Quem ingere ou já consumiu bebidas alcoólicas na vida provavelmente já foi vítima de, pelo menos, um desses arrependimentos, devido ao estado de embriaguez: dizer algo indevido, ligar para ex-companheiros, perder objetos, faltar a compromissos no dia seguinte e até mesmo trair o parceiro amoroso.
Acontece que estes remorsos são justamente os principais apontados pelos brasileiros como causa da popularmente chamada "ressaca moral", segundo novo levantamento realizado pelo instituto Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), a pedido do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa) - uma organização não-governamental sediada em São Paulo*.
Parte dos entrevistados afirma que já passou momentos de excesso e de lamentos devido à embriaguez, mas que a maioria deles aconteceu nos primeiros contatos com o álcool. Atualmente, boa parte dos entrevistados afirma evitar tais situações. Embora alguns, principalmente entre os consumidores abusivos e mais jovens, assumam que há episódios eventuais em que exageram no consumo dessas bebidas.
A pesquisa aponta também que a maioria das ocorrências de embriaguez não é proposital, uma vez que esse nível de ebriedade é atingido sem que o indivíduo se dê conta. Isso também se mostrou comum entre os consumidores abusivos, que relatam não conseguir perceber o momento em que “passam do ponto”.
- Mais da metade dos brasileiros não consome bebida alcoólica, diz levantamento
- Lei Seca 15 anos: mistura de álcool e direção provoca 1,2 morte por hora
- Existe quantidade segura de consumo de álcool? Entenda recomendação para brasileiros
Vergonha pela reputação
Os relatos de ingestão excessiva de álcool, e de arrependimentos relacionados a isso, englobam situações geralmente associadas à vergonha e a problemas que poderiam ser evitados se não tivessem bebido. Ou seja, os pesquisadores notaram que os principais motivos para se arrepender de beber muito não tem relação com a saúde, mas sim com o medo de manchar a reputação.
Entre os principais arrependimentos após uma bebedeira também foram citados pelos entrevistados:
- falar algo que não devia aos amigos, ou ser excessivamente sincero e magoar alguém;
- perder dinheiro ou objetos;
- ligar para um(a) ex-namorado(a) durante o momento de embriaguez;
- estar namorando uma pessoa e beijar outra em uma festa e
- não comparecer a um compromisso de trabalho no dia seguinte após embebedar-se na noite anterior.
O panorama associou o consumo abusivo de álcool à sociabilidade dos jovens, ou seja, eles acreditam que beber ajuda a interagir melhor entre si. O arrependimento e a censura também são consequências do medo social, do julgamento das outras pessoas; e não biológico, de que a saúde estaria sendo prejudicada. Apesar disso, não foram reportadas pelo entrevistados mudanças de comportamento significativas em relação ao consumo de álcool após situações de exagero ou de arrependimento.
“A pesquisa mostrou que o álcool é parte relevante da sociabilidade dos jovens, por isso é possível entender que as preocupações e os riscos percebidos tendem a se relacionar com esse aspecto de suas vidas. Também é preciso lembrar que o raciocínio de longo prazo não é habitual nesta fase e, portanto, problemas de saúde que aparecem mais tardiamente não estão no radar dos jovens”, avalia a socióloga Mariana Thibes, coordenadora do Cisa.
Os consumidores moderados de álcool afirmam, em geral, beber de forma prudente e que raramente extrapolam a ponto de se arrepender ou passar mal. O medo de passar vergonha e do mal estar pós-consumo funcionam como freio para a ingestão.
Mudança de comportamento pelo trauma
Ainda que seja minoria, alguns dos participantes da pesquisa declararam ter apresentado mudanças de comportamento após ficar bêbados em demasia, como:
- Não consumir mais a bebida que resultou no “porre”;
- não misturar diferentes bebidas alcoólicas após ter passado mal;
- não beber e dirigir após acidente de automóvel envolvendo amigos ou conhecidos e
- passar a beber menos do que a quantidade que resultou na experiência traumática.
Consumidores abusivos não reconhecem padrão
A pesquisa apontou também que as pessoas que têm práticas de consumo abusivas, especialmente os homens, não se reconhecem como excessivos. Na percepção deles, são sempre os outros que consomem mais: 75% acreditam que são consumidores moderados, com relação à frequência que bebem.
E a faixa etária que mais abusa da frequência é a de 60 anos ou mais: 17% afirmam consumir seis ou mais doses, de duas a quatro vezes por semana; e 9% o fazem cinco vezes por semana ou mais.
Já a porcentagem de homens que declarou consumir uma quantidade abusiva também foi expressiva: 16% declararam ingerir de cinco a seis doses, 5% de sete a nove doses e 18% consomem em média dez ou mais doses. Entre as mulheres, o número é menor: 12%, 2% e 12%, respectivamente — no Brasil, uma dose de bebida equivale a 14g de álcool puro, o que corresponde a 350ml de cerveja (5% de álcool), 150ml de vinho (12% de álcool) ou 45ml de destilado (vodca, uísque, cachaça, gin, tequila, com 40% de álcool).
Saiba Mais
- Brasil "Hoje tiramos da invisibilidade milhares de quilombolas", diz Conaq
- Brasil Dino: suposto espião russo não será extraditado para os Estados Unidos
- Brasil Correio abrirá inscrições para curso Jornalismo na Prática na próxima semana
- Brasil Governo do Paraná decreta luto oficial após oitava morte em explosão
* A pesquisa Álcool e a Saúde dos Brasileiros: Panorama 2023 abordou 1.983 pessoas. Para amostra nacional, a margem de erro foi de no máximo dois pontos percentuais, com 95% de intervalo de confiança. Os dados foram projetados para o total da população com 18 anos ou mais.