Um outro fator relevantíssimo é que o próprio senador Renan Calheiros foi apontado pela Polícia Federal como tendo solicitado, e recebido, R$ 1 milhão para beneficiar a empresa Braskem. Então, a figura entre investigado e investigador se confunde nesse meio da propositura da CPI e dos reais objetivos", atacou Cunha.
Pelas redes sociais, Renan garantiu que a comissão de inquérito tem caráter "técnico e objetivo, para averiguar, com base nos documentos, a responsabilidade jurídica nas reparações". Ele afirmou, ainda, que caso o Senado não dê andamento à instalação da CPI, recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Ao mesmo tempo, o prefeito de Maceió — pré-candidato à reeleição em 2024 — conta com a ajuda Lira na cobrança de ajuda do governo federal para contornar o desastre ambiental. Em vídeo publicado nas redes, o deputado pediu ao presidente da República em exercício, Geraldo Alckmin, a edição de uma medida provisória para enfrentar os problemas causados pelo afundamento do solo.
Aliados de Lira são contra a CPI da Braskem — que tem todas as assinaturas para ser instalada — e alegam que Renan teria a intenção de fazer dela um palanque eleitoral. O requerimento foi lido em plenário pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O próximo passo é a indicação de representantes dos partidos para compor o colegiado.
Velocidade menor
Apesar de o afundamento do solo da mina 18 vir reduzindo a velocidade desde domingo, o coordenador do centro de monitoramento da Defesa Civil de Maceió, Hugo Carvalho, afirmou que o órgão permanece em alerta máximo, pois o risco de colapso da área se mantém alto. Ontem, o monitoramento apontava que o deslocamento vertical apresentava ritmo de 0,3cm/h a 0,4cm/h, o mesmo registrado no dia anterior.
Esses dados representam desaceleração, se comparados aos verificados sábado (0,7cm/h) e sexta-feira (2,6 cm/h). Para a Defesa Civil, a redução da velocidade do afundamento pode ser uma acomodação do solo, o que não afasta a iminência de desabamento. O afundamento da área a velocidade chegou a 5cm/h nos momentos mais críticos. (Colaboraram Marina Dantes e Vitória Torres, estagiárias sob a supervisão de Fabio Grecchi)