Neste domingo (20/11) é comemorado o Dia da Consciência Negra. A data, que surgiu como uma forma de refletir sobre o valor e contribuição da comunidade negra para o Brasil, tem o papel de jogar luz sobre a resistência do povo negro e dar maior visibilidade à busca por igualdade, por direitos, e contra o racismo. Para entender o que envolve o movimento negro da atualidade, é necessário fazer um resgate histórico e falar sobre as raízes que envolvem essa luta.
O povo negro tem uma trajetória que começou muito antes da escravização, sendo alicerçada em território africano e formada por reis, rainhas, guerreiros e guerreiras de tribos que ali viviam. No Brasil, antes da chegada dos portugueses, estudos arqueológicos mostram que os primeiros habitantes eram indígenas. A chegada dos negros em solo brasileiro se confunde com a escravidão, uma vez que eles eram traficados da África para trabalharem, de forma forçada e desumana, para o império e os poderosos coloniais.
A escravidão no país começou por volta de 1530, quando os portugueses implantaram base no Brasil e, consequentemente, surgiram demandas de mão de obra. Os primeiros escravizados foram os indígenas, mas acabaram sendo substituídos pelos negros — estima-se que cerca de 4,8 milhões de africanos foram traficados para o Brasil durante todo o período que durou a escravidão.
Desde o início, essa exploração violenta da força de trabalho foi marcada pela resistência dos negros. “Essas pessoas são apagadas da história para que seja perpetuada a história branca e todos os privilégios que ela representa na sociedade. Conhecimento é poder, imagina se a população negra, que é maioria da população, mas não em espaços de poder e decisão, começa a conhecer a verdadeira história? Com certeza terão mais reivindicações, para ocupar, cada vez mais, espaços nos quais o povo negro não chega de forma proporcional. E não chega não por falta de vontade, inteligência ou talento, e sim por causa das barreiras impostas pelo racismo estrutural”, explica Luiza Mandela, mestra em Relações Étnico-Raciais.
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“Não veio do céu, nem das mãos de Isabel”
Ao longo dos mais de 300 anos de exploração dos africanos no Brasil, os escravizados se organizaram, de diversas formas, para resistir à escravidão e tentar fugir das senzalas. Uma personalidade muito conhecida por lutar pela libertação do povo contra o sistema escravista é Zumbi dos Palmares, um grande exemplo da batalha travada na época.
Zumbi foi líder do Quilombo dos Palmares, uma comunidade formada por escravizados negros que fugiam de fazendas, prisões e senzalas. O quilombo surgiu por volta de 1580 e, em pouco tempo, se tornou o maior do período colonial, ocupando uma área equivalente ao tamanho de Portugal e com mais de 30 mil habitantes.
Apesar do Dia da Consciência Negra ser na data que marca a morte de Zumbi, uma forma de homenagem e também de garantir que a história de resistência do povo negro não seja esquecida, antes dele outros guerreiros como Ganga Zumba, primeiro líder do Quilombo dos Palmares, foram cruciais para o percurso que resultou na abolição da escravatura. Depois dele, também tiveram outros nomes tão importantes quanto, mas que não são lembrados em livros de história ou estudados dentro de salas de aula.
“A invisibilização da história negra causa impactos na construção da identidade e da subjetividade das pessoas negras. Essas pessoas crescem não se vendo de forma positiva, acreditando que não têm uma história, se achando inferiores, incapazes. Essa narrativa, que favorece a história eurocêntrica, afeta a saúde mental da população preta. Crescemos não gostando de nós mesmos por acreditarmos que não somos potentes, não temos história, nem identidade e, com isso, somos adoecidos e precisamos recorrer a tratamentos terapêuticos, psiquiátricos. E sabemos que nem todas as pessoas negras têm acesso a esses serviços”, esclarece Mandela.
