Há 33 anos, em 17 de maio de 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou a homossexualidade do Código Internacional de Doenças (CID). Publicado em 1952, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria, apontava a homossexualidade como uma doença a ser tratada.
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Apenas em 1973, após uma revisão, a homossexualidade deixou de constar como transtorno mental, e somente após 17 anos saiu da classificação no CID. A data marcou um passo importante para a compreensão da homossexualidade como identidade sexual — que não precisa de cura.
“Dia Internacional de Luta Contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia” no Brasil e no Mundo
A data de 17 de maio posteriormente se tornou um símbolo da luta contra o preconceito e violência a lésbicas, gays, transgêneros, queers, intersexos, assexuais, e a favor da diversidade sexual. O dia, como conceito, foi concebido somente em 2004 através de uma campanha que resultou no primeiro Dia Internacional Contra a Homofobia em 17 de maio de 2005. Mais de 24 mil indivíduos e organizações assinaram um apelo para apoiar a "Iniciativa IDAHO" (International Day Against Homophobia), com atividades acontecendo em vários países.
Em 2009, a transfobia foi adicionada ao nome da campanha e as atividades daquele ano se concentraram sobre a violência e discriminação contra pessoas trans. Em 2015, a bifobia foi adicionada ao nome da campanha.
No Brasil, a data está incluída no calendário oficial do país desde 2010, de acordo com o Decreto de 4 de junho daquele ano — assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Pandemia escancarou a vulnerabilidade deste grupo social
Durante o período da pandemia de covid-19, a população LGBTI+ ficou ainda mais vulnerável e, em 2019, o Brasil estava em primeiro lugar no ranking de assassinatos de pessoas trans no mundo, com números acima da média, de acordo dossiê elaborado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
Conforme outro relatório, produzido em 2021 pela Transgender Europe (TGEU), que monitora dados globalmente levantados por instituições trans e LGBTQIA+, 70% de todos os assassinatos registrados na comunidade LGBTQIA+ ocorreram na América do Sul e Central, sendo 33% no Brasil (seguido pelo México).
De acordo com o psicólogo André Carneiro, uma das principais dificuldades enfrentadas por pessoas pertencentes ao grupo LGBTQIA+ está relacionada à cultura cis heteronormativa. “Infelizmente, o Brasil ainda é um país bastante preconceituoso e as consequências de atos discriminatórios apresenta prejuízos imensos a saúde mental das vítimas, como depressão, ansiedade, alcoolismo, vício em drogas e até mesmo suicídio”, acrescenta o especialista.
Carneiro ainda aponta que as pessoas que pertencem a esse grupo sofrem constantemente agressões físicas e emocionais e têm os direitos violados, como a dificuldade no acesso à educação, a saúde, além de poucas oportunidades no mercado de trabalho, como também abusos de ordem moral e psicológica.
De acordo com dados publicados em 2019, pela organização Associação Internacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Trans e Intersexuais (ILGA), em 70 países a homossexualidade ainda é criminalizada, com casos de prisão e até de pena de morte. E a transexualidade só deixou de ser classificada como doença pela OMS em junho de 2018.
Conquistas alcançadas pela comunidade LGBTQIA+
A mudança do nome no registro civil, sem a necessidade de que pessoas trans passem por cirurgia, adoção de crianças por casais homoafetivos e a criminalização da LGBTfobia como crime de racismo são algumas das conquistas alcançadas nas últimas décadas no Brasil.
O casamento entre pessoas do mesmo sexo passou a ser reconhecido em muitos países — no Brasil, houve a equiparação da união estável homoafetiva em 2011, o casamento civil foi aprovado em 2013 e o direito à adoção por casais do mesmo sexo em 2015. Entre outras conquistas, a representatividade da comunidade LGBTQIA+ também ajuda na desconstrução de preconceitos e maior proximidade com as dificuldades enfrentadas pelas pessoas LGBTQIA+.
A Política Nacional de Saúde Integral da População LGBTQIA+ foi instaurada no âmbito do SUS (Sistema Único de Saúde), através da Portaria n°2.836 em 1° de dezembro de 2011, com o objetivo de promover a saúde integral dessa população “eliminando a discriminação e o preconceito institucional, bem como contribuindo para a redução de desigualdades e a consolidação do SUS como sistema universal, integral e equitativo”.
Homofobia no Brasil
A homofobia é a discriminação contra pessoas em função de orientação sexual ou a identidade de gênero. O psicólogo André Carneiro explica o conceito e ações de apoio que devem ser realizadas: “A homofobia consiste no ódio e repulsa pela população LGBTQIA +, atitude que deve ser combatida com afinco para exista uma sociedade baseada na tolerância e no respeito ao próximo, independente da orientação sexual. Sem falar no rigor punitivo a quem comete o crime de homofobia”.
No Brasil, até o momento, ainda não existem leis específicas para a criminalização da homofobia.
Crime de Homofobia
O Correio Braziliense conversou com a advogada Renata Farage especialista em direito penal, que acrescentou alguns pontos relevantes nessa discussão. “A homofobia é um crime imprescritível e inafiançável no Brasil desde 2019, o STF decidiu equiparar o crime de LGBTfobia ao de racismo, até que o Congresso Nacional edite (uma) lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas, vão se enquadrar nos crimes previstos na Lei 7.716/89, conhecida com Lei do Racismo, que pune todo tipo de discriminação ou preconceito, seja de origem, raça, sexo, cor, idade”, detalha.
“O conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis, como é o caso da comunidade LGBTQIA+”, completa.
“Quando uma afirmação é capaz de provocar especial estímulo à hostilidade contra pessoas em razão da orientação sexual ou identidade de gênero, está configurado o crime de homotransfobia e é possível fazer uma denúncia diretamente no site do Ministério Público Federal, cabendo aos casos de homofobia o tratamento legal conferido ao crime de racismo”, acrescenta a advogada.
Há, ainda, o caso de uma ofensa homofóbica ser enquadrada como injúria, segundo o artigo 140, §3º do Código Penal. Caso o crime esteja em curso, o ideal é que a vítima ligue imediatamente para a emergência, através do 190 e peça ajuda policial para que os envolvidos sejam conduzidos para a Delegacia de Polícia para a confecção do registro da ocorrência.
"É de extrema importância conseguir os dados das testemunhas e as provas do crime. Se a vítima sentir que precisa de orientação jurídica, o ideal é contratar um advogado de confiança para acompanhá-lo à delegacia, existem advogados que prestam serviços para ONGs especializadas em proteger os direitos da população LGBTQIA+”. orienta Renata.
A pena do crime de racismo por LGBTfobia é de um a três anos de prisão e caso seja cometida por meio de rede social a pena pode ser aumentada para dois a cinco anos de cadeia.
*Estagiário sob supervisão de Ronayre Nunes