O Supremo Tribunal Federal (STF) entrou em plenária nesta sexta-feira (23/6) para julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 6218 – e decidir se o estado do Rio Grande do Sul segue com o direito de proteger uma área de mais de 13 mil km² da sua costa. Como a liberação dessa atividade pode ser drástica, tanto para o meio ambiente quanto para milhares de família que dependem da pesca, pescadores artesanais se unem para fazer um manifesto. A ação foi movida pelo Partido Liberal (PL), que argumenta que o estado só poderia legislar sobre as águas superficiais ou subterrâneas presentes no território.
Há quase cinco anos a lei gaúcha baniu de seu mar territorial a pesca industrial de arrasto de fundo, a mais danosa forma de atividade pesqueira do país. A modalidade chega a descartar 70% das espécies capturadas, que são devolvidas ao mar mortas, provocando alto impacto ambiental e levando os estoques de pescados ao colapso.
“Após a proibição da pesca de arrasto no Rio Grande do Sul, as comunidades locais relatam que o peixe está de volta, e as outras pescarias estão em franca recuperação. Isso reforça a importância dessa lei para garantir renda e alimento para milhares de pescadores e suas famílias”, explica o diretor-geral da Oceana, o oceanólogo Ademilson Zamboni.
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A Lei estadual 15.223, de setembro de 2018, criou a Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Pesca, que foi construída com participação de todo o setor pesqueiro local. Desde que foi sancionada, foram várias as tentativas de anulá-la, mas, sem sucesso.
Em dezembro de 2019, o ministro Celso de Mello negou uma liminar que pedia a liberação da pesca de arrasto antes da decisão final do plenário do STF. O ministro argumentou que os estados têm competência constitucional para legislar concorrentemente com a União em tema de defesa do meio ambiente e pesca, inclusive estabelecendo medidas para proteção do ambiente marinho.
Esse é, também, o entendimento de diversos juristas e, inclusive, do procurador-geral da República, Augusto Aras, que se manifestou no caso indicando o indeferimento da Ação.
Até a publicação desta matéria, o STF tem o voto apenas do relator, ministro Nunes Marques, que é contra a lei. A votação começou às 00h01 desta sexta-feira (23/6) e vai até a próxima semana (30/6), porém o prazo pode acabar antes, se todos votarem.
União pela aprovação
Em junho de 2022, a bancada gaúcha no Congresso lançou manifesto pluripartidário em defesa da constitucionalidade da Lei estadual. Na época, o deputado federal, Giovani Cherini (PL-RS) foi contundente.
“Diante de questionamentos sobre a constitucionalidade ou não da lei que proibiu o arrasto e melhorou em muitas vezes a qualidade da pesca no litoral gaúcho, pedimos urgência ao Supremo. Que esse tema seja logo analisado e que tenhamos uma decisão definitiva sobre essa matéria, para que possamos garantir a continuidade da pesca hoje e no futuro”, declarou o parlamentar.
A expectativa das comunidades pesqueiras artesanais de todo o Brasil, comunidade científica, organizações da sociedade civil e políticos locais e federais é de que a pesca de arrasto não mais ocorra naquela parte da costa brasileira. “Essa legislação é uma conquista histórica construída pelo setor pesqueiro gaúcho e com o suporte técnico da Oceana. Um resultado negativo no STF seria um revés para o meio ambiente e para as comunidades pesqueiras, que viram seus estoques se recuperarem nos últimos anos, beneficiando milhares de pescadores artesanais, além dos pescadores de outras modalidades que não praticam o arrasto”, observa Zamboni.
Pescador de Capão da Canoa, Waldomiro Hofman conta que antes “os barcos arrastavam, e a beira de praia era um tapete de peixes mortos do descarte que faziam”. Agora, com a frota industrial atuando mais longe da costa, a abundância de cardumes voltou a região. A sensação é comum em toda a extensão do litoral. “Nós vimos uma melhora muito grande nas capturas. As pescarias estão muito melhores agora, tanto na quantidade quanto na qualidade dos peixes. As pessoas estão pescando com mais capacidade. Está bonito de se ver”, comemora Salomar do Canto, presidente da Associação dos Pescadores de Xangri-lá.