Para além do Vale do Javari: quem foi Bruno Pereira

Um ano após morte de Bruno Pereira, abandono se mantém no Vale do Javari

Integrantes da Funai que atuam na região afirmam, em caráter reservado, que as terras indígenas continuam sendo invadidas com a presença de garimpeiros, pescadores, caçadores e o crime organizado

Isabel Dourado*
postado em 04/06/2023 06:08
 (crédito: Divulgação/Funai/Arquivo)
(crédito: Divulgação/Funai/Arquivo)

Após um ano do assassinato brutal de Bruno e Dom a terra indígena do Vale do Javari ainda vive sob medo e abandono pelo Estado. Fontes ouvidas pelo Correio lamentam a inação do poder público para combater a violência e o tráfico na região. Integrantes da Funai que atuam na região afirmam, em caráter reservado, que as terras indígenas continuam sendo invadidas com a presença de garimpeiros, pescadores, caçadores e o crime organizado.

Esta reportagem faz parte da série ‘Para além do Vale do Javari: quem foi Bruno Pereira’. No aniversário da morte do indigenista Bruno Pereira, o Correio Braziliense reconstitui a trajetória do apaixonado pelos povos originários que acabou tornando-se um mártir da causa indígena. Confira as outras reportagens da série:


“Não tem Ibama, não tem Polícia Federal em Atalaia, as agências de segurança pública não estão presentes. O Exército está aí, mas é aquela coisa: é a maior burocracia para fazer uma parceria. A Força Nacional baseada na nossa região tampouco contempla nossas necessidades. Os policiais militares que são arregimentados pela Força Nacional trabalharam por anos em área urbana. O Estado não dá condições para nós fazermos nosso trabalho. Acho que por isso que o Bruno tinha pouca perspectiva, falava que nosso chefe é os índios. A gente está aqui porque eles precisam da gente, estamos tentando fazer com que os direitos deles se concretizem”, critica Iltercley Chagas.

O servidor cobra mais velocidade para conter os crimes cometidos contra o meio ambiente e os povos indígenas. “Ainda está muito incipiente. A (ministra dos Povos Indígenas) Sônia Guajajara evocou, nas entrevistas dela, que o Vale do Javari e a Terra Ianomâmi ia ser foco das atuações. Até houve uma projeção bacana no início, mas não deu seguimento. Quase seis meses depois é que está se vendo um movimento mais institucionalizado, o Estado fazendo reuniões intersetoriais. Estávamos na perspectiva de que seria algo mais imediato”, reclama Chagas.

  • Bruno Pereira tomando caiçuma, bebida fermentada produzida pelos povos indígenas da Amazônia Beto Marubo
  • Bruno Pereira Beto Marubo
  • Bruno Pereira Beto Marubo
  • Bruno Pereira Rio Uatuma Ivan Soler

Eliesio Marubo, procurador jurídico da Univaja, afirma que o governo atual não tem dado a devida prioridade para a causa no Vale do Javari. “Nada mudou. As coisas estão do mesmo jeito, cada vez piores. Não estamos tendo as respostas que esperávamos. Isso tem agravado a situação no Vale do Javari. Dificilmente eles vão dar resposta que precisamos agora. Estamos totalmente vulneráveis. Eu tenho estado cansado com todo esse contexto e perdido um pouco as esperanças”, lamenta.

Ivan Soler lembrou do assassinato do indigenista Maxciel Pereira, morto em 2019. E faz um apleo por uma presença maior do Estado na região amazônica. “Maxciel foi assassinado em Tabatinga, onde a família dele morava. Foi outro que pagou caro por cumprir com seu dever de funcionário público com louvor. Ele era meu chefe. Só ele e eu trabalhávamos naquela salinha do 2º andar do prédio da Funai em Atalaia do Norte. O Estado tem que aumentar muito sua presença por lá”, clama.

“Meu maior desejo, e acredito que fosse o dele também, é que todo mundo se esforce para que a partida deles não tenha sido em vão. Porque para os indígenas, indigenista bom é indigenista vivo. Mortos não temos utilidade alguma para eles”, finaliza Soler.

*Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza

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