De acordo com a especialista, é necessário que a população conheça a história do povo negro, para que seja descentralizada a visão eurocêntrica do Brasil, afinal, assim como mostrou o samba-enredo da escola de samba Estação Primeira de Mangueira, campeã do carnaval carioca de 2019, a liberdade dos escravizados “não veio do céu, nem das mãos das mãos de Isabel”.
“Brasil, meu nego, deixa eu te contar a história que a história não conta, o avesso do mesmo lugar. Na luta é que a gente se encontra [...] Brasil, o teu nome é Dandara e a tua cara é de cariri [...] Salve os caboclos de julho, quem foi de aço nos anos de chumbo. Brasil, chegou a vez de ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês ”, diz a canção Histórias Para Ninar Gente Grande.
Em 13 de maio de 1888, a princesa imperial Isabel do Brasil assinou a Lei Áurea e decretou o fim da escravidão no Brasil. No ensino básico regular, livros de história e até no imaginário de muitos brasileiros, ela foi a “salvadora” dos escravizados, mas, a verdade, é que a abolição da escravatura não foi uma benfeitoria dos regentes do país na época, e sim resultado da pressão popular e do crescimento do movimento abolicionista.
Como cantou a Mangueira na maior festa popular do Brasil, no carnaval de 2019, a “liberdade é um dragão no mar de Aracati”. Nomes como Luís Gama, Luísa Mahin, José do Patrocínio, André Rebouças, Cosme Bento, Francisco José do Nascimento, José Luis Napoleão, Quintino de Lacerda, Aqualtune, Tereza de Benguela, entre muitos outros, foram negros, escravizados ou filhos de escravizados que, ao longo do tempo, tiveram expressiva participação no movimento que, verdadeiramente, contribuiu para a extinção da escravidão.
“O resgate da história de Dragão do Mar, José Luís Napoleão, José do Patrocínio, Luísa Mahin, Maria Felipa entre outras personalidades é de fundamental importância para que seja trazida a narrativa da luta negra , da construção da identidade positiva das crianças negras, e respeito às diferenças e a cultura afro brasileira e africana. Romper com o epistemicídio também faz parte da luta contra o racismo” afirma a professora Luiza Mandela.
Conheça personalidades importantes na luta pela liberdade do povo negro
Aqualtune
Aqualtune é uma das mais antigas líderes negras no Brasil e um dos maiores símbolos da batalha pela liberdade negra do regime escravocrata. Não se tem muitos registros que contam a história dela, nem se sabe exatamente onde nasceu e quem são seus pais, mas indícios históricos sugerem que ela teria nascido no século XVI (por volta de 1600), no Congo, na África Central, e teria uma linhagem real, sendo, possivelmente, filha de um rei do Congo.
A princesa Aqualtune foi uma guerreira africana que liderou cerca de 10 mil homens guerreiros que lutaram na Batalha de Ambuíla, contra o reino de Portugal, em 1665. O reino do Congo perdeu a guerra e, com isso, Aqualtune foi capturada e traficada para a então América Portuguesa, onde hoje fica o nordeste brasileiro.
Ao chegar no Brasil, a princesa congolesa foi escravizada e levada para uma fazenda localizada no atual estado de Alagoas, onde foi estuprada pelos donos da terra e colocada junto aos outros escravizados . No local, Aqualtune ouviu falar sobre a resistência negra que estava em curso no país, liderada por quilombos, e se junto a outros negros que, mais tarde, conseguiriam fugir da fazenda onde eram explorados.
Detentora de grandes conhecimentos políticos, organizacionais e de estratégia de guerra, Aqualtune foi fundamental para a consolidação da República de Palmares. Ela se tornou líder quilombola à frente de uma das moradias do Quilombo dos Palmares, se tornando mãe de Ganga Zumba, primeiro líder desse quilombo e mãe de Sabia, que, mais tarde, daria à luz a Zumbi dos Palmares.
