Pandemia debilitou princípios do ECA

Correio Braziliense
postado em 14/07/2022 00:01

Visto como um divisor de águas na proteção às crianças e adolescentes, o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) completou, ontem, 32 anos. Mas especialistas alertam que uma boa parte dos avanços conquistados desde que o novo ordenamento jurídico foi implementado sofreu influência da pandemia e da consequente crise econômica — advertem que ficaram mais difíceis o acesso à alimentação e à educação.

Fernanda Martins, professora do Departamento de Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de Minas (PUC-MG), acompanhou famílias carentes durante a crise causada pela covid-19. E compilou em um estudo as observações dos impactos da crise sanitária nas crianças e nos adolescentes, sobretudo na garantia dos direitos básicos. "As crianças perderam o ano escolar, sentiram fome, passaram por esse contexto de insegurança alimentar", relembrou.

Ela observa que a maior parte das crianças e adolescentes não tinha acesso à internet e muito menos ao computador para acompanhar as aulas lecionadas pelo ambiente virtual. "A grande maioria das crianças não concluiu o ano escolar. Não abandonou porque tentou, mas as condições não foram favoráveis. Porque onde não se tem o que comer, pouco vai se ter recursos para pagar internet", salienta.

Segundo Fernanda, "a pandemia deixou sequelas de pobreza (entre crianças e adolescentes). Aquilo que é básico infelizmente foi violado na pandemia. O direito mais básico, que é o nutricional, o direito ao alimento, foi violado", alerta.

De acordo com Elisa Cruz, professora de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e defensora pública, há um longo caminho para a recuperação socioeducativa das crianças prejudicadas pela pandemia. Ela aponta que o caminho é por meio de políticas públicas sólidas, voltadas para os menores em maior vulnerabilidade social.

"Crianças de classes mais empobrecidas ou de grupos com maior vulnerabilidade têm desafios muito maiores, e precisarão de uma intervenção muito forte do poder público. A gente vai precisar de políticas públicas muito intensas para recuperar o eventual atraso", observa.

Novo paradigma

Publicado em 13 de julho de 1990, o ECA substituiu o Código de Menores, cujo viés não era de proteção e educação, mas de punição. "A legislação passou a considerar crianças e adolescentes como pessoas em desenvolvimento, dando a elas importância na sociedade", explicou o advogado Philipe Cardoso.

De acordo com Ariel de Castro Alves, advogado especialista em direitos humanos e membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, o grande avanço do ECA foi dar visibilidade às crianças e adolescentes diante da sociedade e do Estado. "No caso de crianças e adolescentes em situação de rua, de abandono, vítimas de violência, quem passa a estar em situação irregular é a família, o Estado e toda a sociedade, que não as protegeram integralmente. Essa é a grande mudança introduzida pelo estatuto", aponta.

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