tragédia

Criança mata cunhado em acidente com arma

O menino de 8 anos voltava da escola quando achou a pistola do corretor de imóveis Wanderson dos Santos no banco de trás do carro. O disparo atingiu a cabeça do motorista, que morreu antes de ser atendido

Tainá Andrade
postado em 10/08/2022 00:01
 (crédito: Reprodução / Tv Vanguarda)
(crédito: Reprodução / Tv Vanguarda)

Foi enterrado, ontem, no Cemitério Memorial do Vale, em Jacareí, no interior de São Paulo, o corpo do corretor de imóveis Wanderson dos Santos, de 27 anos, atingido na cabeça, um dia antes, por um tiro de pistola automática disparado pelo cunhado, uma criança de 8 anos de idade. Wanderson havia buscado o filho, de 5 anos, e o cunhado na escola para levá-los para casa. O mais velho encontrou a arma no banco de trás do carro e a manuseou por curiosidade. A pistola, de propriedade do corretor, estava carregada com 12 projéteis e estava com a documentação em dia.

Wanderson tinha a licença de colecionador, atirador esportivo e caçador (CAC) em dia, de acordo com informações da Polícia Civil de São Paulo. Wanderson morreu antes de o socorro chegar. O filho dele, que assistiu a tudo, foi ao enterro do pai, em companhia da mãe, Andréia Carollini dos Santos, e do irmão mais novo, de 2 anos.

A família participava ativamente de uma comunidade evangélica da cidade, no Vale do Paraíba. A viúva disse que não aprovava o hobbie do marido, mas não se queixava porque não queria contrariá-lo. Wanderson havia feito curso de tiro e, de acordo com Andréia, tomava muito cuidado com a arma. "Ele era cuidadoso, nunca deixava (a pistola) onde as crianças pudessem alcançar. Não sei mesmo o que pode ter acontecido. Talvez um descuido", lamentou.

Civis armados

De acordo com dados levantados pelo Instituto Sou da Paz, entre 2020 e 2021 a quantidade de CACs regularizados no país saltou de 626,6 mil para pouco mais de 1 milhão, um aumento de 73%. Só no ano passado, os novos registros somaram 388,1 mil — aumento de 78% em relação a 2020. É o maior número já registrado de civis armados legalmente.

O crescimento reflete a flexibilização das normas para aquisição, posse e porte de armas promovida pelo governo federal. De janeiro de 2019 a abril deste ano, foram editados aproximadamente 40 atos normativos, entre decretos, portarias e resoluções, para facilitar o acesso a armas de fogo no Brasil.

Para a diretora executiva da entidade, Carolina Ricardo, a campanha pró-armas do governo federal, em conjunto com as mudanças constantes das regras, aumentou o interesse da população em buscar nas armas um instrumento de autodefesa, desvirtuando as características originais dos CACs (uso para caça, tiro esportivo e coleção).

"É um fato com um desfecho fatal de um cidadão de bem. Casos como esse acabam sendo incentivados por esse mar de decretos e portarias que cria muita insegurança jurídica. É muito confuso, e é proposital, porque o objetivo de tornar a legislação confusa é, justamente, facilitar o descontrole e a fiscalização por parte das polícias, sobretudo as federais", criticou a diretora executiva da ONG.

Ela aponta dois agravantes: o aumento da quantidade e de tipos de armas, e o afrouxamento da fiscalização como consequência da redução de investimentos que deveriam ser destinados à atividade por parte dos órgãos responsáveis.

"Junto com tudo isso, ocorre a banalização e a deslegitimação da arma, ou seja, há um discurso pregado pelo presidente (da República, Jair Bolsonaro) de 'use a arma como bem quiser porque é a sua liberdade'. Há uma autorização tácita para usar a arma, mas o cidadão é de bem até deixar de ser. É um risco que a gente passa a correr com as medidas que vieram para facilitar (o acesso às armas)", analisa.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Tags