Mais da metade das crianças ianomâmis com menos de 5 anos de idade estão abaixo ou muito abaixo do peso considerado adequado. Pesquisa feita pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) aponta fatores socioambientais como causa do problema. Em 2022, a taxa de desnutrição na etnia era de 52,2%, após um pico 56,5% em 2021 — números que se referem apenas às crianças atendidas pelo Subsistema de Atenção à Saúde Indígena no Sistema Único de Saúde (SasiSUS), acompanhadas pela Vigilância Alimentar e Nutricional (VAN).
Ana Claudia Santiago, pesquisadora em saúde pública da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) e coordenadora de projetos de pesquisa na área da saúde indígena, destaca o papel do aleitamento materno para criança de 0 a 6 meses na formação de imunidade e fortalecimento, mas, nas comunidades indígenas, a exposição precoce à água contaminada por mercúrio — metal pesado altamente tóxico — despejado nos rios da floresta pelos garimpeiros ilegais.
"As crianças se desenvolvem muito bem até os seis meses de vida, que é quando se alimentam quase que exclusivamente de leite materno. Enquanto está no peito da mãe e se alimenta de leite materno, ela consegue garantir um crescimento adequado, se desenvolve de uma forma normal como qualquer outra criança do Brasil saudável. Quando passa a ter contato com a terra, ela sai do colo da mãe, passa a beber água, começa a ter acesso a outro tipo de alimento, e inicia esse quadro de diarreia. São quadros repetitivos que levam à desidratação e à desnutrição, e isso se explica pela contaminação da água dos rios", explica a pesquisadora.
Os ianomâmis enfrentam uma grave crise humanitária, decorrente da mineração ilegal. Pelo menos mil indígenas foram resgatados para atendimento médico emergencial com quadros graves de desnutrição e malária.
A Fiocruz aponta que a crise é consequência de um longo processo de desestruturação do modo de vida tradicional do povo ianomâmi, agravado pela presença de mais de 20 mil garimpeiros na terra indígena. Relatório do governo federal aponta queda de 80% para 53% na cobertura vacinal dos indígenas, nos últimos quatro anos. A taxa de mortalidade entre bebês ianomâmis atingiu 114,3 para cada mil nascimentos em 2020, patamar 10 vezes maior que a média brasileira.
Santiago explica que a desnutrição avança para a idade adulta, porque as comunidades indígenas padecem da falta de água de qualidade e de saneamento básico. "Grande parte da população que vive na Terra Indígena Yanomami consome essa água contaminada com coliformes fecais, e isso provoca quadros de diarreia repetitivos, que fazem com que uma criança não se desenvolva da forma que a gente espera", diz ela.
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Anemia
A pesquisa da Fiocruz revelou situação de extrema gravidade entre as crianças menores de 5 anos em duas áreas ocupadas pelos ianomâmis: Awaris, no extremo norte de Roraima, e Maturacá, em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, em que, de 350 crianças avaliadas, 80% tinham déficit de estatura para a idade, 50% tinham déficit de peso por desnutrição aguda e 70% apresentaram diagnóstico de anemia.
Entre 2015 e 2018, a taxa de desnutrição infantil variou de 49,1% a 50%. O percentual mais baixo foi registrado em 2017: 47,4%.
Nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL), houve o maior aumento proporcional do número de crianças fora do peso ideal, que chegou à média de 54,5% das crianças. O ano de 2021 registrou o pior cenário, com 56,5% das crianças desnutridas: em números absolutos, das 4.245 crianças ianomâmis monitoradas, 1.269 estavam com peso baixo e 1.130 com peso muito baixo.
A dificuldade de acesso dos indígenas à água potável é uma das principais consequências do garimpo criminoso na região. Os indígenas adoecem porque o mercúrio dos garimpos (usado para separar o ouro das impurezas) contamina não só os rios, mas também os peixes, uma das principais fontes de proteína das comunidades, e o leite materno.
*Estagiária sob a supervisão de Vinicius Doria
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