O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), por meio de suas Comissões Especiais de Assuntos Regulatórios, de Direito da Saúde e de Acompanhamento Legislativo e da Comissão Nacional de Direitos Humanos, promoveu na tarde desta quarta-feira (29/3) o 3º Congresso Brasileiro do Direito da Cannabis Medicinal: uma agenda para o presente.
Participante do evento, Renato Malcher Lopes, doutor em Neurociências pela Tulane University, coautor do livro Maconha, Cérebro e Saúde e professor da Universidade de Brasília (UnB), defendeu a administração do medicamento. Pai de um filho autista, o neurocientista afirmou que preconceito é a pior parte no tratamento e pediu que o medicamento alcance os pacientes.
- Pesquisas são fundamentais para uso da cannabis medicinal, diz especialista
- Visão do Correio: Desafios no uso de Cannabis medicinal
- Uma em cada sete mulheres, aos 40 anos, já passou por aborto no Brasil
“Tenho vários lugares de fala. O mais incômodo pra mim é o de cientista, no contexto em que a ciência tem que pedir desculpa ou agradecer muito essa revolução social que rompeu essa barreira absurda. Barreira essa que impedia as pessoas de terem acesso a uma planta medicinal, que hoje em dia é o que é porque tem uma coevolução com os seres humanos há mais de 5 mil anos. Modificaram a planta para ela ser o que é: uma planta medicinal”, disse Malcher.
Medicação segura
Monique Lamounier, mãe de paciente e cultivadora da cannabis para tratamento do filho, diagnosticado com o espectro autismo, iniciou o debate hoje destacando a quebra de preconceitos sobre a pauta. Ela destacou que o tratamento natural ajudou na “qualidade de vida da família”.
“A cannabis tem sido a porta de entrada para que a gente possa ajudar essas crianças, é uma síndrome difícil de colocar na caixinha. Meu filho tem nível três de autismo, ele foi diagnosticado com um ano e sete meses e teve muitas intervenções. Mas chegou um ponto em que a gente percebeu que se a gente não entrasse com uma medicação seria inviável continuar o tratamento dele”, contou a mãe sobre suas experiências.
“A medicação é segura. A perspectiva para depois da regulamentação, e com todas as pesquisas que já têm sido feitas, vai só facilitar para que a gente consiga encontrar a dosagem certa. Acho que essa é a parte mais difícil”, completou Lamounier.
Estudo de canabidiol
De acordo com um estudo publicado na revista Therapeutic Advances in Psychopharmacology, o remédio com base de canabidiol ajuda crianças que têm autismo mas também melhora a qualidade de vida de adultos com o espectro. Algumas pesquisas anteriores relataram que os extratos de cannabis com uma alta proporção de CBD para THC podem ajudar a melhorar os resultados comportamentais de crianças com autismo, mas outros estudos sugeriram que o óleo de THC puro pode ser o tratamento mais ideal.
Renato Malcher contou que o uso do extrato de cannabis para o tratamento de epilepsia e demais doenças já era usado há tempos na sociedade. “Um médico irlandês viu que na Índia, a medicina tradicional indiana, conseguia tratar coisas que os europeus estavam desesperados tentando tratar, como por exemplo: sintomas de cólera, tétano, convulsões, e epilepsia. Primeiro, o artigo foi publicado em Inglaterra em 1843”, explicou o neurocientista sobre o primeiro estudo de canabidiol a chegar no Ocidente.
Anny Fischer foi a primeira paciente a fazer administração de cannabis no Brasil, em 2014. Portadora de uma síndrome que tem um quadro de epilepsia refratária, ela iniciou o tratamento com 5 anos de idade. O sucesso no controle das crises convulsivas de Anny, com o uso de um óleo rico em CBD, acabou contagiando outros pais e mães pelo país, e as histórias positivas se multiplicaram.
Depois disso, um grupo de epiléticos do estado da Paraíba, liderado por Júlio Amarico e Sheila Dantas, conseguiu, junto ao Ministério Público Federal, a primeira liminar favorável a um grupo de pessoas para a importação do óleo.
*Estagiária sob a supervisão de Andreia Castro