Após um ano do assassinato brutal de Bruno e Dom a terra indígena do Vale do Javari ainda vive sob medo e abandono pelo Estado. Fontes ouvidas pelo Correio lamentam a inação do poder público para combater a violência e o tráfico na região. Integrantes da Funai que atuam na região afirmam, em caráter reservado, que as terras indígenas continuam sendo invadidas com a presença de garimpeiros, pescadores, caçadores e o crime organizado.
Esta reportagem faz parte da série ‘Para além do Vale do Javari: quem foi Bruno Pereira’. No aniversário da morte do indigenista Bruno Pereira, o Correio Braziliense reconstitui a trajetória do apaixonado pelos povos originários que acabou tornando-se um mártir da causa indígena. Confira as outras reportagens da série:
- Um ano sem Bruno Pereira: conheça o personagem por trás do ícone.
- O nascimento de um indigenista: conheça a trajetória de Bruno Pereira na Funai.
- Como era a vida de Bruno Pereira na floresta com índios isolados.
“Não tem Ibama, não tem Polícia Federal em Atalaia, as agências de segurança pública não estão presentes. O Exército está aí, mas é aquela coisa: é a maior burocracia para fazer uma parceria. A Força Nacional baseada na nossa região tampouco contempla nossas necessidades. Os policiais militares que são arregimentados pela Força Nacional trabalharam por anos em área urbana. O Estado não dá condições para nós fazermos nosso trabalho. Acho que por isso que o Bruno tinha pouca perspectiva, falava que nosso chefe é os índios. A gente está aqui porque eles precisam da gente, estamos tentando fazer com que os direitos deles se concretizem”, critica Iltercley Chagas.
O servidor cobra mais velocidade para conter os crimes cometidos contra o meio ambiente e os povos indígenas. “Ainda está muito incipiente. A (ministra dos Povos Indígenas) Sônia Guajajara evocou, nas entrevistas dela, que o Vale do Javari e a Terra Ianomâmi ia ser foco das atuações. Até houve uma projeção bacana no início, mas não deu seguimento. Quase seis meses depois é que está se vendo um movimento mais institucionalizado, o Estado fazendo reuniões intersetoriais. Estávamos na perspectiva de que seria algo mais imediato”, reclama Chagas.
Eliesio Marubo, procurador jurídico da Univaja, afirma que o governo atual não tem dado a devida prioridade para a causa no Vale do Javari. “Nada mudou. As coisas estão do mesmo jeito, cada vez piores. Não estamos tendo as respostas que esperávamos. Isso tem agravado a situação no Vale do Javari. Dificilmente eles vão dar resposta que precisamos agora. Estamos totalmente vulneráveis. Eu tenho estado cansado com todo esse contexto e perdido um pouco as esperanças”, lamenta.
Ivan Soler lembrou do assassinato do indigenista Maxciel Pereira, morto em 2019. E faz um apleo por uma presença maior do Estado na região amazônica. “Maxciel foi assassinado em Tabatinga, onde a família dele morava. Foi outro que pagou caro por cumprir com seu dever de funcionário público com louvor. Ele era meu chefe. Só ele e eu trabalhávamos naquela salinha do 2º andar do prédio da Funai em Atalaia do Norte. O Estado tem que aumentar muito sua presença por lá”, clama.
“Meu maior desejo, e acredito que fosse o dele também, é que todo mundo se esforce para que a partida deles não tenha sido em vão. Porque para os indígenas, indigenista bom é indigenista vivo. Mortos não temos utilidade alguma para eles”, finaliza Soler.
*Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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