Cigarros Eletrônicos

Anvisa aprova consulta pública sobre proibição de cigarros eletrônicos

Após decisão unânime da diretoria colegiada, haverá um prazo de 60 dias para a manifestação da sociedade

A Diretoria Colegiada da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou por unanimidade, nesta sexta-feira (1º/12), a abertura de uma consulta pública sobre a revisão da proibição da comercialização de cigarros eletrônicos no Brasil. A aprovação dá o prazo de 60 dias para a manifestação de membros da sociedade.

Com duração de mais de sete horas, a 19ª Reunião Ordinária Pública da Diretoria Colegiada da Anvisa ouviu pareceres de órgãos públicos a respeito da regulamentação dos DEFs (dispositivos eletrônicos para fumar) e os possíveis impactos dela no contrabando desses dispositivos e na saúde da população brasileira. O Ministério da Saúde, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública foram alguns dos órgãos que tiveram suas manifestações lidas.

Membros de entidades civis, do setor regulado e da população também tiveram suas manifestações veiculadas por vídeo durante a reunião. Mais de 60 pessoas, com opiniões favoráveis e contrárias, foram ouvidas pela diretoria colegiada antes que proferissem seus votos.

No Brasil, os DEFs têm sua fabricação e comércio proibidos pela Anvisa desde 2009, segundo a resolução RDC nº 46. Desde então, várias tentativas de revisão da decisão já foram realizadas.

No Legislativo

Em 17 de outubro, a senadora Soraya Thronicke apresentou o projeto de lei nº 5.008/2023, que propõe a regulamentação do comércio de cigarros eletrônicos no país. A proposta visa autorizar a produção, importação e comercialização dos dispositivos em todo o território nacional.

O texto sugere a criação de regras específicas para a produção, como a proibição da venda para usuários menores de 18 anos, veto à produção de dispositivos de sistema aberto e o impedimento à comercialização de produtos com aromas adocicados e embalagens que remetam ao universo infanto-juvenil.

Entre outros fatores, o texto traz como justificativa o crescimento exponencial de usuários dos dispositivos no país, que acontece a despeito da proibição da Anvisa, além de trazer dados de estudos internacionais que colocam os cigarros eletrônicos como método mais efetivo do que outros produtos com base em nicotina na cessação do uso de produtos tabágicos tradicionais.

Um levantamento realizado pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria (IPEC) mostra que o número de utilizadores dos chamados “vapes” e “pods” quadruplicou entre 2018 e 2022. Da mesma forma, o Inquérito Telefônico de Fatores de Risco para Doenças Crônicas não Transmissíveis em Tempos de Pandemia (Covitel) de 2023, realizado pela Vital Strategies e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), mostra que 23,9% — quase um quarto do total — dos jovens brasileiros entre 18 e 24 anos já experimentaram cigarros eletrônicos.

Controvérsia

Os prejuízos desses produtos à saúde são motor de grande discussão dentro da comunidade científica brasileira, que se divide entre acatar ou descartar conclusões de estudos internacionais que comparam os danos causados por esses dispositivos à saúde aos do cigarro convencional.

O Senado realizou, em setembro, uma audiência pública para discutir a regulamentação e os impactos à saúde dos chamados "vapes" ou "pods", sobre os quais os debatedores não convergiram. Thronicke, que presidiu a audiência, afirmou que “muito mais perigoso do que regulamentar, é não regulamentar, por não sabermos quais as substâncias nossa população está consumindo”, e defendeu a urgência de uma proposta de regulamentação “de acordo com a realidade do país”.

Em conversa com o Correio, a doutora em Saúde Pública e chefe da divisão de controle do tabagismo do Instituto Nacional de Câncer (INCA) — órgão do Ministério da Saúde que coordena o Programa Nacional de Controle do Tabagismo —, Maria José Giongo, alegou que os cigarros eletrônicos oferecem “risco extremo à saúde”. Segundo ela, os dispositivos podem causar, assim como os cigarros comuns, uma série de doenças cardiovasculares e respiratórias, além de apresentarem teores de nicotina mais elevados que os presentes em cigarros convencionais.

“Já temos evidências, com relação ao cigarro eletrônico, de que causam mal à saúde. Esses produtos têm uma quantidade de nicotina absurda e a nicotina é a substância que causa dependência. Estudos já comprovaram que, muitas vezes, um único cigarro eletrônico tem uma quantidade de nicotina que se iguala a três maços de cigarro”, afirmou.

O pneumologista Rodolfo Behrsin trouxe um contraponto. Segundo ele, há um número expressivo de pesquisas sobre os cigarros eletrônicos ao redor do mundo, cuja maioria mostra que a diferença entre a vaporização de um líquido e a combustão do cigarro convencional se traduz na redução de 95% de substâncias tóxicas emitidas.

“A gente tem que pensar em termos comparativos e cigarro eletrônico é uma das coisas que têm maior número de pesquisas, atualmente. A gente percebe que um produto padrão FDA, padrão agência europeia, padrão controlado pelo governo da Inglaterra, tem a seguinte diferença: justamente por não ter combustão ele reduz mais ou em torno de 95% a toxicidade, primeiro por não ter a queima das folhas de tabaco, não vai ter monóxido de carbono no aerossol emitido pelo dispositivo. Quando a gente compara ele com a fumaça do cigarro, há a redução de substâncias tóxicas em produção em torno de 95%”, explicou.

Behrsin ressaltou que os cigarros eletrônicos não são saudáveis, mas são menos danosos se comparados aos cigarros tradicionais, assim sugerindo que esses dispositivos sejam utilizados numa política de redução de danos do tabagismo. “Nós não estamos falando que o cigarro eletrônico é saudável. A coisa mais saudável que existe é respirar ar”, afirmou.

*Estagiário sob supervisão de Talita de Souza

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