Uma grande operação — feita após a morte de um policial por um atirador que seria ligado ao tráfico de drogas — deixou ao menos 16 mortos no Guarujá, cidade do litoral de São Paulo.
A operação no fim de semana envolveu 600 agentes das polícias Civil e Militar de São Paulo no bairro Vila Zilda.
Nesta quarta-feira (2/8), a polícia prendeu um homem apontado como o último suspeito da morte do policial que ainda estava à solta.
O governo federal criticou a ação policial, mas o Estado de São Paulo defende a operação, que ainda está em andamento.
A BBC News Brasil preparou uma linha do tempo dos acontecimentos que ajuda a entender o estopim e o desenrolar da onda de violência na região.
27 de julho, quinta-feira
O policial das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Patrick Bastos Reis foi atingido por um tiro no peito. Ele chegou a ser atendido no Pronto Atendimento da Rodoviária (PAM), mas não resistiu. Outro policial também foi baleado e ficou ferido.
Os tiros foram disparados a uma distância de 50 metros — o que levou a polícia a chamar o atirador de "sniper".
Reis foi morto quando patrulhava o bairro Vila Zilda por volta das 22h.
Na mesma noite, a polícia do Guarujá deu início à operação Escudo, cujo objetivo era capturar os criminosos responsáveis pela morte do policial.
28 de julho, sexta-feira
Cerca de 600 policiais foram enviados para reforçar o policiamento nos bairros Vila Júlia e Vila Zilda.
Equipes especializadas das polícias Militar e Civil foram acionadas.
O Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, foi até o Guarujá para acompanhar a operação.
"Vamos para cima até pegar todos, sem exceção", disse ele.
Os documentos apontam que as mortes na região após o assassinato do policial começaram por volta das 19h de sexta-feira.
Desde então, moradores de comunidades locais acusam policiais de agressões, ameaças e tortura. Os parentes de pessoas mortas na operação afirmam que inocentes foram retirados de casa e executados.
A Ouvidorias da Polícia do Estado de São Paulo recebe as denúncias e encaminha os relatos às Corregedorias. A Secretaria de Segurança Pública nega que tenham havido excessos na operação.
O ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, convocou a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos para acompanhar o caso.
As ações se concentraram em pontos de vendas de drogas em bairros longe das praias da cidade.
29 de julho, sábado
Segundo a SSP de São Paulo, três homens morreram no sábado ao reagirem a abordagens policiais em diferentes locais.
A Ouvidoria da Polícia de São Paulo informou que estava recebendo notificações e denúncias de moradores da região.
30 de julho, domingo
Em 42 horas de operação sete pessoas foram mortas na Baixada Santista. Foram feitos disparos de fuzil e pistolas na região.
No domingo (30), o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) afirmou nas redes sociais que o autor do disparo que matou Reis havia sido capturado na zona sul da capital paulista.
Erickson David da Silva se entregou à polícia na zona sul de São Paulo. Segundo o UOL, ele tem três passagens por roubo e uma por formação de quadrilha.
Ainda conforme o UOL, o homem chegou a ficar preso no Centro de Detenção Provisória de São Vicente, na Baixada Santista.
Ele também passou pelo Centro de Progressão Penitenciária de Mongaguá, de regime semiaberto, e em 16 de fevereiro de 2016 recebeu o benefício de prisão albergue domiciliar.
Segundo o ouvidor Claudio Aparecido da Silva, moradores do Guarujá relataram que policiais torturaram e mataram um homem e prometeram matar ao menos 60 pessoas em comunidades.
31 de julho, segunda-feira
Na segunda, o número de mortes na operação subiu para 10. O governador Tarcísio Freitas avaliou que não houve excesso da força policial.
Ainda na segunda, o suspeito de atirar e matar o soldado da Rota passou por audiência de custódia no Fórum de Santos, no litoral de São Paulo e teve a prisão temporária mantida por 30 dias.
1° de agosto, terça-feira
Na terça-feira (1/8), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, afirmou que subiu para 14 o número de mortos na operação policial. Ele classificou os confrontos entre criminosos e policiais como um "efeito colateral".
Uma comissão formada pela Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo, Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) foi ao Guarujá para apurar se houve excessos por parte dos policiais.
O grupo irá ouvir familiares das vítimas e, eventualmente, outras pessoas que possam ter sido alvo de arbitrariedades praticadas pelos policiais.
2 de agosto, quarta-feira
Nesta quarta-feira, o número de mortos na operação subiu para 16, confirmou o governo de São Paulo.
No mesmo dia, um suspeito de participar da morte do PM foi preso após se entregar à polícia. O homem de 20 anos, identificado como Kauã Jazon da Silva é irmão do suspeito de atirar no policial.
De acordo com o G1, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, afirmou que Kauã tinha a função de ficar posicionado na comunidade Vila Júlia, no Guarujá, armado e com um comunicador, pronto para avisar os comparsas sobre a chegada de viaturas policiais ao local.
Ainda conforme o G1, o delegado titular do DP Sede da cidade, Antonio Sucupira Neto, a investigação sobre a morte do PM da Rota foi encerrada após a prisão de Kauã. A Polícia Civil deteve Erickson, suspeito de atirar, e também um suspeito identificado apenas como "Mazzaropi", por envolvimento no caso.
Qual foi o resultado da operação?
Após um desencontro inicial sobre números, foram confirmadas 16 mortes e 58 prisões até o momento.
A SSP de São Paulo informou que, dos 58 presos, 38 foram em flagrante e outros 20 eram procurados da Justiça. Quatro adolescentes foram apreendidos também por tráfico de drogas.
O governo diz que quatro suspeitos da morte do policial foram identificados e dois deles estão presos. Um dos presos é considerado suspeito de ter matado o policial da rota.
A polícia não divulgou o nome dos mortos, mas a imprensa local noticiou entrevistas com parentes, na qual alguns denunciaram ações ilegais da polícia.
A operação ainda está em andamento e tem previsão de continuar até o final de agosto.
Qual foi a repercussão da operação até agora?
A Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo disse que moradores relataram a tortura e a morte de uma pessoa por policiais. A Ouvidoria disse que vai pedir as imagens das câmeras dos policiais que estiveram envolvidos na operação.
O governo federal criticou a ação da polícia estadual.
"Chama atenção o fato de você ter um terrível crime contra um policial, um crime realmente que merece a repulsa, sendo usado inclusive uma pistola de 9 milímetros. E houve uma reação imediata que não parece nesse momento ser proporcional em relação ao crime que foi cometido", disse o ministro da Justiça, Flavio Dino.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, defendeu a operação policial.
"Não houve excesso. Houve uma atuação profissional, que resultou em prisões. E nós vamos continuar com a operação", disse o governador.
"Nós vamos investigar, nós vamos prender, nós vamos apresentar à Justiça, nós vamos levar ao banco dos réus. Foi isso exatamente que foi feito neste final de semana. Eu estou extremamente satisfeito com a ação da polícia, extremamente triste com o que aconteceu porque nada vai trazer um pai de família de volta."