Não foi desta vez que a Terra foi visitada por vida inteligente extraterrestre, afirmam três especialistas astronômicos e membros da Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) e da Rede Brasileira de Observação de Meteoros (Branom). Durante uma transmissão ao vivo, realizada na noite desta sexta-feira (11/11), o trio desvendou a origem das luzes vistas por pilotos de avião e cidadãos do Rio Grande do Sul na última semana.
No dia 4 de novembro, relatos de pilotos que voaram o céu de Porto Alegre (RS) viralizaram nas redes sociais por afirmarem ter visto luzes de objetos não identificados pelas torres de transmissão. Um dos chefes de cabine chegou a afirmar, ainda, que a luz o seguiu desde a decolagem, no Aeroporto de Confins.
A partir do primeiro avistamento, Marcelo Zurita, presidente da Associação Paraibana de Astronomia (APA) e membro da SAB; Carlos Jung, professor e chefe do Observatório Espacial Heller & Jung; e Gabriel Zaparolli, astrofotógrafo e membro da Rede Brasileira de Observação de Meteoros (Branom) analisam os vídeos e cruzam informações dos observatórios.
A constatação dos três é que nenhum dos vídeos compartilhados nas redes sociais ou cedidos a eles por meio dos que gravaram se trata de um objeto não identificado (OVNI) vindo de outro planeta, e sim de luzes refletidas por satélites que orbitam o local no momento em que o Sol atinge a parte brilhosa do objeto.
“A gente analisou muita imagem inclusive que não era satélite, era avião ou era erro da lente do aparelho que foi gravado. As imagens que conseguimos analisar nos levaram a concluir que são satélites. Sei que não agrada muita gente, porque a gente quer é o desconhecido. Mas o fato é que o trabalho sempre tem que ser pautado em fatos e na ciência”, explica Zurita.
Análise das luzes vistas no Sul utilizou cruzamento de dados
A análise dos especialistas foi composta de várias frentes. Os vídeos foram vistos e, por meio de informações sobre horário e direção em que o celular estava apontado, os especialistas consultaram os dados dos observatórios.
Além disso, o astrofotógrafo Zaparolli observou, diligentemente por dias a fio, o céu durante os horários do vídeo para captar novas imagens e percebeu que as luzes foram vistas nos mesmos locais e horários. “Achei estranho porque não sabia que OVNIs têm dia e horário definidos para aparecer”, brincou o especialista
“A quantidade de avistamentos por si só demonstra que não eram OVNIs de vida extraterreste, porque não pode haver esses supostos objetos voando em dias seguidos pelo céu. Não faz sentido”, acrescenta Jung.
Com o cruzamento das imagens com dados dos observatórios, foi possível encontrar grandes quantidades de satélites que orbitam pelo local no momento dos relatos, todos com capacidade e composição mecânica para refletir a luz do Sol naquele momento.
“São satélites chamados Starlinks da nova geração, lançados há pouco tempo. Estes novos modelos podem refletir muito mais a luz solar", explica Jung. De 13 satélites identificados no céu do Rio Grande do Sul na hora e data dos registros, doze são Starlinks.
“Os satélites são compostos no formato de L, a base e uma antena, com a parte de baixo, ou os fundos, refletem a luz do Sol na direção do estado”, detalha Zurita. O modelo de novos satélites também explicam o motivo pelo qual as luzes não foram avistadas em outros anos.
A previsão é que as luzes sejam vistas com frequência até 21 de dezembro, entre as 23h e 3h, quando a rotação da Terra coloca o hemisfério Sul mais próximo do Sol e também muda a “altitude” da órbita dos satélites mais próxima do horizonte da Terra e, assim, mais passíveis de refletir o Sol no céu do Rio Grande do Sul. Depois da data, o horizonte volta para o local regular e as luzes não serão mais vistas até o fim de fevereiro. “Esses reflexos serão vistos, depois, no hemisfério Norte, a partir que a rotação da Terra mude”, explica Zurita.
“É importante lembrar que não é apenas Porto Alegre que enxerga as luzes, isso pode ser observado praticamente em toda a Região Sul do Brasil, em todos os lugares que estão na mesma latitude, como outros países, por exemplo África e Austrália”, explica Zaparolli.
Pilotos podem não saber identificar satélites novos
Os especialistas também comentaram a afirmação de autoridades do Sul de que pilotos eram capazes de identificar satélites. Jung conta que por ser um objeto novo, com uma nova composição mecânica, o piloto pode não saber da existência e de que ele pode refletir a luz.
É possível, também, que os pilotos podem não ter sido treinados para identificar satélites. “Conhecemos um piloto que nos falou que não sabe como identificar tais objetos”, conta Zurita. Zaparolli também comentou que recebeu relatos do mesmo tipo. “Dois pilotos me mandaram mensagens no Instagram e falaram que no treinamento de piloto não receberam orientação para identificar satélites”, revela.
Jung ainda comentou que a afirmação do piloto de que a luz o seguiu desde Confins até Porto Alegre pode ser apenas uma impressão causada por regras de física. “Você já teve a impressão, quando tá andando de dia na rua, que o Sol está te acompanhando? Não é que ele tá te acompanhando, mas que ele está tão distante de nós que sempre o visualizamos como se estivéssemos perto. Eu acho que ele visualizou a luz desde Confins até pousar”, palpita.
Sobre os relatos de verem as luzes em espiral, Zurita afirmou que os dados do satélite mostram que os objetos orbitam próximos um do outro, o que pode ter causado uma ilusão de imagem. “A hipótese é que os satélites Starlinks estão bem próximos um do outro e fazem uma reflexão em movimento, mas na verdade é a luz refletida de cada um que, de longe, parecem formar um espiral. Não temos vídeos desses relatos, por isso não podemos dizer com certeza, mas é uma hipótese de acordo com o céu do local”, conclui.