Portanto, Aqualtune foi avó de Zumbi e, de acordo com alguns historiadores, teria morrido em 1677, durante um incêndio provocado por invasores do Quilombo dos Palmares. Apesar de ser pouco lembrada pelos livros e escolas brasileiras — que costumam citar apenas Zumbi dos Palmares como o principal líder negro da época —, a princesa do Congo foi uma figura muito importante para a história da população negra durante o Período Colonial e passou a ser símbolo de liderança e resistência contra a opressão da comunidade negra e uma personagem importante de luta das mulheres negras.
Tereza de Benguela
Assim como sugere seu nome, Tereza de Benguela teria nascido por volta de 1700, em Benguela, uma cidade em Angola, na África. Foi uma líder quilombola trazida como escravizada para o Brasil e liderou o Quilombo do Piolho, localizado no atual estado do Mato Grosso.
Tereza, assim como outros inúmeros escravizados do Brasil Colônia, fugiu da senzala onde era escravizada e, junto com o marido, José Piolho, se abrigou no quilombo que foi o maior de Mato Grosso. Historiadores acreditam que José tenha chefiado o Quilombo do Piolho até o início de 1750, quando foi assassinado.
Depois da morte do marido, até cerca de 1770, Tereza foi a rainha do quilombo e, sob seu comando, a comunidade negra da região resistiu à escravidão durante duas décadas. Do local, a chamada Rainha Tereza coordenou a comunidade que vivia do plantio e comandou a estrutura política e econômica do grupo. Ela também criou um sistema de defesa com armas, que contribuiu para a proteção do quilombo e resistência à escravidão.
Tereza morreu por volta de 1770. Em sua homenagem, foi criado o Dia Nacional de Tereza de Benguela, comemorado em 25 de julho. Essa mesma data é dedicada ao Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha. A mulher escravizada que virou rainha é um ícone da resistência negra no país e heroína do movimento de mulheres negras.
Nã Agontimé
Nascida no reino do Daomé no século XVIII, onde hoje fica Benim, na África, Nã Agontimé foi uma rainha africana, esposa do rei Agonglo. Após a morte do marido, a estabilidade do reino ficou abalada e um de dos filhos dela, Adandozan, tomou o trono, mesmo que o próximo rei, de acordo com as vontade de Agonglo, deveria ser o filho de Agontimé, o Gakpe.
Tremendo reação negativa à traição que cometeu, Adandozan, conhecido por ser um homem cruel, vende a madrasta, Agontimé, como escravizada. Depois disso, o paradeiro da rainha se perdeu, já que o novo rei ordenou aos compradores de escravizados que ela fosse rebatizada, justamente para que ninguém a encontrasse.
Por falta de registros históricos, não se sabe ao certo onde Agontimé viveu no Brasil, nem por quanto tempo. O rastro da rainha ficou perdido durante anos, até que, em 1948, um pesquisador francês Pierre Fatumbi Verger descobre vestígios de que ela conseguiu uma carta de alforria e foi uma das fundadoras da Casa da Minas em São Luiz do Maranhão.
No Brasil, Agontimé foi rebatizada como Maria Jesuína e foi pioneira na disseminação da religião de matriz africana em território brasileiro. A rainha criou o culto de tradição Ewe-Fon no país, cultuado na Casa da Minas, que, em africano, carrega o nome de Querebentã de Zomadonu e significa “Casa grande de Zomadonu”, em referência ao vodun protetor de Maria Jesuína.
Assim, o Maranhão é o único lugar das Américas onde se encontraram cultos às divindades ancestrais da realeza do Daomé, lugar onde nasceu Agontimé. Além disso, a Casa da Minas é o primeiro templo de tambor do Maranhão e serviu de modelo para a instalação de outras no Norte e Nordeste do Brasil, bem como para a implementação de outros centros de religião africana em todo território brasileiro.
Cosme Bento
Negro Cosme, como ficou conhecido o líder quilombola Cosme Bento, liderou uma das maiores revoltas de escravizados do Maranhão, a Balaiada. Nascido escravizado entre 1800 e 1802, em Sobral, no Ceará, onde conseguiu alforria.
