A celebração do Dia Mundial da Água, hoje, é motivo de alerta para o Cerrado. Isso porque, de acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), o bioma pode perder cerca de 23,6 mil m³/s da água disponível até 2050 — deterioração de aproximadamente 35% da quantidade atual, o que equivaleria à vazão total de oito rios Nilo, no Egito, o maior do mundo em extensão.
O estudo faz parte da tese de doutorado do pesquisador do ISPN Yuri Salmona, que coletou e comparou dados da vazão dos rios com dados de uso do solo no cerrado entre 1985 e 2022. A pesquisa, divulgada na revista científica Internacional Sustainability, alerta que a principal causa para a perda de água é a mudança na utilização do solo pela agropecuária.
Segundo o pesquisador, se as taxas de desmatamento não tiverem uma redução drástica, a escassez hídrica virá em menos de 30 anos. "O desmatamento para agricultura em larga escala, que demanda intensa irrigação, altera o ciclo hidrológico, de forma que diminui a vazão dos rios. Os principais problemas derivados das mudanças do clima são a evapotranspiração potencial e a chuva. Estamos tendo chuvas mais concentradas, em períodos mais curtos, e os períodos de seca estão sendo mais longos", explica.
Sobre a interferência da agropecuária no ciclo hídrico, a coordenadora do Programa Cerrado e Caatinga do ISPN, Isabel Figueiredo, explica que essas atividades podem impedir com que a água infiltre nas camadas profundas da terra de maneira lenta. Isso termina por compactar o solo.
"A água não consegue infiltrar, é muito lixiviada. Tem muitos escoamentos, que é quando vai carregando o solo junto para dentro do rio e gerando assoreamento. A capacidade de retenção dos próprios leitos dos rios diminuem", avisa.
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Uso impróprio
Outra pesquisa, esta conduzida pela ONG SOS Mata Atlântica, identificou que os rios que integram as bacias hidrográficas no bioma estão cada vez mais impróprias para uso. Segundo o estudo, apenas 6,9% dos pontos analisados são considerados de boa qualidade.
O levantamento apontou que, em 75% dos casos, a qualidade da água é regular, enquanto que em 16,2% dos pontos é ruim e, em 1,9%, é péssima. Isso quer dizer que quase 20% dos locais analisados não oferecem condições mínimas para qualquer tipo de uso — como agricultura, indústria, abastecimento humano, consumo animal, lazer ou prática de esportes.
De acordo com o coordenador da pesquisa, Gustavo Veronesi, tais resultados são efeito da falta de tratamento de esgoto e de mau uso e ocupação do solo. Ele aponta, ainda, o descuido com as matas ciliares, áreas das florestas na beira do rio e que fazem filtragem das impurezas.
*Estagiário sob a supervisão de Fabio Grecchi
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