Rio de Janeiro – Apesar de ser um país com potencial para se destacar na agenda global de transição energética, o Brasil ainda precisa ter cuidado para não se perder no processo de mudanças, especialmente as tecnológicas, que acabam sendo muito mais ágeis do que os formadores de políticas públicas. Esse foi um dos alertas do ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair. Segundo ele, ainda faltam bons projetos nos países em desenvolvimento para os investidores fazerem as suas apostas.
“O Brasil também produz combustível fóssil e tem uma gama dos problemas e das soluções”, afirmou Blair, nesta segunda-feira (25/9), em palestra da 38ª Conferência Hemisférica da Federação Interamericana de Empresas de Seguros (Fides), no Rio de Janeiro, organizado pela Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).
Apesar de reconhecer que existe capital no mundo para investimentos, especialmente na transição energética, Blair lamentou a falta de boas ideias. “O dinheiro existe e o setor segurador sabe disso, mas não temos no mundo em desenvolvimento projetos onde possam ter investimentos”, afirmou.
Blair reconheceu que o país está em um importante momento, ao assumir a presidência do G20 – grupo das 19 maiores economias desenvolvidas e em desenvolvimento do planeta – mais a União Europeia (UE), e ao sediar, em 2025, a 30ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas, a COP 30. “O Brasil hoje é o líder potencial do Sul global, e, em 2025, quando será realizada a COP 30, estará em um momento importante para assumir a liderança”, acrescentou.
O papel do Brasil será fundamental nessa agenda de transição energética, na avaliação de Blair, porque o país tem enorme potencial para energia solar e eólica e porque está no centro do debate devido à redução do desmatamento da Amazônia nos últimos meses. “Mas ainda há muito o que fazer nesse sentido e as florestas no mundo inteiro são importantíssimas para lidarmos com a mudança climática”, afirmou.
O ex-premier fez também um alerta para o fato de que um país conseguir destaque e poder no mundo está relacionado com o quão bem-sucedida essa nação é. “Se o governo estiver indo bem, o país pode ocupar a posição de liderança, mas não conseguirá isso se não não conseguir resolver os próprios problemas, como reformas”, disse ele, que admitiu ter se arrependido de ficar apenas um dia no Rio de Janeiro. “Eu sou louco por vir para cá por apenas um dia. Passei pela praia e me arrependi”, contou.
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Novas tecnologias
Na avaliação do ex-primeiro-ministro britânico, o investimento em novas tecnologias é o que ajudará no desenvolvimento das economias daqui para frente e, nesse sentido, será impossível pensar nos governos sem utilizar a inteligência artificial na prestação de serviços públicos.
“O grande evento mundial é a mudança que a tecnologia vai trazer com a inteligência artificial, vai mudar tudo no mundo, e, certamente, o mercado segurador, o setor de serviços, os governos”, disse.
Para ele, grande parte dos formadores de políticas públicas vivem em um mundo diferente daqueles que criam as mudanças em geral. “Os formadores de políticas estão tendo dificuldades de acompanhar essas mudanças. Não sei como vamos resolver isso”, disse.
No debate de cerca de uma hora para os executivos do mercado segurador, o ex-premier citou a Índia, que nos últimos anos, por conta das reformas domésticas, “tornou-se um player maior e com maior destaque global”. “Se eu estivesse apoiando um governo, eu pensaria em como deveríamos reimaginar o Estado e os serviços públicos reformulados pela tecnologia”, afirmou.
Na avaliação do ex-ministro, é possível aproveitar o potencial de hoje, em termos de diagnósticos dos laboratórios, por exemplo, e usar a tecnologia para fazer uma migração de um sistema de saúde que só cuida de doenças para um que foque no bem estar.
Brexit e Guerra da Ucrânia
O ex-primeiro-ministro voltou a lamentar a saída do Reino Unido da União Europeia. “Os blocos regionais importam. No mundo de hoje, o importante é estar de braços dados com os países dos blocos regionais. Obviamente, fiquei muito triste com o Brexit”, afirmou.
O Reino Unido saiu do bloco europeu em 2020 e, agora, tem que se esforçar para reconstruir boas relações com a UE.
“Esse é um desafio que nós teremos que cuidar para acertar, porque o bloco europeu tem muitas falhas e desafios, porém, vai continuar crescendo tanto que a Ucrânia quer entrar na UE. “No futuro, talvez tenhamos um bloco interno mais integrado e um acordo mais flexível com outros países da comunidade europeia”, apostou
Em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia, Blair destacou que o conflito tem impactos globais, e, portanto, não pode acabar de forma a remunerar a agressão russa, que começou o conflito, a fim de desincentivar o atual presidente russo, Vladimir Putin, ou os próximos a tentarem o mesmo novamente. “É importante que as pessoas de outras partes do mundo entendam que, se este conflito lhes parece distante, com informações desencontradas, para as pessoas na Europa ele é muito real. Espero que ele acabe, mas, para isso, é preciso que acabe de modo que a Europa tenha segurança sobre seu futuro, afirmou.
*A jornalista viajou a convite da CNSeg
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