meio ambiente

ONU cobra ação do Brasil para frear emissão de gases de efeito estufa

Relatório das Nações Unidas aponta o fracasso das medidas de contenção da temperatura do planeta. País segue na contramão dos esforços para frear o aquecimento global, mas governo promete levar "soluções" à COP-27, no Egito

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) divulgou, ontem, o relatório Lacuna de Emissões 2022, que avalia anualmente os esforços dos países para reduzir a emissão de gases de efeito estufa. O documento destaca que a previsão de aquecimento da temperatura do planeta quase dobrou e que os países fracassaram em cumprir metas de redução de carbono.

O levantamento foi anunciado pela ONU duas semanas antes da abertura da 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas — COP 27, que ocorrerá em Sharm el-Sheikh, no Egito. O relatório traz um resumo dos últimos compromissos dos países signatários do Acordo de Paris. O pacto firmado entre 195 países busca limitar, até o final do século, o aumento médio da temperatura global em menos de 2°C em relação ao período pré-industrial. Mantidas as políticas climáticas atualmente em curso, a temperatura deve subir 2.8ºC (na comparação com a média pré-industrial).

Para a ONU, o Brasil seguiu na direção oposta: diminuiu, em 2020, a ambição de reduzir emissões de gases de efeito estufa. O país é considerado um ator importante na batalha para evitar a catástrofe climática, diante do peso do desmatamento da Amazônia na alta de emissões. Especialistas apontam que manter a floresta em pé é uma das medidas mais viáveis para conter rapidamente as mudanças climáticas sem a necessidade de investimentos gigantescos ou perdas de Produto Interno Bruto (PIB). Isso porque as atividades que levam à destruição da floresta, como o garimpo ilegal ou a venda irregular de madeira, são pouco relevantes para a balança comercial brasileira.

Nos últimos anos, porém, o bioma tem visto uma escalada das taxas de devastação e dos incêndios, o que fez o governo Jair Bolsonaro ser alvo de cobrança interna e no exterior. Representantes do mercado estrangeiro também ameaçam impor sanções aos produtos do agronegócio brasileiro ou exigir certificados de origem limpa como forma de pressionar pela queda no desmate.

O relatório do Pnuma exemplifica e detalha o tamanho do problema e sugere saídas para evitar a catástrofe climática. Um dos pontos críticos é a defasagem entre o que os países se comprometeram a fazer e o que estão fazendo de fato. Desde a Cúpula do Clima (COP-26), em Glasgow (Escócia), no ano passado, os compromissos voluntários assumidos pelas nações para cortar emissões foram responsáveis pela remoção de apenas meia gigatonelada de dióxido de carbono equivalente (CO2e) da atmosfera, menos de 1% das emissões que devem ser lançadas em 2030, data limite para que países como o Brasil e os Estados Unidos cortem pela metade suas emissões. A União Europeia tem meta de diminuir 55%.

Conforme o Pnuma, a maior parte dos países do G-20 começou recentemente a implementar seus planos de reduções. Coletivamente, é esperado que a meta não seja atingida sem uma mudança expressiva de rumo. Para a agência, a crise climática exige uma rápida transformação das sociedades nos setores de fornecimento de eletricidade, da indústria, do transporte, de construção, alimentos e finanças. O organismo salienta que a única maneira de limitar os piores impactos da crise climática é uma "rápida transformação da sociedade".

"A tendência de queda nas emissões esperada para 2030 mostra que as nações fizeram algum progresso neste ano", disse Simon Stiell, secretário-executivo da agência da ONU para Mudanças Climáticas. Na COP-26, os Estados-Membros concordaram em elevar a metas. No entanto, a agência estima que mesmo que as atuais ações fossem cumpridas integralmente até 2030, ainda resultariam em um aumento no aquecimento global de 2,5°C. Cientistas alertam que o aumento de 1°C já tem causado grandes desastres climáticos, como queimadas, inundações e tempestades.

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Glasgow

O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, chegou a afirmar, neste mês, que o Brasil levará parte da solução para a crise energética que o mundo vive à COP-27. "Temos a possibilidade de mostrar um Brasil real, mais sustentável, especialmente em relação às energias. Essa conferência vai olhar muito para a energia, que é um desafio global com a crise energética que está ocorrendo. Nossa energia está sendo olhada pelos outros países como uma oportunidade de investimento. O que temos desenhado como estratégia é levar o Brasil às energias verdes e às oportunidades de consumo dessa energia", disse o ministro.

No ano passado, em Glasgow, o Brasil anunciou o compromisso de mitigar 50% de suas emissões de gases de efeito estufa até 2030. No documento Diretrizes para uma Estratégia Nacional para Neutralidade Climática, divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente, foram estabelecidas novas metas intermediárias, como a de reduzir o desmatamento ilegal, a partir de 2022, em 15% ao ano até 2024; 40% em 2025 e 2026; e pela metade em 2027, até atingir o compromisso de zerar o desmatamento ilegal em 2028.

Espera-se que uma transformação global para uma economia de baixo carbono exija investimentos de, pelo menos, US$ 4 trilhões a US$ 6 trilhões por ano. Esta é uma parcela relativamente pequena (1,5% a 2%) do total de ativos financeiros administrados, diz o relatório, mas ainda assim mobilizar esses recursos exigirá mudanças fundamentais no mercado financeiro global.

Há alguns avanços em curso. Em relatório publicado nesta semana, a Agência Internacional de Energia afirmou que os investimentos em energia limpa atingiram US$ 1,3 trilhão — superando o montante reservado para combustíveis fósseis, que receberam cerca de US$ 1 trilhão.