Trinta e dois líderes indígenas e quatro servidores públicos que trabalham com comunidades indígenas receberam ameaças de morte em 2021, segundo um relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
O relatório foi divulgado em 18 de abril, dias antes de o servidor da Funai (Fundação Nacional do Índio) Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips desaparecerem após uma viagem até os limites da Terra Indígena Vale do Javari, no Amazonas.
Segundo a Univaja (União dos Povos Indígenas do Vale do Javari), principal associação indígena da região, Pereira e indígenas da entidade vinham sofrendo ameaças por tentar coibir invasões ao território por quadrilhas de caçadores, pescadores e garimpeiros.
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O relatório da CPT aponta que o número de ameaças de morte contra indígenas e aliados teve alta de 28% em 2021 em relação ao ano anterior, quando houve 25 casos.
Em 2019, foram 39 ameaças.
Ligada à Igreja Católica, a CPT publica desde 2012 relatórios com dados sobre a violência no campo.
Os índices, porém, tendem a ser subnotificados, já que nem todos os casos chegam à entidade. Não estavam na lista, por exemplo, as ameaças sofridas por indígenas do Vale do Javari.
No último documento, a organização aponta que 10 indígenas foram assassinados em conflitos por terras em 2021. Em 2020, foram sete.
O relatório foi compartilhado com o Ministério Público e órgãos policiais para a tomada de providências.
A BBC News Brasil lista ao fim deste texto os nomes dos indígenas que sofreram ameaças de morte em 2021.
Invasões no Vale do Javari
Também vinculado à Igreja, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) deu grande destaque ao Vale do Javari em seu último relatório Violência contra os Povos Indígenas do Brasil, com dados de 2020.
O relatório aponta que, em 2020, houve no país 263 casos de "invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio indígena", alta de 2,7% em relação a 2019.
O Amazonas, onde fica o Vale do Javari, foi o Estado com maior número de ocorrências desse tipo: 53.
Só na Terra Indígena Vale do Javari, o relatório do Cimi citou oito casos de invasões por caçadores, pescadores, garimpeiros e missionários, denunciadas a órgãos como a Funai e o Ministério Público Federal (MPF).
A BBC questionou os dois órgãos se alguma providência foi tomada após as denúncias, mas não houve resposta até a publicação desta reportagem.
Num dos casos citados no relatório, a Associação dos Kanamari do Vale do Javari (Akajava) denunciou ao MPF a presença de caçadores e pescadores ilegais no rio Itaquaí - o mesmo por onde Bruno Pereira e Dom Phillips viajavam quando desapareceram.
Em outro caso, a Organização das Aldeias Marubo do Rio Ituí (Oami) denunciou à Funai a presença de caçadores e pescadores que "praticam a captura de ovos de tracajás nas praias do rio Ituí".
Segundo os indígenas, a invasão do rio ocorreu apesar da presença, na época, da Força Nacional de Segurança na Base de Proteção Etnoambiental da Funai no rio Ituí. Isso porque, segundo os indígenas, os membros da força "apenas cuidam dos servidores e da estrutura da base, mas não realizam fiscalização ambiental no território".
Outra denúncia, também apresentada ao MPF, continha "fotos tiradas pelas lideranças e agentes ambientais indígenas numa expedição de fiscalização realizada por eles entre a boca do rio Negro e a Base de Proteção Etnoambiental Ituí/Itaquaí da Funai".
As fotos, segundo o relatório, mostravam tracajás apreendidos por caçadores, recipientes de gasolina abandonados pelos invasores, palhas usadas como forro para salgar carne e ossos de animais abatidos.
"As lideranças, no ofício apresentado, manifestam sua preocupação com a ineficiência das ações de fiscalização do governo na área, desenvolvidas por pessoas sem a necessária experiência e conhecimento da região, incapazes de encontrar os invasores e os vestígios por eles deixados", diz o relatório.
Segundo o Cimi, os conflitos ligados a direitos territoriais mais do que dobraram em 2020 em comparação com 2019: foram 96 casos em 2020 e 35 em 2019.
O órgão diz que o discurso do presidente Jair Bolsonaro "favorável à exploração predatória das terras indígenas e à mineração dentro destes territórios" e ações do governo federal vêm incentivando os ataques aos territórios indígenas.
Indígenas e aliados ameaçados
A seguir, a lista de indígenas e aliados que sofreram ameaças de morte em 2021, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT):
Manaus (AM) - Aldeia Tsetsu Davi/BR-174 - Data da ameaça: 05/12/2021 - Um cacique não identificado
Paulo Afonso (BA) - Indígenas Truká Tupã - 14/10/2021 - Vice Cacique Adriano Rodrigues
Paulo Afonso (BA) - Indígenas Truká Tupã - 14/10/2021 - Cacica Maria Erineide
Una (BA) - Aldeia Cajueiro/Terra Indígena Tupinambá de Olivença - 01/08/2021 - Cacique Val
Comodoro (MT) - Terra Indígena Kawahiva do Rio Pardo - 06/12/2021 - Funcionário público não identificado
Aral Moreira (MS) - Acampamento Tekoha Guaiviry/MS-386 - 16/03/2021 - Três indígenas não identificados
São Joaquim de Bicas (BA) - Mata do Japonês/Pataxó e Pataxó Hã-hã-hãe - 10/06/2021 - 20 indígenas Pataxó e Pataxó Hã-hã-hãe não identificados
Jatobá (PE) - Comunidade Bem Querer de Baixo/Terra Indígena Pankararu - 31/12/2021 - Pajé Jaguriça ou Washington Tenório
Jatobá (PE) Comunidade Bem Querer de Baixo/Terra Indígena Pankararu - 31/12/2021 - Cacica ValdenúziaTenório
Jatobá (PE) - Comunidade Bem Querer de Baixo/Terra Indígena Pankararu - 31/12/2021 - Elúzia
Cacoal (RO) - Terra Indígena Sete de Setembro - 08/12/2021 - Txai Suruí
Mucajaí (RR) - Terra Indígena Yanomami/Apiauí/Papiu/Yawaripé - Três funcionários públicos não identificados
Uiramutã (RR) - Terra Indígena Raposa Serra do Sol/Jawari/Brilho do Sol/S. Miguel/S. Mateus - 08/04/2021- Um indígena não identificado
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