No momento em que, pela primeira vez, uma conferência do clima das Nações Unidas aprova um acordo para reduzir o uso de combustíveis fósseis e acelerar a transição energética, o Brasil amplia a área de produção de petróleo no país. Depois do leilão promovido pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), ontem, no Rio de Janeiro, a exploração vai se estender por toda a costa brasileira, com a perspectiva de abertura de poços no Sul do país. Das 602 áreas ofertadas, foram arrematadas 192, com arrecadação de R$ 421,7 milhões aos cofres do Tesouro.
A novidade foi o alto interesse dos investidores pela Bacia de Pelotas, que abrange o litoral do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Em consórcio com outras petroleiras, a Petrobras arrematou a maioria dos blocos ofertados. Ficou com 29, enquanto a norte-americana Chevron arrematou 15.
O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, comentou, após o leilão, que a estatal inaugura "uma área nova, com menos perspectivas de problemas ambientais e de demoras (nos processos de licenciamento)". "É uma área parecida com as bacias de Campos e de Santos", comparou.
Para a Petrobras, a exploração de óleo e gás no Sul do país, além de abrir uma nova fronteira de produção, também vai ajudar a estatal a implantar sistemas de geração eólica de energia nas plataformas offshore (no mar), mitigando os efeitos da carbonização provocada pelos combustíveis fósseis.
Contradição
Na abertura do certame, o diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, rebateu as críticas de que o país estaria sendo contraditório ao estimular o aumento da produção de combustíveis fósseis em um momento em que o mundo discute como reduzir emissões de gases de efeito estufa para frear o aquecimento global. Aos investidores, disse que "a contratação de novas áreas para exploração significa um passo muito importante para evitar a queda da nossa produção a partir do início da próxima década".
A contradição, para Saboia, "é apenas aparente", pois uma "eventual paralisação da atividade petrolífera no Brasil não contribuiria para a redução da dependência do petróleo, nem para a mitigação das mudanças climáticas".
"Apenas nos tornaria mais pobres, mais dependentes de outros países, que continuarão produzindo com pegadas de carbono mais intensas do que a nossa. (E nos tornaria) menos capazes de investirmos em tecnologias verdes", salientou.
A ANP também ofertou quatro blocos terrestres na região de Manaus, arrematados pela Atem. Em um deles, em consórcio com a Eneva, pagou R$ 7,8 milhões pela licença, um ágio de 360% sobre os preços mínimos. As áreas de exploração estão situadas na Floresta Amazônica, nos municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará, a pouco mais de 200km de Manaus.
A organização ambientalista não governamental Arayara chegou a apresentar à ANP um estudo em que alerta para os riscos da exploração em relação aos povos originários. Segundo a ONG, há ameaça direta a 23 terras indígenas, que estão sob a zona de influência de 15 dos blocos ofertados ontem, com impactos para cerca de 22 mil representantes dos nativos. O Ministério Público Federal (MPF) também está questionando a agência reguladora a explicar melhor os impactos da exploração na região.
A ANP também ofereceu aos investidores, ontem, áreas de exploração na Bacia Potiguar, que faz parte da chamada Margem Equatorial, considerada a mais promissora do país, mas que enfrenta fortes reações por parte de ambientalistas por se estender até a foz do Rio Amazonas.
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