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"A ciência se tornou um ator político", afirma cientista política

Diretora da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), Mônica Sodré explica por que cidadãos e agentes eleitos precisam aderir à causa climática

Mônica Sodré: efeitos da crise climática tendem a aumentar o estresse nas democracias contemporâneas -  (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)
Mônica Sodré: efeitos da crise climática tendem a aumentar o estresse nas democracias contemporâneas - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A.Press)
Vitória Torres*
postado em 22/11/2023 04:00 / atualizado em 22/11/2023 06:20

Convidada do Podcast do Correio nesta terça-feira (21/11), a cientista política e diretora executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps), Mônica Sodré, reforçou a necessidade de utilizar a política como instrumento para combater a crise climática em escala global. A especialista participou de sessão temática no Congresso Nacional sobre sustentabilidade. Enfatizou, entre outros pontos, a importância de o Parlamento atuar com assertividade nas questões climáticas e externou considerações técnicas sobre sustentabilidade, seja no ambiente doméstico, seja em fóruns internacionais.

Na entrevista com os jornalistas Denise Rothenburg e Carlos Alexandre de Souza, Mônica Sodré abordou pontos específicos da agenda relativa à sustentabilidade. Comentou, por exemplo, sobre a transição para veículos elétricos. "Esquecemos que o carro elétrico é um carro muito mais intensivo e mineral, a quantidade de cobre ou de outros materiais que vão no carro é muito maior do que de um carro comum", observou. "A gente precisa tomar cuidado para não resolver o problema do petróleo e criar novos problemas", ressaltou.

A especialista destacou também a necessidade de o cidadão ter mais consciência ambiental — e cobrar essa mesma postura dos políticos. Ela lembrou que as mudanças climáticas são um desafio para a democracia, pois acentuam as desigualdades sociais. Para Sodré, o clima é um acelerador dessas disparidades. "Eu acredito que isso (a consciência ambiental) vai virar uma questão política no dia que o eleitor passar a cobrar também esse assunto. Tivemos um dos dias mais quentes dos últimos 125 mil anos. Naturalmente, esse assunto vai entrar na agenda do eleitor para cobranças aos políticos", pontuou a diretora-executiva da Raps.

Problemas concretos

Mônica afirmou que é preciso entender que a preservação do meio ambiente não é uma discussão etérea. Trata-se de resolver problemas concretos, que já estão ocorrendo. "Em breve, a aprendizagem das nossas crianças vai ser afetada, pois a sala de aula aquece, não tem ventilador em todas as salas, não tem condição de colocar ar-condicionado, você não tem energia para subir a demanda. Então, existem consequências muito evidentes, como a ausência de energia por vários dias que afetou a cidade de São Paulo ou mesmo o ciclone que atingiu o Rio Grande do Sul", exemplificou.

Ao comentar parte da atividade da Raps — formar lideranças qualificadas para temas contemporâneos —, Mônica Sodré expressou como os projetos para combater o desmatamento são urgentes. "Os políticos precisam se qualificar sobre o tema. As discussões no Parlamento podem acarretar em mais desmatamento. Os parlamentares precisam entender que mais desmatamento vai significar, por exemplo, quebra de safra e alimentos mais caros no prato do brasileiro", apontou.

Esforço político

É exatamente em razão desses problemas concretos que Mônica Sodré defende um esforço político em favor da sustentabilidade. Ela citou a cúpula da Amazônia, ocorrida em agosto em Belém, como exemplo da complexa relação entre ciência e política. "A ciência se tornou um ator político, parte do problema é que os políticos estão longe da ciência", disse a especialista.

A crise climática, observou, afeta segmentos da sociedade de maneira diferente. A desigualdade social e racial, lembrou, torna-se um componente crítico, em que os mais vulneráveis são os menos representados na tomada de decisões políticas. E isso é um desafio a ser superado.

"Sabemos que os mais atingidos são os mais pobres e vulneráveis, no caso do Brasil, existe um componente racial muito grande. Essas pessoas são justamente as que não estão no espaço de tomada de decisões, com mais dificuldade de acessar a informação e de participar do processo político. Então, eu acredito que a tendência é de agravamento e vai atingir a todos, mas não vai atingir da mesma maneira. Assim, o sentido de emergência também muda", detalhou.

Papel do cidadão

Ao comentar as possibilidades de ação política em defesa do meio ambiente, a convidada do Podcast do Correio sublinhou que o cidadão desempenha um papel crucial. Escolhas cotidianas, como abastecer com combustíveis mais sustentáveis e práticas de reciclagem, contribuem para a conscientização ecológica.

"Todo comportamento é importante. Estamos falando de petróleo e gás de mineração, como se isso fosse muito distante da população. Você tem opções sustentáveis, por exemplo, quando se tem um carro flex, abastecendo com etanol por ser muito mais limpo das emissões, separação de lixo em coletas — e que esse assunto não seja visto como uma pauta da esquerda", finalizou.

Veja o podcast completo 

*Estagiária sob a supervisão de Carlos Alexandre de Souza

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