Em 1830, pouco depois de chegar ao Maranhão, foi preso por assassinato e, em 1833, conseguiu fugir da cadeira. A partir de então, passou a promover uma vasta rebelião de negros em vários pontos de trabalho escravizado da região. Para não ser pego, Negro Comes se escondia em diversos quilombos e ajudava escravizados a se libertarem da opressão de seus exploradores.
Negro Cosme também foi responsável por criar o maior quilombo da história do Maranhão, a fazenda Tocanguira, localizada no município de Itapecuru-Mirim, interior do estado. No local, oferecia auxílio a todos que apoiavam a luta contra o escravismo e ficou conhecido como defensor da liberdade.
O objetivo dele era criar uma outra visão de liberdade e igualdade entre os homens, buscando a insurreição contra à escravatura, em favor da liberdade. Ele foi mais que um líder entre os balaios, sendo considerado o chefe da revolta negra maranhense.
Luísa Mahin
Uma das principais responsáveis por todas as revoltas de escravizados na Bahia. Luísa Mahin nasceu, provavelmente, em 1812, em Costa da Mina, na África, e foi traficada como escravizada para o Brasil.
Ela comprou alforria e se tornou quituteira em Salvador, onde teve um filho, o abolicionista Luis Gama. Luísa esteve envolvida na articulação de todas as revoltas e levantes de escravizados que sacudiram a então Província da Bahia nas primeiras décadas do século XIX.
Luisa ajudava com a distribuição de mensagens codificadas, em árabe, por meio dos meninos que fingiam comprar seus quitutes. Essas mensagens continham informações relevantes para a resistência dos escravizados e os movimentos que contribuíam para a libertação deles. Desse modo, esteve envolvida na Revolta dos Malês e na Sabinada.
A ex-escravizada transformou sua casa no quartel general das revoltas de escravizados e, caso o levante dos malês tivesse sido vitorioso, Luísa teria sido reconhecida como Rainha da Bahia.
Luís Gama
Filho de Luísa Mahin, Luís Gama foi um dos principais nomes do movimento abolicionista no Brasil. Nasceu em 1830, em Salvador, e mesmo sendo filho de pai branco e mãe negra liberta, foi escravizado aos 10 anos de idade.
Permaneceu analfabeto até os 17 anos, quando passou a estudar e, mais tarde, conquistou na justiça a própria liberdade. Depois disso, passou a advogar em defesa dos escravizados e, aos 29 anos, já era considerado o maior abolicionista do Brasil e o único a ter sido escravizado.
Toda a vida de Luís Gama foi pautada pela abolição da escravatura e fim da monarquia no Brasil. Ele escreveu também artigos para jornais da época, sempre sobre assuntos sociorraciais do Brasil Imperial.
Além de ajudar escravizados libertos a conseguirem empregos e defender judicialmente os escravizados acusados de crimes, a principal atuação de Gama em prol da abolição da escravatura foi nos tribunais. Em 1880, em uma carta autobiográfica enviada ao amigo Lúcio de Mendonça, o abolicionista revela que já havia libertado do cativeiro mais de 500 escravizados .
Gama também é conhecido pela maior ação coletiva de libertação de escravizados conhecida nas Américas, quando conseguiu a liberdade de 217 escravizados . É dele a célebre frase “o escravo que mata o senhor, seja em que circunstância for, mata sempre em legítima defesa”, proclamada durante um júri.
André Rebouças
André Rebouças foi um engenheiro, inventor e abolicionista brasileiro. Ele é considerado um dos mais importantes articuladores do movimento abolicionista e trabalhou pelo desenvolvimento de territórios africanos.
Nascido 50 anos antes da abolição da escravatura, em 1838, ele era filho de mãe escravizada e um alfaiate português. Diferente de muitos negros de sua época, Rebouças teve a oportunidade de estudar desde muito jovem e ingressou na Escola Militar do Rio de Janeiro, onde se tornou 2º tenente.
