O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), órgão do governo federal em parceria com a sociedade civil, reuniu ao menos 11 relatos de violações dos direitos humanos durante a Operação Escudo, deflagrada em 28 de julho pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP) no litoral de São Paulo após a morte de um policial, e que ainda está em andamento. As ações ocorrem em Guarujá e Santos.
Em relatório divulgado nesta sexta-feira (1º/9), o órgão traz relatos da brutalidade policial durante a operação, incluindo execuções sumárias. Segundo as testemunhas, os agentes mandavam a população permanecer dentro de casa, enquanto aproveitavam as ruas vazias para realizar as execuções. Pessoas da comunidade relataram ainda terem ouvido um policial mais experiente ordenando um novato a matar uma pessoa detida como "batismo", e celebrando logo depois.
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O documento traz ainda relatos de destruição arbitrária de residências, quebra de telefones, espancamentos e invasões de domicílios sem autorização judicial. O CNDH recomentou que o governo de São Paulo encerre imediatamente a operação, e pede que outros órgãos, como o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e o Ministério da Justiça e Segurança Pública tomem as providências cabíveis contra a violência policial.
"Segundo a pessoa ouvida pelo CNDH, a polícia tem utilizado o seguinte método: primeiro, entram com uma equipe batendo nas portas e mandando as pessoas entrarem (ou permanecerem) nas casas. Depois, com a vielas sem ninguém, trazem as vítimas, que são ali executadas", registra o relatório do Conselho.
Até o momento, foram 24 mortes causadas pela operação, deflagrada há 35 dias após a morte do soldado Patrick Bastos Reis, da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota). De acordo com moradores, um dos mortos foi um homem em situação de rua da cidade de São Paulo, que teria sido levado pelos policiais para ser executado em Santos.
Conselho pede fim da Operação
Relatos de moradores da comunidade de Morrinhos, no Guarujá, descrevem que os policiais ameaçaram de morte todos os moradores que fossem encontrados com antecedentes criminais. "De a gente pegar com passagem, vai para a vala", diriam os agentes.
Além de interromper imediatamente a Operação Escudo, o Conselho recomenda que o Governo de São Paulo também forneça tratamento psicológico e psiquiátrico gratuito às vítimas da ação, e se explique, no prazo de 20 dias, as circunstâncias das mortes de civis, dados da operação, explicações sobre a não utilização de câmeras nas fardas, entre outras medidas.
Representantes do Conselho tentaram se reunir com o Secretário de Segurança Pública do Estado, Guilherme Derrite, que desmarcou o encontro por três vezes.
Resposta da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo sobre relatos:
Procurada pelo Correio, a SSP-SP declarou, em nota, que todos os casos de mortes por ação policial estão sendo investigadas, e que o material está sendo compartilhado com o Ministério Público e com o Poder Judiciário. "Em 24 abordagens os suspeitos entraram em confronto com as forças policiais e acabaram morrendo baleados", disse a secretaria. "Desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados mediante procedimento próprio. A pasta ressalta que até o momento nenhuma denúncia de abuso durante a operação foi registrada", completou.
Veja nota da SSP-SP na íntegra:
"Todos os casos de mortes decorrentes de intervenção policial (MDIP) estão em investigação pela Deic de Santos, com o apoio do DHPP, e pela Polícia Militar. O conjunto probatório apurado no curso das investigações, incluindo as imagens das câmeras corporais, tem sido compartilhado com o Ministério Público e o Poder Judiciário. Em 24 abordagens os suspeitos entraram em confronto com as forças policiais e acabaram morrendo baleados.
Os laudos oficiais de todas as mortes, elaborados pelo Instituto Médico Legal (IML), foram executados com rigor técnico, isenção e nos termos da Lei. Em nenhum deles foi registrado sinais de tortura ou qualquer incompatibilidade com os episódios relatados. Os documentos já foram enviados às autoridades responsáveis pelas investigações.
A Secretaria da Segurança Pública informa que a Operação Escudo segue em curso para sufocar o tráfico de drogas e combater o crime organizado na Baixada Santista. Desde o início, em 28 de julho, até esta quinta-feira (31) as forças policiais prenderam 747 pessoas, das quais 291 eram foragidas da Justiça pelos mais diversos crimes, como roubo, sequestro e homicídio. Foram apreendidos 934,3 kg de entorpecentes - causando um prejuízo ao tráfico que passa dos R$ 2 milhões - e 94 armas que estavam na mão de criminosos, recolhidas.
Desvios de conduta não são tolerados e são rigorosamente apurados mediante procedimento próprio. A pasta ressalta que até o momento nenhuma denúncia de abuso durante a operação foi registrada. Denúncias podem ser formalizadas em qualquer unidade da Polícia Militar, inclusive pela Corregedoria da Instituição."