As recentes decisões governamentais e judiciais restringindo o uso de sacolas plásticas por estabelecimentos comerciais chamaram a atenção sobre o impacto desses produtos ao meio ambiente. Essa não é uma preocupação apenas brasileira. A substituição de plástico por materiais menos nocivos é uma tendência mundial. O último relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) discutido em assembleia da ONU, em março deste ano, indica que a poluição plástica é uma ameaça crescente em todos os ecossistemas. O levantamento aponta que a contaminação por plástico é pior nos meios aquáticos, cresceu consideravelmente nos últimos anos e deve dobrar até 2030.
Hoje, o plástico representa 85% dos resíduos que chegam aos oceanos, sendo que a projeção, se nada for feito, é de o volume triplicar até 2040, atingindo a faixa de 23 a 37 milhões de toneladas. Isso significa que, a cada metro de costa marítima do planeta, haverá cerca de 50 quilos de plástico. Por exemplo, a distância de João Pessoa (PB) a Lisboa, em Portugal, é de 5.745km, portanto, entre as duas cidades, serão esperados cerca de 287 mil quilos de resíduos no oceano.
No Brasil, de acordo com diagnóstico elaborado pelo programa Lixo Fora D'Água, da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), resíduos plásticos correspondem a 48,5% dos materiais que vazam para o litoral. Segundo o biólogo marinho do Instituto AquaRio, Rafael Franco, além de fazer mal aos animais dos oceanos, o lixo plástico tem consequências danosas para a sociedade humana e a dinâmica do planeta.
Franco explica que é necessário diferenciar macro e microplástico. O primeiro é visível, como sacolas e embalagens que podem tanto provocar intoxicação gástrica em animais marinhos, se forem ingeridos, ou sufocá-los, se eles forem envoltos pelo material. "Tartarugas marinhas, por exemplo, podem confundir sacolas plásticas com algas, das quais se alimentam", observa.
Já o microplástico é um tipo de material invisível a olho nu, cujo maior problema é a chamada bioacumulação. Segundo Franco, vários estudos mostram concentração de microplástico em órgãos e tecidos humanos devido à ingestão indireta por meio de alimentos vindos do mar. "O microplástico é um problema silencioso. Já se fala que, hoje, há mais microplástico do que peixes no oceano", alerta o pesquisador do AquaRio.
Rafael Franco salienta que alternativas ao plástico vem sendo pensadas há muitos anos. A indústria de sacolas e embalagens, por exemplo, vem trabalhando com materiais menos nocivos, como fibra de coco e casca de macaxeira, que são biodegradáveis. Porém, o biólogo pondera que o ideal seria a mudança cultural da população a respeito do problema casado ao planeta pela utilização massiva de materiais descartáveis.
"Vivemos um momento de transformação do debate a respeito da natureza, em que a pauta está se popularizando. O primeiro passo é falar sobre o problema, mas falta ainda definir o que podemos fazer", afirma Franco. "Com a proibição de sacolas plásticas, e a obrigatoriedade de utilizar materiais biodegradáveis, já partimos para uma discussão de política pública. Mas, ainda estamos muito atrás de outros países. Precisamos amarrar uma política eficiente para mudar a cabeça da população", emenda.
Soluções
No Distrito Federal, desde agosto, vigora norma que veda a oferta de sacolas plásticas nos supermercados. Sandra Machado, de 52 anos, administra uma padaria artesanal na Asa Norte e aderiu à proibição, mas se queixa do "mau costume" de alguns consumidores e relata que nem todos reagiram bem à mudança. "Sempre têm aqueles que olham meio estranho quando não damos sacolas. No começo, vimos vários clientes reclamando, dizendo que a proibição era desnecessária. Tem uns conscientes, mas a maioria não traz nada de casa e sempre pede a 'sacolinha'. Acho que é cultural, tem gente que pede até duas para levar apenas um pão. Eu não entendo."
É o que indica também David Silva, de 19 anos, morador de Riacho Fundo. O jovem apoia a não utilização de sacolas plásticas, no entanto, estranha que os mercados continuem oferecendo esse tipo de produto. "Acho que não é tão eficiente, porque as pessoas continuam consumindo em vez de preservar as sacolas. Alguns levam bolsas ecológicas e vejo isso com muitos bons olhos. Acho que devemos incentivar cada vez mais", pontuou o jovem.
Izabel Janeti, professora do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília, ressalta que, para desassociar a tradição de acúmulo de lixo, é essencial que a população "ponha a mão na consciência". "É cultural, pois as pessoas pedem um monte de sacolas que poderiam não ser utilizadas. Então, também é preciso, em paralelo à legislação que está em vigor, uma reeducação da população, para que a sociedade brasileira entenda que o excesso de lixo, principalmente plástico, contaminam o solo, os lençóis freáticos, e que isso retorna como malefício a todos."
Segundo a especialista, as leis que obrigam o uso de sacolas biodegradáveis, mandam uma mensagem à indústria para desenvolver novos produtos que se enquadrem na demanda legal brasileira. "Caso os comerciantes cobrem algum valor por sacolas e isso ganhe um volume significante, os consumidores terão que adotar novos hábitos, como as sacolas reutilizáveis, as "ecobags", entre tantas outras inovações que o mercado é capaz de produzir", argumenta.
"O Brasil produz materiais biodegradáveis, mas em pequena escala, por isso eles ainda são caros para os varejistas e consumidores. Para mudar essa realidade, é preciso investir em tecnologia limpa, na inovação desses compostos biodegradáveis. Só assim vai baratear o custo para a população", completa.
*Estagiário sob a supervisão de Odail Figueiredo