Ao lado de nomes importantes na história do Brasil, como Machado de Assis, o engenheiro foi um dos representantes da pequena classe média negra em ascensão no Segundo Reinado. Ele ajudou a criar a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão, e participou também da Confederação Abolicionista.
André trabalhou também ao lado de Luís Gama no movimento em busca da liberdade da comunidade negra. Com os movimentos abolicionistas crescendo, pela atuação de nomes como Rebouças e Gama, e a pressão social contra o Império cada vez mais forte, em 1888 a escravidão é extinta no Brasil, sendo o último país das Américas a acabar com a exploração do povo negro.
Quintino de Lacerda
Ex-escravizado, Quintino de Lacerda se tornou um herói abolicionista. Ele foi líder do Quilombo do Jabaquara, em São Paulo, além de ter se tornado o primeiro vereador negro do Brasil e receber a patente de Major honorário do Exército Nacional.
Lacerda foi o primeiro líder político negra de Santos, no litoral paulistano, considerado o mais atuante fomentador da abolição na região e participou ativamente de grandes eventos nacionais, como a Revolta Armada e o processo de desestruturação do sistema escravista no Brasil.
O político nasceu escravizado, em 1855, em Sergipe, e se afeiçoou à família para a qual foi vendido e da qual herdou o sobrenome. Depois de oito anos de serviço, ele conquistou a carta de alforria e se juntou ao movimento contra a escravidão, se tornando, nas duas últimas décadas do século XIX no Brasil, uma figura central nos movimentos sociais e debates políticos.
Além de lutar pela extinção do sistema escravista, após a promulgação da Lei Áurea, Quintino, enquanto capitão do Exército, organizou um batalhão com o objetivo de derrubar o trono brasileiro. Sendo assim, o abolicionista foi também uma figura importante para a proclamação da República.
Francisco José do Nascimento
“Liberdade é um dragão no mar de Aracati”, assim é retratado Francisco José do Nascimento no samba-enredo da Mangueira, em 2019. Conhecido como Dragão do Mar, o líder jangadeiro nasceu em 1839, em Aracati, município do Ceará.
Antiescravista, o Dragão do Mar teve participação ativa no Movimento Abolicionista no Ceará, que foi o primeiro estado brasileiro a abolir a escravidão e, por isso, ficou conhecido como Terra da Luz.
Desde 2017 reconhecido, oficialmente, como Herói da Pátria, o líder se juntou à luta contra a escravidão em 1881 quando se recusou a transpostar escravizados para os navios negreiros que saíam do litoral cearense com o objetivo de vender essas pessoas no Rio de Janeiro. Esse movimento foi chamado de Greve dos Jangadeiros e resultou na abolição da escravatura no Ceará, sendo também decisivo para que a liberdade do povo negro fosse implantada no Brasil por meio da Lei Áurea.
Em 1884, Dragão do Mar foi homenageado na capa da Revista Illustrada, importante periódico abolicionista da época. “À testa dos jangadeiros cearenses, Nascimento impede o tráfico dos escravizados da província do Ceará vendidos para o sul”, noticiou a revista.
Francisco José do Nascimento é, até os dias atuais, símbolo da resistência popular cearense contra a escravidão. Ele também foi homenageado pelo governo do Ceará, com seu nome dado ao Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, pelo que ele e os outros jangadeiros realizaram em nome da liberdade da comunidade negra.
José do Patrocínio
Outra figura importante nos momentos decisivos do movimento abolicionista, que conquistou o fim da escravidão. José do Patrocínio foi um farmacêutico, jornalista, escritor, orador e ativista político brasileiro.
Em 1879, iniciou a campanha pela abolição da escravatura no Brasil e entrou para a Associação Central Emancipadora. Em em 1880, juntamente com Joaquim Nabuco, fundou a Sociedade Brasileira Contra a Escravidão. Além disso, ele teve uma forte atuação como jornalista com artigos contra a escravidão em periódicos da época, Patrocínio também preparou e auxiliou a fuga de escravizados e coordenou campanhas de angariação de fundos para adquirir alforrias, com a promoção de espetáculos ao vivo, comícios em teatros, manifestações em praça pública.
