O tema da violência doméstica voltou a ser debatido ontem, nas redes sociais, após mais uma celebridade, a apresentadora Ana Hickmann, ocupar os "trends topics" por agressões cometidas pelo próprio marido, o empresário Alexandre Correa. O Boletim de Ocorrência (BO) foi registrado na véspera, mas ganhou repercussão depois que a informação chegou à imprensa no domingo.
De acordo com o BO, a apresentadora conversava com o filho na cozinha quando o marido ouviu e não gostou do conteúdo. Depois que o garoto saiu, Alexandre teria empurrado Ana contra a parede e ameaçado agredi-la com uma "cabeçada". Quando a apresentadora tentou pegar o celular em cima da mesa para pedir ajuda, o empresário fechou a porta da cozinha, atingindo o braço de Ana.
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Em postagem no Instagram, Correa negou que tenha cometido violência doméstica, afirmando que "tudo será esclarecido no momento oportuno". O empresário também disse que não deu uma "cabeçada" na mulher.
A assessoria de imprensa de Ana Hickmann, por sua vez, divulgou uma nota afirmando que "após um desentendimento" com o marido, no último sábado (11), "a Polícia Militar foi acionada e a apresentadora foi conduzida até o Distrito Policial para esclarecimento dos fatos". Segundo o comunicado, a apresentadora estava em casa, "bem e felizmente não sofreu maiores consequências em sua integridade física."
Medidas protetivas recusadas
Conforme o BO, "a vítima tomou ciência das medidas protetivas conferidas pela Lei Maria da Penha, porém, neste momento, optou por não requerê-las". Segundo especialistas, essa é uma situação comum entre mulheres que são agredidas por seus maridos, independentemente da classe social. Para Francisco Tojal, Juiz da Vara Especializada de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher do Cabo Santo Agostinho (TJPE), o medo e as ameaças constantes é uma das explicações para as mulheres agredidas dispensarem os recursos oferecidos pela Maria da Penha. "Outro motivo é o fato de não quererem se separar, porque vivemos em uma sociedade que valoriza excessivamente o vínculo conjugal." Tojal acrescentou outros motivos para esse tipo de atitude como a esperança de que o companheiro possa mudar e a ausência de uma rede de apoio.
"A violência doméstica é um fenômeno multifacetado. Daí a dificuldade no seu combate e a dificuldade de as vítimas, muitas das vezes, denunciarem seus agressores. As vítimas sentem medo, vergonha do que parentes, amigos e sociedade vão pensar delas. Tem medo de não conseguirem viver por si só — em razão da dependência psicológica e financeira. Medo de serem julgadas e não apoiadas. E, por vezes, demoram muito para perceber que estão em um relacionamento abusivo", completa Cristina Tubino, presidente da Comissão de Combate à Violência Doméstica e Familiar da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB-DF).
Soraia Mendes, jurista, advogada e professora especialista em Direitos das Mulheres, ressaltou que a violência contra as mulheres se verifica em todas as classes sociais "porque ela decorre de uma estrutura patriarcal, que se vale da violência como um de seus instrumentos primordiais", que coloca as mulheres, "independentemente do lugar social em que estejam", sempre em uma condição de submissão à figura masculina.
"A violência doméstica e familiar contra a mulher é perversamente democrática, ou seja, atinge mulheres de todas as raças, de todas classes sociais, de todas as idades e de todas as regiões", disse Tojal. Segundo ele, isso acontece porque o machismo está presente na nossa sociedade como um vírus que precisa ser fortemente combatido, mas há diferentes contextos que aumentam a condição de vulnerabilidade dessas mulheres. Citando dados do Fórum de Segurança Pública, de 2022, o juiz lembrou que 28,9% das brasileiras sofreram algum tipo de violência, o que equivale a cerca de 18,9 milhões de pessoas. Dentre elas, 65,6% são negras e 29%, brancas. "Estudos também apontam que as mulheres de uma classe social mais privilegiada tendem a romper o ciclo da violência antes do que aquelas que não possuem as mesmas condições financeiras."
Cristina Tubino acrescentou que as políticas públicas de prevenção, de conscientização da igualdade de gênero e de direitos de mulheres em relações de violência doméstica são essenciais e devem estar presentes no dia a dia da sociedade. “O Estado precisa estar presente para prestar atendimento a essa mulher, com atendimento médico, psicológico, acolhimento perante as autoridades policiais e do judiciário. Atuar de forma rápida e eficiente, a fim de impedir que as violências contribuam e que essa mulher possa se sentir segura e acolhida”, afirmou.
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