O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou, mais uma vez, o julgamento que discute a constitucionalidade da implementação do juiz de garantias. Com os votos de ontem, a Corte tem dois votos a favor da criação da figura — um magistrado que atua apenas na fase de instrução do processo, fiscalizando a legalidade da investigação criminal — e um contrário.
A obrigatoriedade do juiz de garantias está suspensa em todo o país por decisão do relator das ações, ministro Luiz Fux, de janeiro de 2020. A sessão de ontem foi interrompida devido à agenda da presidente do STF, ministra Rosa Weber, e será retomada na próxima quarta-feira.
Até o momento, os ministros Dias Toffoli e Cristiano Zanin defenderam a criação obrigatória do juiz de garantias. O primeiro argumentou que a instituição deste magistrado no sistema processual penal foi uma prerrogativa legítima estabelecida pelo Poder Legislativo. Toffoli também sugeriu a fixação de um prazo de transição de 12 meses, com possibilidade de uma prorrogação.
Para o ministro, a criação do dispositivo deve ser obrigatória a todas as comarcas, pois a adoção opcional poderia tornar o dispositivo sem efeito. "Penso que deixar a adoção de tais providências ao sabor das conveniências regionais e da estrita discricionariedade dos entes federativos e dos tribunais implicaria dar a eles o poder de tornar o juiz de garantias 'letra morta'", salientou Toffoli.
Por outro lado, Fux considerou que a medida deve ser opcional, devendo ficar a critério de cada tribunal a implementação da figura. "O Poder Legislativo da União invadiu a competência legislativa concorrente dos estados membros nesta matéria, e invadiu no tocante ao autogoverno da magistratura dos judiciários locais", argumentou.
Primeiro voto
No primeiro voto no plenário do STF, o ministro Cristiano Zanin se posicionou a favor da criação do juiz de garantias, argumentando que a medida pode tornar o sistema penal mais justo. O magistrado destacou, ainda, que o mecanismo vai servir para que os julgamentos sejam mais imparciais.
Quando era advogado de Lula, Zanin travou embates com o hoje senador Sergio Moro (União-PR), então juiz da Operação Lava-Jato, a quem acusou de parcialidade nas decisões judiciais. Na sessão de ontem, sem citar nomes, o ministro mandou um recado ao parlamentar.
"Estou convicto de que a existência do juiz de garantias poderá, efetivamente, mudar o rumo da Justiça brasileira. Ao garantir à população brasileira a maior probabilidade de julgamentos imparciais e independentes, permite-se que o sistema penal seja potencialmente mais justo. A imparcialidade do juiz é o princípio supremo", disse o ministro.
O dispositivo foi incluído pelos parlamentares no pacote anticrime aprovado pelo Congresso, em 2019. A mudança, na prática, é de que a análise de processos criminais ficará dividida entre dois magistrados. O juiz de garantias seria um magistrado que atua apenas na fase de instrução do processo — ou seja, antes de virar uma ação penal, autorizando buscas e quebras de sigilo, por exemplo.
De acordo com a regra, a atuação dessa autoridade se encerra após decidir se aceita eventual denúncia apresentada pelo Ministério Público. Ele dá lugar a um novo magistrado, que efetivamente julgará o processo. No total, quatro ações questionam o tema na Suprema Corte e são relatadas por Fux.
Quando suspendeu a criação da figura, o ministro frisou que a proposta deveria ter partido do Judiciário, pois afeta o funcionamento da Justiça. Fux também apontou que o dispositivo foi aprovado sem a previsão detalhada do impacto orçamentário da implementação de dois juízes por processo.