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STJ anula júri da Boate Kiss; entenda

Ministros concordam com decisão do TJRS, que considerou irregular o julgamento, realizado em 2021. Mais de 10 anos depois, nenhum dos acusados pela morte de 242 frequentadores foi punido

Quando a tragédia fez 10 anos, em janeiro, parentes ergueram um memorial na Kiss -  (crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil)
Quando a tragédia fez 10 anos, em janeiro, parentes ergueram um memorial na Kiss - (crédito: Tomaz Silva/Agência Brasil)
Correio Braziliense
postado em 06/09/2023 03:55

Por Isabel Dourado*

A 6ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, ontem, manter a anulação do tribunal do júri que condenou quatro pessoas pela tragédia da Boate Kiss — na qual morreram 242 pessoas e 636 pessoas feridas, em 27 de janeiro de 2013. Após 10 anos, até o momento ninguém foi responsabilizado pela justiça. A Corte decidiu pela suspensão por 4 x 1 e as famílias das vítimas lamentaram o resultado, que classificaram como "decepcionante".

Com a decisão, as condenações dos réus — Elissandro Spohr e Mauro Londero Hoffmman, sócios da casa noturna, e Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão, integrantes da banda Gurizada Fandangueira — foram anuladas. O Ministério Público (MP) pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas um novo júri está previsto para acontecer daqui a três meses.

O STJ reconheceu as seguintes nulidades: irregularidades na escolha dos jurados; realização de uma reunião privada entre juiz e jurados; ilegalidade na elaboração dos quesitos; e suposta inovação da acusação na fase da réplica. Os advogados dos réus pediram a anulação do julgamento.

Em agosto de 2022, por 2 x 1, a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) anulou o júri, ocorrido em dezembro de 2021. O MP recorreu ao STJ para que a decisão do julgamento fosse mantida.

Em junho, o ministro relator Rogerio Schietti defendeu o restabelecimento das condenações, pois considerou que os pontos levantados pelas defesas dos réus não influenciaram o julgamento. O magistrado ainda elogiou o juiz Orlando Faccini Neto, que presidiu o júri dos quatro responsabilizados pela tragédia. Os ministros Antonio Saldanha Palheiro, Sebastião Reis, Jesuíno Rissato e Laurita Vaz discordaram do relator e mantiveram a anulação decidida pela 1ª Câmara Criminal do TJ-RS.

Divergência

Palheiros, Reis e Saldanha apontaram a reunião do juiz Faccini Neto com os jurados como "completamente irregular e anômala". Para o ministro Saldanha, a reunião "traz uma influência que não tem como salvar o procedimento". "Uma opinião do magistrado traz uma influência que não tem como salvar o procedimento. A própria incomunicabilidade dos juros fica comprometida", destacou.

Rissato também foi crítico em relação à reunião entre o juiz e os jurados. "Como essa Corte é uma Corte de precedentes, não podemos admitir que em qualquer comarca, em qualquer juízo deste país, o presidente do tribunal do júri resolve suspender o júri para ter uma reunião a sós com os jurados sem participação das partes", criticou.

A Associação de Familiares das Vítimas da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) lamentou a decisão. "Mais uma decepção com o Judiciário. Com isso, os quatro réus continuam em liberdade e um novo julgamento será marcado. Até quando a impunidade vai servir à injustiça? Foram 242 vidas roubadas, 636 jovens que sobreviveram àquela noite marcada pela ganância e pelo horror. São famílias destruídas, pais e mães que, 10 anos depois, lutam e esperam pela justiça", criticou a entidade. Elissandro Spohr, Mauro Hoffmman, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha foram sentenciados a penas de 18 a 22 anos de prisão.

Com a tragédia, houve mudanças na legislação do Rio Grande do Sul, com normas de prevenção e combate a incêndios a todos os imóveis não considerados como unifamiliares exclusivamente residenciais. Com a chamada "Lei Kiss", edifícios passaram a ser classificados como de baixo, médio ou alto risco de chamas.

*Estagiária sob a supervisão de Fabio Grecchi

 

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