Patrocínio também participou da Maçonaria, atuando no processo de emancipação do trabalho escravizado, defendendo o fim da escravidão a partir de discussões no Parlamento, de debates entre a elite branca e da defesa de uma abolição da escravatura, por intermédio da Sociedade Brasileira contra a Escravidão.
Os guerreiros e guerreiras da atualidade
134 anos depois da Lei Áurea e da árdua história dos negros em busca da própria emancipação, o Brasil ainda vive um desafio. Muito por conta da invisibilização histórica da comunidade negra no processo de abolição da escravatura, o povo negro ainda é muito associado à escravidão e vítima de um racismo estrutural.
“São muitos anos com essa associação da negritude à escravidão, mas outras histórias já estão sendo contadas. Para avançarmos precisamos estudar, para conhecermos mais a verdadeira história do povo negro, que não começou na escravidão”, destaca Luiza Mandela, mestra em Relações Étnico-Raciais.
Assim como antes de 1888 ou durante os anos seguinte à abolição, os negros lutaram e seguem lutando por direitos, igualdade e para que a história de resistência dos cerca de 500 anos desde a chegada dos primeiros negros africanos no Brasil não seja apagada. “Essas personalidades que resistiram e lutaram contra a escravidão pavimentaram o chão para que pudéssemos estar aqui vivos e resistindo, apesar de, infelizmente, o negro ainda ser o que mais morre diariamente no Brasil, sendo um a cada 23 minutos”, lamentou Mandela.
O movimento negro segue contando com nomes importantes e que são essenciais para toda e qualquer conquista dessa comunidade. Afinal, desde que o Brasil é Brasil, os direitos da população negra foram adquiridos a partir da luta travada com as próprias mãos.
Podemos destacar na história mais recente personalidades como Ruth de Souza, atriz e a primeira grande referência para artistas negros na televisão; Antonieta de Barros, jornalista, uma das primeiras mulheres eleitas no Brasil e a primeira negra brasileira a assumir um mandato popular; Conceição Evaristo, escritora e uma das mais influentes literatas do movimento pós-modernista no Brasil; Katiuscia Ribeiro, filósofa e um dos principais nomes da atualidade responsáveis por disseminar o conhecimento acerca da ancestralidade; e Abdias do Nascimento, ator e um dos maiores expoentes da cultura negra e dos direitos humanos no Brasil, tendo recebido o Nobel da Paz em 2010.
“Eu destaco nomes importantes que me inspiram a continuar no caminho da luta contra o racismo, como Christina Ramos (minha mãe e militante do Movimento Negro), Nilma Lino Gomes, Conceição Evaristo, Joana Oscar, Ricardo Jaheem, Bárbara Carine, Roberto Borges, Jurema Werneck, entre tantos outros nomes fundamentais, que precisamos conhecer”, destaca a mestra em Relações Étnico-Raciais.
Por mais que, ao longo dos anos, o povo negro tenha conseguido alguns avanços, como as Cotas Raciais, as leis Afonso Arinos e Caó, que proíbem a discriminação racial e tipificam o crime de racismo, ou a Lei 11645/08, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afrobrasileira e africana em todas as escolas públicas e particulares do ensino fundamental até o ensino médio, ainda há muito o que progredir.
Para isso, Luíza Mandela ressalta que é importante garantir que essas leis sejam aplicadas, principalmente a que determina o ensino da cultura afro nas escolas, “para que a história de resistência, potência e beleza da população negra e indígena seja contada nas escolas, universidades, imprensa e em todos os espaços”. “Mas, para isso, precisamos ter letramento racial e estudar para sairmos da visão eurocêntrica e reducionista que nos foi ensinada”, conclui.
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